2003: Garfo de Ouro reconhece excelência do Cimas English Bar no Estoril
Restaurante Cimas English Bar
Edifício icónico da Marginal, no Estoril, o Cimas English Bar preservou, desde a abertura, em 1941, a classe e a identidade, que levaram espiões, reis, escritores, artistas e muitos políticos, como Marcello Caetano, Francisco Sá Carneiro, Mário Soares e Francisco Pinto Balsemão, a sentarem-se para apreciar a vista e o receituário elegante, mas onde a caça tem lugar de destaque. Foi numa das salas que Marcelo Rebelo de Sousa, hoje, Presidente da República, escreveu à mão a tese de doutoramento, enquanto à mesa, ao longo dos anos, se fizeram e desfizeram governos, ao sabor da cozinha portuguesa. O restaurante recebeu, em 2003, na primeira edição do então “Livro da Boa Cama e da Boa Mesa”, um Garfo de Ouro, como reconhecimento por décadas de excelência gastronómica. Todas as semanas, para comemorar os 50 anos do Expresso, fazemos uma viagem no tempo, com o apoio do Recheio, para relembrar 50 restaurantes que marcaram as últimas décadas em Portugal
“Uma casa elegante com tradição de cozinha aprimorada ligada à confeção de caça, dispondo igualmente de uma ótima e variada ementa. Quem lá entra, dir-se-ia estar num elegante pavilhão de caça, com decoração e motivos ligados a esta atividade, onde predominam as madeiras de estilo e formosas janelas de guilhotina que deixam ver o mar ali em frente”. Era com esta prosa que a primeira edição do “Livro da Boa Cama e da Boa Mesa”, em 2003, justificava a atribuição de um Garfo de Ouro ao “Restaurante English Bar”, no Monte Estoril. Esta casa era assim uma das primeiras em Portugal a vencerem este prémio, que distinguia os melhores restaurantes no nosso país para a publicação do jornal Expresso.
José Manuel Cima Sobral e Sara Cima Sobral
A vocação deste espaço, continuava o texto, estava “bem patente nos seis pratos fixos anuais: perdiz ao Madeira e de escabeche, lebre com feijão manteiga, favada de caça, alheira de caça com grelos e galinhola à English Bar”. Nas entradas “principescas” recomendavam-se o “Salpicão de gambas” e o “Gratinado de marisco com espinafres” e, fora da caça, destacavam-se o “Cherne com amêijoas”, o “Tamboril provençal” e os “Rins de borrego salteado ao Madeira”, além do “Bife à English Bar” e dos “Crepes Suzette”. Embora hoje em dia já exista uma categoria superior ao Garfo de Ouro, o Garfo de Platina, e uma inferior, o Garfo de Prata, o agora designado “Guia Boa Cama Boa Mesa”, 20 anos depois, continua a selecionar os melhores locais para comer e dormir em Portugal. José Manuel Cima Sobral, atual proprietário do “Restaurante Cimas” - o nome alterou-se na viragem do século, para fazer mais sentido enquanto restaurante de comida portuguesa, revendo-se também no apelido da família e nos clientes, que “iam ao Cimas” comer -Tem apreço pelo Guia por “defender e divulgar a cozinha portuguesa”, já que “muitos dos que integram o livro têm cozinha portuguesa”. A sua filha, Sara Cima Sobral, tem memória da distinção e da capa: “Era cor de laranja e tenho-o guardado, compramos todos os anos. Acho que o trabalho do Guia é muito bem feito e muito bem complementado ao nível da televisão”, comenta.
Galinhola
Nuno Botelho
Guerra e espionagem
No início do século XX, o Monte Estoril, no concelho de Cascais, acolhia casas de veraneio em estilo chalé. Erguido em 1890 junto ao Casino Internacional do Monte Estoril, o edifício do English Bar funcionou até 1941 como casa particular, a Vila Lydia, e aí viveram famílias como a de Fernando Emydio da Silva e os Marques Guedes. Em 1994, à Folha de São Paulo, Jorge Amado referiu ter ido jantar, no Estoril, a um restaurante “de sublime cozinha portuguesa, propriedade de galegos, com nome inglês English Bar, porquê, vá-se lá saber...”. A razão era simples, foi fundado como bar em 1941 por Horace Rycroft Bass, um piloto de aviões escocês que chegou a Portugal em 1935 para operar como espião pelos Aliados. Durante a Segunda Guerra Mundial, o Estoril “asilou reis e príncipes destronados, deu refúgio a judeus perseguidos, acolheu artistas e aqui tiveram lugar algumas das melhores histórias de espionagem (…) As vistas das janelas não só eram poéticas, como tinham uma finalidade bem específica: uma varanda privilegiada sobre o Hotel Atlântico, na altura o verdadeiro centro de espionagem alemã e situada a pouco mais de dois passos do Hotel Palácio, onde os serviços de informação inglesa tinham o seu quartel general”, descreve o livro “Restaurante Cimas English Bar – A História”,escrito por Sara Cima Sobral com design de Isabel Teixeira de Abreu.
Duplo. Dusko Popov era o homem dos alemães que trabalhava para os britânicos. O espião jugoslavo foi decisivo em várias operações dos aliados e viu o seu melhor amigo ser raptado e morto pela Gestapo
Virado para o mar e a barra de Lisboa, o English Bar foi um “palco importante de espionagem e contraespionagem”, tendo sido visitado pelo agente Dusko Popov, um playboy que terá inspirado Ian Fleming a criar a personagem de James Bond. Conhecido como espião “triciclo, por jogar em várias frentes”, convidou José duas ou três vezes para a casa onde viveu, na Quinta da Marinha. Gostava sobretudo de “beber vodka”, graceja José, que conheceu ainda o Sr. Bass. Às vezes visitava o restaurante “com o cão Teddy, calças de golfe e o seu boné de escocês”. Horace Bass associou-se ao chefe de mesa Carlo Bursa e a Luís Lopes Blanco, barman do Hotel Palácio, profissionais que lhe traziam, por certo, muita informação. Na época, esta casa funcionava como bar. “As janelas eram abertas, não havia trânsito. Estacionava-se na marginal, vinha-se pelo jardim e entrava-se, era quase um pub inglês”, conta José Manuel Cima Sobral.
Crepes Suzette, com preparação à frente do cliente, são um clássico da casa
De bar a restaurante
O espião saiu finda a colaboração com os ingleses e cedeu a quota a Luís Lopes Blanco. José Manuel descende da família galega Sobral Portela, que rumara a Portugal. Os irmãos Sobral Portela ligaram-se a casas de renome, como o Gambrinus, inaugurado por Claudino Sobral Portela. O pai de José, Francisco Cima Barreiro, começara como empregado de mesa no Aquário Avenida Café, em Lisboa, chegando à gerência. O patrão galego, Manuel Outerelo Costa, levou-o a integrar a sociedade “Restaurantes Marginal Lda”, que englobava vários restaurantes da marginal (Boa Viagem, Mónaco, Choupana, Deck Bar e o English Bar) e visava criar “uma cadeia de restaurantes que beneficiasse de uma lógica de economia de escala”. Quando a parceria terminou, os sócios tiveram opção de compra e exploração dos espaços. No caso do English Bar, “houve um trespasse comercial”, explica Sara, e em 1952 os seus avós, Francisco Cima Barreiro e Dolores Sobral Portela, assumiram a gestão do English Bar, ficando a pagar um aluguer.
Cimas English Bar na década de 50 do século passado
Com a vinda do experiente Francisco para a chefia de mesa e de Dolores, cozinheira de mão cheia, o English Bar converte-se num restaurante “vocacionado para o marisco, ao contrário de atualmente, muito mais vocacionado para a caça”, enquadra José Manuel Cima Sobral. “Não havia pratos de marisco aqui e nós fomos precursores. Não existia santola recheada, lagosta grelhada, salpicão e nesse aspeto fomos muito, mas muito inovadores”, diz Sara. Servia-se na sala pequena e José ajudava os pais e habituou-se a fazer as compras. Aos 82 anos, José Cima Sobral continua a ir todos os dias ao mercado e à lota, apaixonadamente: “Só me fez bem, estou preparado na vida para tudo, é preciso saber fazer de tudo. A vida de um bom restaurante começa na praça”. No fim da guerra, muitos dos clientes era pessoal das companhias aéreas a dormir nos hotéis da zona. Criou-se mesmo um “10 per cent discount aviators”. Como salientou Pedro Barahona de Lemos no prefácio da obra sobre a história do Cimas, o restaurante “rapidamente caiu na moda, graças à excelente comida por um lado, e à simpatia daquele casal por quem lá entrava”. A propriedade plena do espaço aconteceria em 1962 - já José era sócio-gerente com os pais -, depois de a família Cima Sobral ter exercido o direito de preferência sobre o imóvel e ser concedida a Utilidade Turística por despacho de Salazar.
A vista desde o terraço do Cimas, no Estoril
Chalé virado para o mar
Feita a aquisição, avançou-se com a ampliação e remodelação do restaurante, sem fechar a porta. José “não sabia o que era um dia de descanso” e os pais trabalhariam até conseguirem. “Lembro-me da minha avó sentada ali em cima, numa cadeirinha. Já não fazia nada, mas via tudo, parecia um radar. Acho que eles não sabiam viver de outra maneira”, observa Sara. Construiu-se o atual salão grande de refeições, a partir do antigo terraço debruçado sobre a marginal. José acompanhou as obras desde o arranque, ao lado do engenheiro Francisco Xavier Marques Maia. Foi buscar livros de decoração ao Instituto Britânico e retirou daí muitas ideias. A intervenção tornou este chalé de estilo Tudor “ainda mais inglês”, com a matriz clássica e o requinte do antigo serviço de loiça inglês cantão azul Wedgwood e dos talheres Christofle, encomendados à antiga Casa José Alexandre “pela soma exorbitante de 38.880 escudos”, lê-se. Compraram peles para fazer reposteiros e reaproveitaram madeiras de uma demolição.
Ambiente no restaurante nos anos 50 do século XX
Viagem no tempo
Ao entrar, ouvimos o ranger do soalho de madeira e viajamos no tempo. “As pessoas fazem os espaços, mas este lugar tem uma certa alma que se deve, um pouco, ao conseguirmos preservar a arquitetura tal como era. A lareira está acesa no inverno e abrem-se as janelas quando o cliente quer, embora o barulho, hoje em dia, não seja muito simpático”, adverte Sara Cima Sobral. Mantêm-se os candeeiros antigos de luz suave, apliques de ferro e abat-jours em papiro“oriundos de uma velha loja já extinta no Largo de S. Carlos”, peças de ferro e porcelana, bases de candelabros em estanho, as gravuras inglesas antigas alusivas à caça e aos cavalos, os cadeirões e ementas em couro e a tapeçaria de Arraiolos. Encimando a lareira, a talha de madeira antiga em forma de brasão, representando os símbolos da coroa britânica (o cavalo e o leão), à qual se acrescentou a sigla “EB”, de English Bar. E todos os dias se dá à corda ao relógio do século XIX, originário de Ourense... Repare nas esculturas em bronze, de uma perdiz e uma galinhola, alusivas à caça. Foi introduzida no menu nos anos 80, quando José se apercebeu do aumento “desmesurado” de restaurantes de peixe e marisco no Guincho. Resolveu que só podia continuar “sendo diferente deles todos”.
"Perdiz ao Vinho Madeira"
Diana Quintela
Clássicos à mesa
A trabalhar nesta casa desde 1984 e como chef de cozinha desde 1986, Domingos Fernandes orgulha-se de, aqui, se fazer “tudo do início, desde o descascar da batata”. A base é a cozinha tradicional e regional portuguesa. Nas entradas, prove o “Salpicão de gambas” (€28), lagosta, lavagante ou bruxas, e considere o salmão ou espadarte fumados, os “Caracóis Bourguignone” (€22) e a “Sopa de cebola gratinada” (€18). Prossiga para as “Tranches de garoupa no forno com amêijoas” (€38), o “Bacalhau no forno” (€38) com batata, cebola e tomate às rodelas, o “Linguado ao Meunier” (€46), o “Lavagante à Thermidor”, as “Iscas de vitela Barrosã”, o “Filet do lombo English Bar” (€34) e a “Sela de borrego grelhada” (€38), o famoso Mutton Chop ao gosto de Marcelo Rebelo de Sousa.
O destaque continua a ser a caça. Da clássica “Perdiz ao vinho Madeira” (€38) ou de escabeche à “Favada de caça” (€48) apreciada por António Guterres, à “Lebre com feijão” (€48) ou à desejada “Galinhola” (€48), uma proteína “única, muito difícil de arranjar” e que precisa de marinar no dia anterior. “Durante a crise, o meu pai disse-me uma coisa muito importante: a matéria-prima tem de continuar a ser exímia, por muito que estejamos a passar por uma crise. O espírito é que vai passar. Se é muito caro? É, mas é isto que temos para oferecer”, sublinha Sara. É um prazer ver a mise en scéne dos “Crepes Suzette” (€30) na sala, e ainda melhor saboreá-los sem pestanejar. Este clássico surgiu em 1895, de um erro do garçon francês Henri Carpentier no Café de Paris de Monte Carlo, ao preparar uma sobremesa de crepes para o Príncipe de Gales, futuro Rei Eduardo VII. Exagerou no licor “e viu as folhas dos crepes praticamente incendiarem o rechaud”, lê-se na carta. Por instinto, exclamou “Et voilá!” e identificou a criação de “Crêpe Princese”. O príncipe terá gostado e batizado o doce de “Crêpe Suzette”, em homenagem à companhia feminina.
Daniel Perez/Getty Images
Monarcas, Soares e Sá Carneiro
Fardada com blazer e camisa brancos, calças e gravata pretas, a equipa de sala viu passarem por aqui muitos notáveis. Que o diga António Ferreira Godinho, ao serviço há 53 anos, e que também se lembra de filmagens no Restaurante Cimas English Bar (Avenida Marginal, Monte Estoril, Cascais, Tel. 964459335): “Para fazer um minuto ou dois estavam aqui uma noite inteira!”. Marcante foi a ligação do restaurante à família real espanhola. Os Condes de Barcelona e o seu círculo eram “presença assídua”. O “expansivo” D. Juan de Borbón utilizava o restaurante Cimas English Bar “como salão de receções e sala de jantar particular”. Tomava de aperitivo um Dry Martini muito seco e, como digestivo, um whisky Haig Dimple. Acompanhava a Sopa de cebola gratinada e o Bife de lombo grelhado com um Dão Pipas Reserva de 1963. O filho D. Juan Carlos, ainda uma criança, “brincava pelas mesas do restaurante”, escreve o livro sobre o restaurante. Os Condes de Barcelona permaneceram em Portugal até depois da Revolução dos Cravos. O Rei Humberto II de Itália e a irmã, a Rainha Joana da Bulgária, o Rei Carol da Roménia, e a família dos Condes de Paris também apareceram.
O mesmo sucedia com Silva Pais, ex-diretor da PIDE, e Marcello Caetano, que festejava o aniversário no Cimas. Preferia peixe e bebia água. Almoçou neste restaurante antes da tomada de posse de Adelino da Palma Carlos, que “criou o hábito de aqui almoçar todas as terças, quintas-feiras e sábados”. Consta que não queria seguranças, ao contrário de Cavaco Silva, que “vinha sempre com grandes seguranças”. Salazar nunca apareceu, nem Álvaro Cunhal, e José Cima Sobral refere que também aqui aconteceram “reuniões de capitães” de Abril. O dia da Revolução passou sem sobressaltos. Havia reservas, mas não apareceu ninguém. Spínola também almoçava no Cimas, comendo “grelhados e bebendo água do Luso, na companhia de Francisco Costa Gomes, este último sem preocupações de dieta”, adianta a mesma obra.
ANTÓNIO PEDRO SANTOS
Diz-se que Mário Soares “tirava sempre os sapatos debaixo da mesa ao jantar”. Veio muitas vezes, uma delas com o Conde de Barcelona, e organizou no Cimas um jantar da Internacional Socialista. Gostava de ficar na sala pequena, na primeira mesa do lado esquerdo. “Era fabuloso, uma simpatia e só comia peixe cozido”, recorda o funcionário António Ferreira Godinho. Já como primeiro-ministro, Francisco Sá Carneiro reunia com Diogo Freitas do Amaral ou Patrício Gouveia neste restaurante, para não ser tão importunado com telefonemas: “Almoçavam numa mesa, trabalhavam noutra e saíam às 19h00 ou 20h00”, recorda o anfitrião. Sá Carneiro “era apreciador de vinhos”, sobretudo do Buçaco, e também aqui jantou com Snu Abecassis. “Era muito simpático e agradável para todos, uma pessoa espetacular”, recorda António Ferreira Godinho. Ninguém jantou quando se soube da sua trágica morte.
Equipa de cozinha e sala do Cimas
Marcelo escreve tese a lápis
Ramalho Eanes celebrou aqui com os mandatários a eleição e reeleição como presidente da República, enquanto Marcelo Rebelo de Sousa escreveu a tese de doutoramento nas mesas da sala mais pequena. “Escrevia a lápis e, quando estava muito cansado, passava de uma mão para a outra. É um tipo muito engraçado. Às vezes tem aquelas ‘marcelices’, mas faz parte. É malandreco, mas estruturalmente sério”, considera José Manuel Cima Sobral. Em processo de escrita, Marcelo não comia, “só bebia água”. Antes do jantar, “entrava na cozinha” para sondar o chef sobre o que deveria comer. Apreciava a “Blatter Tarte”, com framboesa... Francisco Pinto Balsemão é um habitué que “começou a frequentar esta casa há muitos anos e traz sempre um iPad, anda atualizado”. José considera-o “perfeito para a comunicação”. Come “Consomé em geleia” seguido de “Caracóis Bourguignone” e trouxe a Portugal o cirurgião Christian Barnard, que realizou o primeiro transplante de coração, tendo jantado com Balsemão no Cimas.
Garantem os anfitriões que aqui “se fizeram e desfizeram governos” a seguir ao 25 de Abril. Paulo Portas e Passos Coelho “entenderam-se aqui em reuniões antes de serem governo” e Passos “trazia sempre uma coisa debaixo do braço para escrever”. Quando eram eleitos, os executivos do PSD “vinham cá almoçar no dia seguinte à eleição”. E foi com algum humor que Pedro Santana Lopes e Paulo Portas assinalaram, num almoço no Cimas, a dissolução do seu governo. “Quem os atendeu foi o senhor Mourão e o Santana, sempre com imensa piada, diz assim: ó senhor Mourão, a gente até está muito feliz para quem acabou de ser despedido! Lembro-me disso e dei uma gargalhada. Cada um com o seu estilo, já sabíamos que ele podia dizer isso ou outra coisa qualquer, porque é genuíno”, comenta Sara, recordando também com carinho as vindas do embaixador José Cutileiro: “Era um príncipe, homem do mundo e escritor exímio”.
Amália Rodrigues e Vasco Santana
Amália Rodrigues vinha antes de atuar no Casino Estoril, ou então cear depois e, neste caso, as noites podiam prolongar-se até às 8h00 com conversas, música a fadista a cantar “espetacularmente”. “As noites da Amália eram épicas”, confessa José. Quando Maria Bethânia se alojava no Tivoli, o staff leva-lhe comida. “Adorava queijo de Azeitão e era uma doçura, muito nossa amiga. A Fafá de Belém era outra personagem e os Sétima Legião também vinham, tal como o Tozé Brito e Diogo Infante e o José Pedro Gomes, que come sempre Bife à English Bar”.
Na memória da gerência ficaram ainda as visitas de Julião Sarmento, que adorava “Favada de caça”, José Cardoso Pires, Luís de Sttau Monteiro, David Mourão Ferreira, Urbano Tavares Rodrigues, Luís Noronha da Costa, Paula Rego, Ines Castel-Branco, Ana Brito e Cunha, João Bénard da Costa, Beatriz Costa ou Vasco Santana: “Ó miúdo, dá-me aí um Três Vintes”, atirava ao pedir tabaco. Raul Solnado partilhava gargalhadas com um amigo e o magnata Calouste Gulbenkian “era um homem simplicíssimo”. José conheceu Harry Rugeroni, do Hotel Aviz, que estacionava neste sítio o seu Rolls-Royce antigo. Um dia avariou e foi José quem descobriu um mecânico para o reparar. A propósito de motores, o Rally de Portugal “passou todo por cá, com César Torres e companhia”, tal como o piloto de Fórmula 1, Ayrton Senna.
Ementa antiga do restaurante Cimas English Bar
Passar o testemunho
Em 2002, Sara Cima Sobral começa a envolver-se mais no restaurante. A paixão com que o descreve, porém, parece tão antiga como a do pai: “O Cimas tem uma história que temos de honrar”. Do trabalho de equipa surgiu uma novidade após a crise com a Covid, a abriram o terraço ao público, que passou a poder provar as especialidades do Cimas ao ar livre, a ver o mar. “Havia o handicap de ser associado a um restaurante de inverno e aquilo foi uma aposta ganha. Os meses de verão passaram a ser extraordinários e houve um grande rejuvenescimento do target”, constata Sara. Num artigo publicado no Diário de Notícias, Miguel Esteves Cardoso incitou, em abono do Cimas, a imaginar “uma conjugação mágica das calmas atlânticas e cosmopolitas do Estoril; das exigências dos grandes mestres da Galiza; da solidez de uma Inglaterra já desaparecida; de um cozinheiro minhoto com mão de oiro...”. Palavras que sensibilizaram Sara e talvez lhe tenham reforçado a certeza: “Nunca vamos vender o Cimas. Há coisas intangíveis e às vezes as pessoas não compreendem isso. Não há preço! Na verdade, não tem, uma vez que acumula o valor de várias vidas”.
Cimas English Bar, no Estoril
Para comemorar os 50 anos do Expresso e do Recheio, fazemos uma viagem no tempo para relembrar restaurantes que marcaram as últimas cinco décadas. Acompanhe, todas as semanas, no Boa Cama Boa Mesa.
Recorde os primeiros restaurantes desta iniciativa:
A marca Recheio surgiu no mercado em 1972. 50 anos depois, dispõe de 40 lojas e três plataformas distribuídas por todo o território nacional, mantendo como grande objetivo ir ao encontro das necessidades dos clientes ao apresentar desde os ingredientes às soluções, assumindo claramente um compromisso de estar ao lado dos empresários do canal HoReCa e retalho tradicional, contribuindo para o desenvolvimento do negócio, como um parceiro.
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