Sergei Surovikin: conheça o general russo que já foi herói condecorado e está hoje em parte incerta
AFP Contributor
Tem a alcunha de “General Armagedão” e a sua carreira esteve envolta em “alegações de corrupção e brutalidade”. Ganhou reconhecimento interno na Rússia, mas há relatos de que pudesse ter conhecimento dos planos para a rebelião do grupo Wagner, no passado fim de semana. O Kremlin não dá pistas sobre o seu futuro. Quem é Sergei Surovikin?
Aos 56 anos, o nome do general russo Sergei Surovikin é associado a vários campos de batalha: Chechénia, Síria e Ucrânia. Se o seu passado é conhecido e levou a que recebesse a alcunha de “General Armagedão”, o futuro pode estar nas mãos do Kremlin.
A localização de Surovikin é um mistério desde o dia 24 de junho, quando surgiu um vídeo em que pede ao líder do grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin, que suspenda a rebelião em curso. Circulam rumores de que o general está a ser interrogado pelos serviços de segurança, mas Moscovo não esclarece dúvidas sobre o seu paradeiro. Segundo a agência Reuters, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, remeteu as perguntas dos jornalistas para o Ministério da Defesa e disse que não podia clarificar a situação.
Terça-feira, o “The New York Times” avançou que Surovikin sabia dos planos de revolta armada de Prigozhin contra a liderança militar russa. A fonte são oficiais dos Estados Unidos que desconheciam se o veterano de guerra ajudara a planear as ações do fim de semana.
A ligação de Surovikin a Prigozhin já fora apontada por especialistas. Quando deixou a liderança das operações militares russas na Ucrânia, em janeiro, apenas três meses depois de ter sido nomeado para o cargo, o analista militar Harry Halem explicou que o comandante era próximo de Prigozhin e que os dois “foram considerados potenciais adversários para a dupla Gerasimov-Shoigu”, respetivamente chefe do Estado-Maior e ministro da Defesa. Pode ler mais sobre essa mudança aqui.
Um relatório publicado em junho pelo Centro de Estudos Europeus de Leste de Estocolmo (SCEEUS, na sigla em inglês), indicava que Surovikin atuava como intermediário quando o grupo Wagner procurava aprovação do exército russo para as suas ações, com base em declarações de Prigozhin.
Medalha de herói na Rússia, fama de violência no exterior
O general Surovikin passou por vários países ao longo do seu percurso militar. Tudo começou nos anos 80 no Afeganistão. Em declarações à BBC, o académico Peter Waldron descreve que esta experiência moldou a reputação de Surovikin e que este esteve envolvido em “violência considerável” desde o início.
A lista de conflitos abarcou passagens pelo Tajiquistão e pela Chechénia. O jornal digital “Politico” descreve que o militar se comprometeu a “destruir três combatentes chechenos por cada soldado russo morto”. Veio a ser elogiado pelo líder checheno Ramzan Kadyrov como “verdadeiro general e guerreiro”. Trata-se do mesmo Kadyrov que no final da semana passada disse ter unidades preparadas para ajudar as tropas do país a travarem os mercenários do grupo Wagner que marchavam em direção a Moscovo.
Em 2020 a organização Human Rights Watch publicou um relatório sobre as ações militares do Governo sírio e da Rússia para retomarem a zona de Idlib – alegando que atacaram infraestruturas como casas e escolas, causando a morte a mais de 1600 civis – e identificou pessoas que podiam incorrer em responsabilidade criminal se tivessem conhecimento de violações das leis da guerra. Um dos nomes que surgem neste contexto é o de Surovikin, que combateu na Síria em 2019.
Mercenários do grupo Wagner controlaram durante algumas horas várias ruas da cidade russa de Rostov-on-Don
Esta não foi a única altura em que foi destacado para aquele país. Meios de comunicação indicam que passou por lá em 2015 e outros em 2017, com o intuito de liderar forças russas destacadas para ajudar o Presidente Bashar al-Assad. Quando o seu serviço no país terminou, o Executivo de Assad controlava a maioria do país. Acabou por ser condecorado com uma medalha de “herói” na Rússia pelo Presidente Vladimir Putin.
Em junho de 2022, o Ministério da Defesa do Reino Unido publicou na rede social Twitter que “ao longo de mais de 30 anos, a carreira de Surovikin foi perseguida por alegações de corrupção e brutalidade”.
A saída de Kherson
Surovikin, comandante das Forças Aeroespaciais russas, assumiu a liderança das operações militares russas na Ucrânia em outubro de 2022. O curto período que permaneceu no cargo ficou marcado pela retirada de Kherson. A região foi das primeiras a serem conquistadas pela Rússia na invasão e era vista como tendo importância simbólica para as forças russas. Depois de semanas em que foram retirados civis e material militar, foi anunciada a saída do exército russo.
“Compreendo que esta é uma decisão muito difícil, mas ao mesmo tempo vamos preservar o mais importante – a vida dos militares e, em geral, a eficácia de combate do grupo de tropas, que é inútil manter na margem direita [do rio] numa área limitada”, explicou Surovikin num comentário televisivo.
Em janeiro a liderança voltava a mudar, com o general Valery Gerasimov a assumir as rédeas. Surovikin desceu um degrau, ficando como um de três vice-comandantes. “Teve pouca oportunidade para sucesso no campo de batalha. A sua maior conquista foi a necessária e razoavelmente bem efetuada retirada russa de Kherson”, indicou numa análise o historiador Jean Bou, do Instituto de Assuntos Internacionais Australiano, que acrescentou que a mudança de cargo não era necessariamente sinal de falha aos olhos do Kremlin.
Surovikin integra uma lista da União Europa sobre figuras às quais impor medidas restritivas desde as vésperas da invasão, por liderar as Forças Aéreas e, como tal, “ser responsável por ativamente apoiar e executar ações e políticas que prejudicam e ameaçam a integridade territorial, soberania e independência da Ucrânia”.