Pagaríamos para ser moscas não fossem as câmaras de televisão irem fazê-lo por nós: esta tarde, pelas 17h00, o Governo (em gestão), encabeçado pelo (demissionário) primeiro-ministro António Costa, cumpre pela última vez a tradição natalícia de ir ao Palácio de Belém apresentar cumprimentos de Boas Festas ao Presidente da República. Todos os presentes na Sala dos Embaixadores envergarão certamente o seu melhor sorriso, alinhando no espírito da época (os que não apreciam a época chamar-lhe-ão hipocrisia), que pede “Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade”. Um bocadinho de “boa vontade” nunca fez mal a ninguém e não se espera outra coisa por parte de dois homens que se conhecem há quarenta anos e que, nos últimos… vá lá… sete, mantiveram uma sólida relação de cumplicidade e, porque não dizê-lo, amizade. Se nos últimos dias têm trocado “postais” (que não de natal) sobre de quem é a responsabilidade pela crise política - se do senhor Presidente, que aceitou a demissão, se do senhor primeiro-ministro, que se demitiu -, não é de crer que hoje, um perante o outro (e, mais importante, em direto perante o país), o voltem a fazer. Ainda assim vale a pena estar atento e olhar com atenção para o que está debaixo do “papel de embrulho” da circunstância. Ontem, ao receber os votos de Boas Festas dos representantes da Assembleia da República, Marcelo antecipou um 2024 “muito intenso”, e disse esperar que “possa corresponder ao que venha a ser o desejo dos portugueses”. No mesmo discurso desvalorizou as “vicissitudes” que a democracia momentaneamente atravessa, mostrando-se convicto que elas contribuem mais para a “completar e enriquecer” do que para a “questionar e desvanecer” e deixando ainda a garantia, agora que se completam 50 anos do 25 de abril: “Ditadura nunca mais”. Antes, já Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República, vaticinara “um ano muito exigente do ponto de vista político também para o Presidente da República”.
OUTRAS NOTÍCIAS, CÁ DENTRO…
De ontem, ao início da noite, a notícia (avançada pelo Financial Times) que o gestor português António Horta Osório se terá juntado ao fundo norte-americano Warburg Pincus para adquirir o negócio da Altice em Portugal pela quantia de 6 mil milhões de euros.
É mais uma tentativa (certamente vã) de discutir a regulamentação do lobbying em Portugal. É esta tarde, na Assembleia da República, por iniciativa do Chega, que propõe a criação de um registo de transparência da representação de interesses junto da Assembleia da República.
E por falar em Chega, vale a pena ver a entrevista que André Ventura deu ontem à SIC Notícias e onde admite que se o Programa de um eventual Governo do PSD não for “perfeito” (“e nenhum de nós acredita nisso”) contará com a rejeição do Chega. A SIC tem estado a entrevistar todos os líderes partidários. Depois de Paulo Raimundo, secretário-geral do PCP, na segunda-feira, Mariana Mortágua, coordenadora do Bloco de Esquerda, na terça, e André Ventura, presidente do Chega, hoje é a vez do líder da Iniciativa Liberal, Rui Rocha. As entrevistas do novo secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, que ontem esteve na SIC, nas Tardes da Júlia (resumo aqui), e do presidente do PSD, Luís Montenegro, serão emitidas na próxima semana.
Na Taça da Liga, o Benfica joga às 20h15 no estádio da Luz contra o Aves. Basta-lhe um empate (ou até uma derrota só por um golo) para garantir lugar na final four.
… E LÁ FORA
Há novas regras sobre dívida e défice na União Europeia. O acordo de princípio entre os Estados-membros foi alcançado esta noite, mas a reforma só deverá entrar em vigor em 2025. Portugal, garante o ministro das Finanças, não tem razões para estar preocupado com as mudanças: está numa “posição confortável”, diz Fernando Medina.
Crise política em França. A aprovação de uma lei da imigração, que facilita a deportação de estrangeiros considerados “indesejáveis” já provocou a demissão do ministro da Saúde e uma rebelião na bancada parlamentar. O Presidente francês Emmanuel Macron rejeita que a lei se inspire em princípios da extrema-direita mas Marine Le Pen já veio reivindicar “uma vitória ideológica”. Sintomas de uma crise política mais profunda do que parece? Há quem defenda que sim.
Numa decisão histórica e sem precedentes, o Supremo Tribunal do Colorado decidiu proibir a candidatura de Donald Trump às primárias presidenciais naquele Estado, por considerar que o antigo Presidente dos EUA participou numa “insurreição”, ao apelar a um ataque ao Capitólio no dia 6 de janeiro de 2021. O que implica esta sentença, na prática? Respostas aqui.
Numa altura em que continua sem se saber do paradeiro de Alexei Navalny, opositor de Vladimir Putin, desaparecido há mais de duas semanas da prisão onde se encontrava detido, cresce o número de potenciais adversários do presidente russo nas presidenciais de março. Já há 16 candidatos (contando com Putin, que se recandidata), o último dos quais a jornalista Yekaterina Duntsova, de 40 anos.
A jiadista luso-holandesa Ângela Barreto foi libertada esta quarta-feira de uma prisão nos Países Baixos onde cumpria desde fevereiro de 2022 uma pena de quatro anos e meio por participação em organização terrorista e preparação e promoção de crimes terroristas.
FRASES
“Quem nos critica nunca o faz de forma clara e honesta. Usam elementos falsos, intrincados para criar confusão”
Isaltino Morais, presidente da Câmara Municipal de Oeiras, solidarizando-se com António Costa, primeiro-ministro
“O ano de 2024 será “um ano muito intenso cá dentro e lá fora”
Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República, dirigindo-se aos representantes da Assembleia de República que lhe foram apresentar Boas Festas
“A democracia é mais forte do que as vicissitudes, que, aliás, têm a obrigação de a completar e enriquecer e não propriamente questionar ou desvanecer”
idem
“2024 será um ano muito exigente do ponto de vista político também para o Presidente da República”
Augusto Santos Silva, presidente da Assembleia da República
“Tenho consciência que não foi espetacular. Mas também não era suposto, era um momento de celebração de vitória”
Pedro Nuno Santos, secretário-geral eleito do PS, sobre o seu discurso de vitória
PODCASTS A NÃO PERDER
📖 É uma pergunta válida para lá desta altura de Festas: acredita no Menino Jesus? De certa forma foi esse o pretexto para Henrique Monteiro e Lourenço Pereira Coutinho conversarem com o padre jesuíta Francisco Martins, professor universitário e doutorado em estudos bíblicos pela Universidade Hebraica de Jerusalém, sobre o que é verdade e ficção na Bíblia. Mais um episódio do podcast A História repete-se
⛪ Outro padre jesuíta, Afonso Seixas-Nunes, é o mais recente convidado de Bernardo Ferrão em Geração 70. Falam sobre a evolução da Igreja e de como o “fraco investimento” na Educação em Portugal já ultrapassa fronteiras, entre outros temas
🏚️Os preços das casas têm subido sobretudo nas periferias de Lisboa e do Porto. Até onde irá esta subida?João Silvestre, editor de Economia do Expresso, e Ricardo Guimarães, diretor da Confidencial Imobiliário, procuram dar resposta a uma pergunta que inquieta muitos portugueses no podcast Money Money Money
O QUE ANDO A LER
No último Curto que escrevi, no início de novembro, fiz referência a uma entrevista da Luciana Leiderfarb à jovem escritora Beatrice Salvioni, autora de um dos últimos grandes sucessos da literatura italiana, “A mal-nascida” (edições Alfaguara). Dizia ela nessa entrevista que “o fascismo não acabou no fim da II Guerra. Está em hibernação na nossa sociedade e pode ressurgir com um novo rosto, novos valores, novos símbolos, mantendo-se no fundo sempre o mesmo”. Despertou-me o interesse e assim tratei de ler este livro (vou a meio), que parte da amizade entre duas raparigas (que se tornam amigas naqueles decisivos anos entre a infância e a adolescência) nos anos 30, no início do regime fascista de Mussolini, para fazer um retrato do papel da mulher numa sociedade autoritária que não atribuía ao sexo feminino outra missão que não a de servir os homens. Parece coisa de um tempo distante mas numa altura em que tanto do que julgávamos morto e enterrado parece ressurgir (ou o verbo certo será regredir?) resulta estranhamente atual. Como atual é a constatação que ler é, será sempre, uma arma poderosa contra quem lucra com a ignorância e o desinteresse das massas. Usemo-la, pois. Sem moderação. Se estiver por Lisboa, pode ser que tropece num dos mais de 200 livros deixados ao acaso pelas ruas da capital, uma bela iniciativa do Plano Nacional de Leitura, que pretende assim "celebrar a leitura, no espírito de que há um livro que nos torna leitores".
Este Curto fica por aqui. O que não acaba nunca é a informação atualizada ao minuto nos sites do Expresso e da SIC Notícias. Amanhã (dia em que começa o inverno), há Expresso nas bancas - disponível ainda hoje, ao final do dia, para os assinantes digitais. Boas Festas!
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