A pressão para que uma empresa tenha um comportamento mais amigo do ambiente e em linha com as boas práticas ESG (sigla inglesa para ambiente, responsabilidade social e governança) pode vir de vários stakeholders: pode vir dos reguladores, dos consumidores/clientes, dos trabalhadores, da sociedade civil, da banca que financia as operações e até das empresas rivais que atuam no mesmo ramo de atividade. Mas, nos últimos anos, sobretudo nas grandes empresas, a pressão tem vindo cada vez mais de acionistas.
Alguns investidores ativistas estão a aproveitar as assembleias gerais (reunião anual que reúne os acionistas) para trazer à votação resoluções que obrigam as empresas a ter práticas mais alinhadas, por exemplo, com os objetivos do Acordo de Paris e com os objetivos de desenvolvimento sustentável das Nações Unidas. São chamados acionistas ativistas e tentam trazer uma agenda mais sustentável para dentro das empresas e, muitas vezes, até conseguem o apoio e os votos de grandes fundos de investimento como a BlackRock, o maior fundo do mundo, que colocou a temática ambiental no centro da estratégia de investimento do grupo.
Por exemplo, no ano passado, o multimilionário Carl Icahn levou à assembleia geral da McDonald's uma proposta para nomear duas ativistas para a administração para poder controlar a cadeia de “fast food”, que o norte-americano acusava de maus tratos aos animais. Outro exemplo é o da Meta Platforms, a dona do Facebook, onde os acionistas minoritários quiseram obrigar a empresa a publicar relatórios sobre práticas de assédio e violação dos direitos humanos na sua plataforma virtual Metaverso.
Na maior parte das vezes, as propostas estão condenadas ao fracasso, mas nos últimos anos há cada vez mais investidores a votarem ao lado destes acionistas ativistas. De acordo com os dados da agência Bloomberg, no ano passado as resoluções ambientais e sociais que chegaram às assembleias gerais das grandes empresas tiveram o apoio, em média, de 33% dos acionistas, acima da média de 22% nos cinco anos anteriores. Há casos em que estas propostas até passam com os votos da maioria; por exemplo, contra a vontade da gestão, os acionistas da Apple (que fabrica os iPhones) aprovaram em assembleia, no ano passado, uma proposta que obriga a empresa a fazer uma auditoria interna sobre o cumprimento e respeito pelos direitos humanos.
A empresa de Warren Buffett na mira
Este ano, os acionistas ativistas voltaram à carga e puseram à votação seis propostas relacionadas com ESG na assembleia geral da Berkshire Hathaway. Algumas delas visavam obrigar o conglomerado liderado por Warren Buffett a ser mais transparente na publicação dos riscos de negócio relacionados com o clima e com a libertação de gases com efeito de estufa. Outra das propostas pretendia aumentar os esforços da empresa na promoção de uma maior diversidade.
Uma das resoluções relacionadas com o ambiente foi apresentada em assembleia geral pelo California Public Employees Retirement System que é o maior fundo de pensões dos EUA. No entanto, todas estas propostas acabaram por ser rejeitadas já que Warren Buffett controla 32% dos direitos de voto na Berkshire.
No próximo dia 23 de maio, será a vez dos acionistas da Shell votarem uma série de propostas feitas por um grupo de acionistas ativistas que querem obrigar a petrolífera a mudar a estratégia para se alinhar mais com os objetivos do Acordo de Paris. A administração da petrolífera britânica já veio apelar aos acionistas para votarem contra estas propostas que visam acelerar a redução das emissões de CO2.
A Church of England Pensions Board, acionista da petrolífera britânica, já veio dizer que vai votar favoravelmente as propostas dos ativistas. Em declarações citadas pela agência Reuters, um responsável por este fundo de pensões afirma que “estamos a receber alguns sinais por parte do novo presidente de que a empresa está a regressar à velha prática de se preocupar com a maximização dos lucros a curto prazo”. Por conta da guerra na Ucrânia e da alta do preço do petróleo, a Shell conseguiu fechar 2022 com um lucro recorde de 39,9 mil milhões de dólares, mais do dobro dos ganhos conseguidos no ano anterior.
Não é só no setor financeiro e petrolífero que os ativistas ESG têm “atacado”. Três gestoras de fundos europeias (uma dinamarquesa, uma norueguesa e uma holandesa) apresentaram para votação na assembleia geral de junho uma proposta para que a fabricante de automóveis Toyota Motor seja mais transparente em relação ao lobbying que faz relacionado com as alterações climáticas.
A Toyota, com o híbrido Prius, chegou a ser vista durante muitos anos como uma das empresas mais sustentáveis do setor, mas estes três fundos, – que investiram 400 milhões dólares – criticam a lentidão da empresa em dar o salto para os carros totalmente elétricos.
Republicanos acusam BlackRock
Além dos ativistas climáticos, nos últimos anos também têm despontado nos EUA um movimento anti-ESG, sobretudo da parte da direita mais conservadora, que defende que estas práticas sustentáveis e socialmente responsáveis estão a interferir na capacidade das empresas de gerar lucro.
De acordo com a Reuters, um grupo de 17 procuradores gerais republicanos nos EUA acusaram na semana passada a BlackRock de “ativismo ambiental” e pediram aos reguladores do setor da energia para rever a participação do fundo de Larry Fink nas “utilities” (empresas de serviços de energia ou água, por exemplo). Estes procuradores gerais dizem que a BlackRock recebeu autorização para poder ter mais de 10% do capital das “utilities” nos EUA desde que fosse um acionista silencioso e passivo. Argumentam que ao juntar-se à causa dos ambientalistas, a BlackRock está a procurar influenciar a gestão dessas empresas e já não pode ser considerada um acionista silencioso.
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