Onde mora a violência
“Touro Enraivecido” de Martin Scorsese, exibido quinta-feira a fechar o pré-Fantasporto confronta-nos com um problema tão velho como a humanidade: estará a pior das violências dentro de nós próprios?
“Touro Enraivecido” de Martin Scorsese, exibido quinta-feira a fechar o pré-Fantasporto confronta-nos com um problema tão velho como a humanidade: estará a pior das violências dentro de nós próprios?
Terminado o pré-festival que decorreu entre 25 e 27 de fevereiro com a projeção de três clássicos, a 40.ª edição do Fantasporto tem hoje, sexta-feira 28 de fevereiro, a sua abertura oficial às 21h com a antestreia mundial de “Adverse” do norte-americano Brian A. Metcalf. Um filme onde brilham Mickey Rourke e Sean Patrick Astin (o hobbit Samwise Gamgee de “O Senhor dos Anéis”) e que nos leva ao submundo dos gangues de extorsionistas.
O filme exibido na véspera, encerrando o pré-Fantasporto, já de alguma forma nos tinha preparado o caminho, pois “Touro Enraivecido/Raging Bull” de Martin Scorsese é mais que um filme sobre o boxe. É uma reflexão sobre o lugar da violência. Realizado em 1980 num preto e branco requintado (para quê a cor nesta recriação da atmosfera dos anos 50?) inspira-se na carreira dramática do pugilista Jack LaMotta, campeão do mundo de pesos médios que protagonizou lendários combates com Sugar Robinson.
Os combates foram meticulosamente coreografados por Scorsese e desenhados em papel antes de serem filmados. O protagonista, Robert de Niro, ainda na fase inicial da sua carreira, levou o papel suficientemente a sério para ter aceitado engordar 27 kg de forma a tornar mais convincente a decadência física e mental do personagem depois de abandonar o boxe.
LaMotta, após perder o título mundial para Sugar Robinson, afundar-se-á numa espiral de depressão, álcool e deboche que o levará à ruptura com a mulher, os filhos e o irmão, terminando a sua longa vida a atuar como animador de bares e comediante, tendo chegado a entrar em filmes como “A Vida é um Jogo/The Hustler” ao lado de Paul Newman (1961).
Como noutros filmes de Scorsese, o universo da máfia nova-iorquina que tão bem conhece é aqui evocado, sendo que a carreira de LaMotta acaba por ser uma metáfora acerca do verdadeiro lugar da violência: dentro ou fora de nós? Martin Scorsese que haveria de voltar vezes sem conta ao tema dos mafiosos, esteve recentemente em foco ao criticar a “falta de alma” dos filmes de super-heróis e ao aceitar realizar novo filme magistral sobre gangsters, “O Irlandês”, também com Robert de Niro, já não para uma produtora clássica mas para ser exibido na plataforma Netflix.
Os outros dois filmes exibidos no pré-Fantasporto e dos quais tive ocasião de falar em anteriores cónicas haviam sido “Blade Runner” de Ridley Scott (dia 25) e “Drácula” de Francis Coppola (dia 26). A 40.ª edição do Fantasporto decorre até 8 de março no cine-teatro Rivoli no Porto.
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