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Partido de extrema-direita alemão AfD colocado sob vigilância

Cartaz do partido Alternativa para a Alemanha (AfD, extrema-direita) deixado após uma manifestação em Berlim contra as medidas de saúde pública tomadas para conter a pandemia
Cartaz do partido Alternativa para a Alemanha (AfD, extrema-direita) deixado após uma manifestação em Berlim contra as medidas de saúde pública tomadas para conter a pandemia
Paul Zinken/Picture Alliance/Getty Images

Serviço de segurança interna considera formação xenófoba uma ameaça à democracia. Decisão surge após dois anos de investigação e um relatório de mais de 1000 páginas

Partido de extrema-direita alemão AfD colocado sob vigilância

Pedro Cordeiro

Editor da Secção Internacional

A Alternativa para a Alemanha (AfD), partido de direita radical que é o maior da oposição ao Governo de Angela Merkel, é uma ameaça à democracia. Esta quarta-feira o jornal “Süddeutsche Zeitung” noticiou que o serviço de segurança interna alemão, designado por Agência Federal para a Proteção da Constituição (BfV na sigla alemã) colocou a formação política xenófoba sob vigilância desde 25 de fevereiro.

A decisão permite seguir as suas atividades e até escutar comunicações entre os seus militantes. Terá sido tomada quinta-feira, mas não anunciada em público pois havia um processo judicial em curso relativo a medidas de segurança contra a AfD. No mês passado um tribunal administrativo de Colónia considerou admissível o BfV investigar o alegado extremismo do partido. A agência não teceu comentários após a divulgação da notícia.

A suspeita já pendia sobre a organização juvenil da AfD e sobre as filiais do partido em quatro dos 16 estados da República federal. Agora estende-se ao partido no seu todo. Segundo a revista alemã “Der Spiegel”, ficam de fora da vigilância os deputados dos parlamentos regionais, nacional e europeu e candidatos às eleições mais próximas.

As autoridades germânicas já tinham colocado sob a lupa a ala mais radical da AfD, Flügel (Asa), que foi dissolvida em 2020, quando o BfV a considerou “comprovadamente extremista”. Os seus antigos membros, porém, terão mantido influência no partido.

Partido teve 12,6% nas últimas legislativas

Na base da decisão do BfV estará um relatório de 1000 páginas elaborado por advogados e especialistas em extremismo que estudam o partido desde 2019. Os seus autores estudaram os discursos dos membros da AfD e as suas publicações nas redes sociais.

Terceiro classificado nas últimas legislativas em 2017 (12,6% dos votos e 94 dos 709 deputados), a AfD chefia a oposição, pois os dois maiores partidos (a democrata-cristã CDU e o social-democrata SPD) estão coligados no Executivo.

Com eleições marcadas para setembro próximo e a anunciada partida da chanceler ao fim de 16 anos no poder, a disputa política promete aquecer na primeira economia da União Europeia em 2021. A AfD tem 8 a 11% nas sondagens.

Cordão sanitário estrito, ordena Merkel

Merkel é defensora do “cordão sanitário” contra a direita radical, que a direita democrática em deixado cair em vários países. Em 2019, quando os votos da direita na Turíngia teriam permitido afastar a aliança de esquerda que governava o estado, rejeitou apoiar um candidato liberal apenas porque este contava com o apoio da AfD

Chegou a haver votação em que CDU, liberais e AfD faziam desse candidato chefe do governo estadual, mas a autoridade de Merkel impôs-se. A esquerda continua no poder na Turíngia, marcaram-se novas eleições e o caso fez cair a mulher que sucedera à chanceler na liderança nacional dos democratas-cristãos, Annegret Kramp-Karrenbauer. O líder da CDU é, desde janeiro desde ano, Armin Laschet.

Além de adotar um discurso contra imigrantes, sobretudo muçulmanos, a AfD tem participado em protestos não raro violentos. Num desses casos alguns manifestantes invadiram o Parlamento.

A notícia da suspeita de extremismo gerou reações indignadas da AfD, cujos militantes prometem levar a questão aos tribunais. “O serviço de segurança está a agir de forma puramente política no tocante à AfD. Dado que há eleições estaduais e federais este ano, isso é particularmente notável”, escreveu na rede social Twitter a dirigente partidária Alice Weidel.

Evitar os fantasmas do nazismo

Não é a primeira vez que o BfV coloca um partido sob vigilância. Entre 2007 e 2014 o seu alvo foi o partido A Esquerda, por suspeitas ligadas às suas raízes. Essa formação descende do Partido Comunista da antiga República Democrática Alemã, que encabeçou uma ditadura durante décadas.

O BfV nasceu após a II Guerra Mundial para travar a ascensão de forças extremistas que acarretassem o risco de regresso ao passado nazi. “Levamos essa missão muito a sério”, assegurou no ano passado o presidente do organismo, Thomas Haldenwang, numa conferência de imprensa.

“Sabemos, através da história alemã, que o extremismo de direita não destruiu apenas vidas humanos. Destruiu a democracia”, explicou, deixando em seguida um alerta: “O extremismo de direita e o terrorismo de extrema-direita são hoje o maior perigo para a democracia na Alemanha”.

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