desafio que mudou a sua vida chegou-lhe numa tarde de inverno de 1954, durante um encontro secreto com um homem que dizia chamar-se “Gomes”. Foi aí, numa praia da Ericeira fustigada pelo vento e pelo frio, que ele lhe perguntou se aceitava “mergulhar”. A palavra de código usada para referir a passagem à clandestinidade não era escolhida ao acaso. De alguma forma, tratava-se de submergir, de ‘ir ao fundo’ e lá ficar, talvez para sempre. Como se estivessem a pedir-lhe que aceitasse entrar naquelas águas revoltas e se dispusesse a afogar a pessoa que era. Margarida estava consciente do que a proposta implicava. Sabia que teria de cortar com a família e com os amigos, deixar a vida como a conhecia e tornar-se invisível. Sabia do perigo, das privações e do sofrimento que inevitavelmente a esperariam. Mas o orgulho e a excitação de ser convidada a aceder ao que via como o expoente máximo da resistência à ditadura sobrepunham-se à angústia e ao medo. Tinha 25 anos e uma filha de dois quando disse que sim.
Não tomou a decisão sozinha. Ao seu lado, estava José Dias Coelho, pai da sua filha, com quem começara a namorar quando estudavam ambos em Belas Artes. A paixão foi de tal modo arrebatadora que Margarida não hesitou em deixar o casamento recém-celebrado com um jovem arquiteto para se juntar a ele. Era para a vida, mas a de José acabaria por ser brutalmente ceifada pela PIDE, poucos anos depois. Naquela tarde na Ericeira, porém, e apesar do enorme risco que sabiam que passariam a correr, acreditavam num futuro luminoso. Movia-os um “romantismo revolucionário” e uma esperança juvenil onde não cabem desgraças.
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