A Beleza das Pequenas Coisas

Maurício de Sousa: “Se sou uma 'rock star' da BD? Não tenho preocupação em colocar-me num pedestal. Sempre estive do meu tamanho”

Ele é um dos maiores ícones da banda desenhada mundial, a par de Walt Disney, Hergé, Quino ou Hugo Pratt. Maurício de Sousa é o pai da Mônica, Magali, Cebolinha ou Cascão e, desde os anos 60, que as personagens de “A Turma da Mônica” são responsáveis pela alfabetização de milhões de pessoas no Brasil. Aos 88 anos, o cartunista e escritor Maurício de Sousa está em Portugal para a mostra “Mônica 60 anos - sempre fui forte”, até 29 de outubro na 34ª edição da Amadora BD, em Lisboa, e prepara-se para em 2024 ver adaptada a sua vida ao grande ecrã. Ouçam-no no podcast “A Beleza das Pequenas Coisas”, com Bernardo Mendonça

Maurício de Sousa: “Se sou uma 'rock star' da BD? Não tenho preocupação em colocar-me num pedestal. Sempre estive do meu tamanho”

Nuno Fox

Fotojornalista

João Ribeiro

Sonoplasta

Maurício de Sousa: “Se sou uma 'rock star' da BD? Não tenho preocupação em colocar-me num pedestal. Sempre estive do meu tamanho”

Salomé Rita

Sonoplasta

O mundo está doente. O mal anda à solta, não escolhe fronteiras, não olha a quem e tem vários lados. A mentira e o ‘fake’ são guloseimas disponíveis numa prateleira mais à mão do que a verdade. A preguiça, a desinformação, a ignorância, o ódio, a polarização e o preconceito chegam a todo o lado. Mas o mundo não é só isso.

E, apesar de tudo, não faltam razões para nos inspirarmos, sonharmos e sorrirmos. O ilustrador, cartunista e escritor Maurício de Sousa já fez sorrir muitas gerações durante a infância e adolescência. Ele é o pai da famosa “Turma da Mônica”, e suas aventuras com os amigos Cebolinha, Magali, Cascão e tantas outras incríveis personagens de banda desenhada, muitas delas baseadas em crianças reais.

A temperamental Mônica e o seu coelho azul, Magali, sempre doida por melancia, e acompanhada do gato Mingau, foram desenhados a pensar em duas das suas filhas, com o mesmo nome.

“A personagem Mônica foi inspirada numa das minhas filhas que realmente não tinha muita paciência, tinha o pavio curto. E tinha um coelho, com enchimento de palha, muito pesado, que lhe comprei numa feira. Ela brincava e brigava usando esse coelho também. Desenhei a Mônica e depois o público deu-lhe poder e popularidade por ser uma menina líder. Mas não fui eu que a inventei, não inventei nada”.

Já Cebolinha, o rapaz dos cabelos espetados que troca o 'R' pelo ‘L’, e Cascão, que não era amigo da limpeza, foram bonecos criados com base em dois meninos que Maurício conheceu na terra onde cresceu, Mogi das Cruzes, município no Estado de São Paulo, Brasil, lugar onde descobriu a paixão pelo desenho. E aqui ficamos a saber até o nome real de Cebolinha e como era tratado Maurício pelos outros “moleques” na infância.

Filho de uma família de poetas e contadores de histórias, Maurício de Sousa foi aos 19 anos para São Paulo tentar a sua sorte como ilustrador na Folha da Manhã - atual “Folha de São Paulo” - mas recebeu um tremendo “não” de um famoso ilustrador da época. Como sabemos há “nãos” que são empurrões que nos dão mais força para chegarmos aonde sonhamos. E Maurício conta aqui esse episódio que foi determinante para o seu caminho.

Ele que se considera um “otimista incorrigível” não desistiu, e para aprender mais sobre os bastidores do mundo que ambicionava, conseguiu vaga naquela redação como copy desk. Daí passou a repórter policial. O que era um crime para o tanto talento que tinha guardado em si. E conta-nos até como resistiu, e as artimanhas que usou, durante uns tempos para conseguir reportar em cenários de crime, apesar de não poder ver sangue.

Obstinado, Maurício persistiu no sonho e acabou por publicar em 1959 a sua primeira tira diária, com as aventuras do garoto Franjinha e do seu cãozinho Bidu. Desde aí, as tiras de Maurício de Sousa espalharam-se por jornais de todo o país. Anos mais tarde, em 1970, Maurício fez história ao lançar a revista “Mônica”, que lhe valeu em 71 o mais importante prémio do mundo dos quadradinhos, o troféu “Yellow Kid”, em Lucca, na Itália. E conta-nos como, sem esperar, a personagem Mônica torna-se no seu desenho mais popular, e numa referência de bravura feminina.

Seguindo o sucesso de Mónica, várias outras personagens de Maurício também ganharam as suas próprias revistas. E tiveram o mérito de alfabetizar milhões de crianças que aprenderam a ler com “A Turma da Mônica”. E isso é mais especial e importante do que qualquer prémio.

Importa dizer que Maurício é um dos escritores mais admirados do Brasil, que a sua “Maurício de Sousa Produções” vende cerca de 2 milhões de revistas por mês, e que estas suas personagens não envelheceram com o tempo, atualizaram-se, têm sido a companhia de várias gerações e ficaram maiores do que o Brasil. Famosas no mundo inteiro, “A Turma da Mónica” chegou a mais de 40 países, de Portugal, a Espanha, Alemanha, Indonésia, Coreia do Sul ou Japão. É obra.

E dos quadradinhos, “a Turma da Mónica” saltou para o teatro, o cinema, a televisão, a internet, parques temáticos e até exposições de arte.

Como é o caso da exposição “Mônica 60 anos - sempre fui forte”, que pode ser visitada até 29 de outubro na 34ª edição da Amadora BD, em Lisboa, este ano dedicada aos “Clássicos intemporais” e que celebra os 60 anos da mais importante personagem da história da BD brasileira, criada em 1963, tornada num ícone de coragem feminina. Não deixem de a visitar.

No final da primeira parte deste podcast, Maurício de Sousa é surpreendido com um áudio da sua filha Magali, a filha que inspirou a famosa personagem comilona e viciada em melancia…


Logo no arranque da segunda parte deste podcast, Maurício de Sousa responde emocionado ao testemunho deixado pela sua filha Magali, afirma que ela é a filha mais bem humorada dos seus 10 filhos, e recorda:

“A minha filha Magali nasceu assim como a personagem que desenhei com o nome dela. Lembro-me que quando Magali nasceu fiz um diarinho, e escrevi nele que quando ela era bebé já mamava demais. Ela era e é voraz no apetite. Não inventei nada para a banda desenhada, apenas observei.”

Num percurso com tanto sucesso, como Maurício se relacionou durante o seu caminho com a falha, os erros e os momentos de frustração? E como é ganhar tantos anos de vida, mantendo a curiosidade, a vontade de inovar, aprender e de estar em contacto com a infância? É esse o segredo da juventude? Maurício responde nesta segunda parte do podcast.

E como olha para a política no Brasil e para o seu investimento na cultura, ele que já passou por tantos regimes? Que futuro sonha para o Brasil?

“Um Brasil fraturado? Não sou negativo. Temos que sair da fratura e ruptura social e consertar muita coisa no povo brasileiro. Soluções para o futuro? Sem querer brincar, mas se a gente distribuísse mais banda desenhada da Turma da Mônica para o público brasileiro estaríamos um pouco melhor, porque há ali muita educação e diversão.”

Maurício também é questionado como encara estes tempos mais acelerados e digitalizados em que a maioria das pessoas continua a ler pouco e toda a informação que consome é na televisão e na internet? Como é a sua relação com o tempo? E com o que vem aí? Que sonhos ainda tem por concretizar? Aos 88 anos acorda todos os dias com uma renovada luz de esperança e com novas ideias?

Como é habitual, nesta segunda parte do podcast ainda há espaço para a música que o acompanha, um momento em que poderão ouvir o vozeirão de Maurício a trautear o tema "Granada". E Maurício ainda é surpreendido com mais dois áudios: Um testemunho do seu filho Mauro, responsável pelos espetáculos ao vivo de “A Turma da Mônica” e que representará a sua vida no cinema, e o ilustrador Vitor Cafaggi, criador da série “Turma da Mônica - Laços.”

Nesta nova temporada o genérico é assinado por Márcia e conta com a colaboração de Tomara. Os retratos são da autoria de Nuno Fox. A sonoplastia deste podcast é de João Ribeiro com o apoio de Salomé Rita.

Voltamos para a semana com mais uma pessoa convidada. Até lá pratiquem a empatia e boas escutas!

Cristina Martins Halpern, neuropediatra na consulta de desenvolvimento do CADIN - Centro de Apoio ao Desenvolvimento Infantil, Bernardo Barahona Corrêa, médico e investigador da unidade de neuropsiquiatria da Fundação Champalimaud, e Ana Isabel Paiva, a quem foi diagnosticada Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção aos 40 anos.
João Girão

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: oemaildobernardomendonca@gmail.com

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