Exclusivo

Economia

Depois do BCE, agora é Centeno: os bancos portugueses vão ter de andar em fusões e aquisições

Mário Centeno, governador do Banco de Portugal
Mário Centeno, governador do Banco de Portugal
Pedro Nunes/REUTERS

“Inevitável”: a consolidação da banca nacional vai mesmo acontecer, disse o governador do Banco de Portugal à Reuters. A posição contraria mensagens recentes dos banqueiros, desinteressados em novelas de consolidação no setor

Depois do BCE, agora é Centeno: os bancos portugueses vão ter de andar em fusões e aquisições

Diogo Cavaleiro

Jornalista

É uma pressão antiga, nada aconteceu de relevante nos últimos anos, mas pelos vistos está para continuar e agora com Mário Centeno a assumi-la como relevante e “inevitável”: trata-se da consolidação da banca, movimento para o qual o Banco Central Europeu (BCE) tem mostrado abertura e que o governador do Banco de Portugal, membro do Conselho do BCE, disse que vai mesmo acontecer, numa entrevista à Reuters.

Sublinhando que os bancos têm feito um “progresso assinalável” no que diz respeito à melhoria da solidez de capital e à descida dos créditos malparados, Mário Centeno considera que o caminho futuro vai passar por fusões e aquisições: “Depois deste reforço, a consolidação do sector bancário (em Portugal) e o fortalecimento das suas instituições é absolutamente crucial, e é inevitável que o sistema, o mercado, o enfrente”.

A mensagem sobre esta inevitabilidade não foi deixada num jornal nacional, mas sim numa agência internacional, a Reuters, em que os destinatários estão fora do país.

À Reuters, Centeno defendeu que a pandemia de covid-19 e agora a crise causada com os efeitos da guerra e das paralisações das economias atrasaram o processo, mas isso não vai fazer com que não aconteça: “Vamos fazê-lo, como sempre, com grande tranquilidade”.

“Embora esteja muito satisfeito com a evolução, não há espaço para descansar, temos de nos desafiar a nós próprios. É importante que este amadurecimento aconteça em paralelo a um reforço contínuo das instituições na sua dimensão, na sua capitalização, e sobretudo na sua capacidade de responder aos desafios da digitalização, ação climática, porque vai tudo ter impacto nos balanços dos bancos”, continuou o responsável do supervisor bancário, no cargo desde 2020.

Centeno não concretizou que entidades precisam de ser alvo de consolidação. Ainda há um mês, em entrevista ao Expresso, o presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), Vítor Bento, não se quis comprometer sobre esta tendência de consolidação, mas deixou claro que é preciso estar atento: “O que é um facto da vida é que em todos os momentos toda a gente é potencial presa e é potencial predador. Toda a gente está a fazer contas para não ser presa, e, se tiver que ser, que seja predador”.

BCE vê vantagens

A mensagem de Centeno é, portanto, uma mensagem clara para o sector (na entrevista à Reuters, o próprio governador pede ao BCE uma mensagem clara sobre as subidas de juros mais suaves, mas é o próprio que a deixa ao sector que supervisiona).

É uma ideia de consolidação deixada pelo líder do supervisor depois de, há dias, numa conferência sobre banca, os responsáveis dos bancos se terem juntado sem mostrarem grande entusiasmo nestas operações – um dos grandes argumentos de defesa é que os cinco grandes bancos respondem já por 80% dos ativos na banca nacional. Todos disseram estar empenhados em seguir o caminho por eles próprios; agora o governador vem dizer que faz sentido pensar de outra forma. E o BCE vê vantagens em fusões para lá de fronteiras.

No BCE, há desde 2020 um guião para a consolidação no sector bancário, em que Frankfurt deixa as indicações sobre como vê, do ponto de vista de supervisão, a concretização destas operações.

Ainda que sublinhe que tem de se manter “neutral”, o BCE tem mostrado ver com bons olhos a realização de fusões e aquisições. “A consolidação bancária pode desempenhar um papel importante ao remover excesso de capacidade, ao melhorar o custo da eficiência, e ao promover modelos de negócio mais focados e mais credíveis. A consolidação transfronteiriça pode também ajudar a uma maior diversificação de risco e contribuir para a integração dos mercados financeiros, um objetivo importante dentro da união bancária”, indica o Mecanismo Único de Supervisão – que junta o BCE e os bancos centrais nacionais, como o Banco de Portugal, no seu site.

As movimentações recentes e esperadas

Como ministro das Finanças, e como se tem relembrado desde que o ex-governador Carlos Costa publicou um livro com as suas memórias, Centeno esteve ao lado de António Costa envolvido na busca de soluções para o sector bancário, promovendo alterações legislativas ou participando em operações que resolveram obstáculos nos grandes bancos nacionais: CGD, BCP, Santander, Novo Banco, BPI e Banco Montepio.

Nos últimos anos, o Santander liderou os movimentos de consolidação que ocorreram no país, tendo adquirido dois bancos, Banif e Popular, por via de processos de resolução (que se distinguem de vendas normais por os bancos comprados estarem em dificuldades, e terem sido feitas com imposição de perdas aos acionistas e credores subordinados antes de ser pedido dinheiro aos contribuintes). De resto, pouco mais tem havido, ainda que os candidatos à operação estejam já alinhados – mas há muitos anos que é assim; há anos que as peças estão alinhadas,

Sabe-se que o perfil do maior acionista do Novo Banco, o grupo americano Lone Star, é vendedor, e que os minoritários, o Fundo de Resolução e o próprio Estado, também o querem alienar. No entanto, a última opção que foi colocada em cima da mesa pela gestão do banco e pela Lone Star foi a ida para a bolsa, como alternativa a uma venda que teima em demorar.

No BCP, há alguma pressão sobre os rácios de capital, um dos mais baixos do sector, e também sobre os acionistas: a chinesa Fosun está a vender ativos no prazo de um ano, para conseguir pagar a sua dívida, ainda que negando o interesse de sair do BCP; a angolana Sonangol está a sair da banca angolana, e disponível para participar em soluções que envolvam o seu banco.

Já os espanhóis CaixaBank, dono do BPI, e o Santander, proprietário do Santander Portugal, são continuamente apontados como interessados em comprar bancos em Portugal – mas é também um cenário que economistas portuguesas temem há muitos anos, tendo até havido um manifesto escrito por personalidades portuguesas contra o risco da espanholização da banca portuguesa.

O que já está a acontecer é a saída de acionistas angolanos do Eurobic, sendo substituídos por espanhóis: é a saída de Isabel dos Santos, do seu sócio Fernando Teles, e dos outros minoritários, para dar lugar ao galego Abanca, que já entrou em Portugal ao adquirir a rede de retalho do Deutsche Bank. O Abanca, que ainda aguarda a conclusão deste negócio, foi dos últimos bancos a entrar no país, a par do também espanhol Bankinter, quando entrou com a compra da rede do Barclays.

Até da possível união do Banco Montepio, banco do grupo mutualista com o mesmo nome, e do Crédito Agrícola, banco cooperativo, já se falou na última década, mas sem que tal tenha acontecido.

Por cá, foi recentemente anunciada uma operação de reduzida dimensão, em que a seguradora Generali passa a ser dona de 8,71% do capital do Banco CTT por 25 milhões de euros.

Aconteça o que acontecer na grande banca privada portuguesa, aquilo que tem sido dito pela gestão de Paulo Macedo na Caixa Geral de Depósitos é que não vai ficar parada se vir que há operações de fusões e aquisições que possam pôr em risco a sua posição de liderança no país.


Artigo Exclusivo para assinantes

Assine já por apenas 1,63€ por semana.

Já é Assinante?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para continuar a ler

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: dcavaleiro@expresso.impresa.pt

Comentários

Assine e junte-se ao novo fórum de comentários

Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes

Já é Assinante?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate
+ Vistas