Sociedade

“O crescimento económico a que todos os países ambicionam não é sustentável”, diz Filipe Duarte Santos. E esse alerta tem 50 anos

Barragem do Lindoso, Gerês
Barragem do Lindoso, Gerês
RUI DUARTE SILVA

Os reflexos da conferência de Estocolmo ao longo dos últimos 50 anos em Portugal vão estar em cima da mesa numa conferência organizada pelo Instituto de Ciências Sociais durante a próxima semana, em Lisboa. Personalidades de quatro gerações vão apresentar a sua análise sobre os avanços e recuos das políticas ambientais nacionais, entre as quais o geofísico Filipe Duarte Santos, com quem o Expresso falou

Meio século após a Conferência de Estocolmo – o primeiro grande evento da Organização das Nações Unidas (ONU) dedicado às questões ambientais – o Observatório de Ambiente, Território e Sociedade (Observa) do ICS-ULisboa realiza uma conferência dedicada ao tema “Estocolmo em Portugal – 50 anos de Políticas Ambientais”. O evento, que conta com o patrocínio do Presidente da República, realiza-se a 20 e 21 de setembro, no auditório do ICS, em Lisboa, e tem como oradores duas dezenas de personalidades, de quatro gerações diferentes, que se destacaram em várias áreas da atuação ambiental em Portugal, desde 1970 até à atualidade.

Uma questão de “pragmatismo”

Entre estes, encontramos o geofísico Filipe Duarte Santos, que preside ao Conselho Nacional para o Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CNADS). Em declarações ao Expresso, Filipe Duarte Santos lembra que “o crescimento económico a que todos os países ambicionam não é sustentável” e que o alerta foi dado em 1972 pelo livro “Os Limites do Crescimento”, escrito pelo casal Meadows, com base num modelo computorizado que cruzava variáveis como os recursos naturais limitados, o crescimento da população mundial, a industrialização, a poluição e a produção de alimentos. “Na altura o livro foi muito criticado, mas o que é um facto é que está a verificar-se e a situação já é complicada”, frisa Filipe Duarte Santos.

O Presidente do CNADS lembra que as políticas ambientais nacionais "têm sido muito influenciadas pelas políticas ambientais e de sustentabilidade da União Europeia, mas que, se se olharmos para as alterações climáticas, tudo o que se faz a nível nacional e europeu é também muito influenciado pelo que se faz à escala global”.

E a realidade mundial mostra que as emissões globais de gases com efeito de estufa estão a aumentar, revelando que “o mundo não está a seguir o caminho mais sustentável”. Mesmo Portugal, que foi dos primeiros a aprovar uma Lei do Clima, pouco avançou em políticas governativas concretas”, diz.

A pandemia de Covid 19 e outras zoonoses que têm ocorrido com menor distância no tempo nos últimos 20 anos, revelam também como a humanidade tem acelerado a luta contra a natureza, destruindo ecossistemas. Olhando para o caso português, o geofísico lembra que “não tem existido uma gestão proativa das nossas áreas protegidas nem uma proteção efetiva da biodiversidade”..

Se a seca que vivemos este ano é também um sintoma da crise climática global, a definição e concretização de medidas para atenuar o problema ou nos adaptarmos à nova realidade também marcam o passo. Como exemplo, refere o facto de termos uma única dessalinizadora a funcionar (em Porto Santo na Madeira, desde a década de 80) e haver muitas resistências ao uso de águas residuais tratadas e recicladas para consumo na agricultura ou lavagens de rua. E lembra que, “em Singapura, 40% da água que é consumida vem de águas residuais tratadas”. No entender de Filipe Duarte Santos “falta pragmatismo e colaboração institucional para resolver muitos dos problemas ambientais que enfrentamos”.

A conferência dedicada às políticas ambientais ao longo dos últimos 50 anos em Portugal conta entre os vários oradores com personalidades como Francisco Pinto Balsemão (fundador do Expresso), Rui Vilar (ex-presidente da Fundação Calouste Gulbenkian) ou Carlos Pimenta (ex-secretário de Estado do Ambiente) e com investigadores de várias áreas como Luísa Schmidt, Helena Freitas, Viriato Soromenho-Marques ou Miguel Bastos Araújo, além de ambientalistas como Susana Fonseca da Zero e vários jovens ligados ao movimento Lidera.

O ministro do Ambiente e da Ação Climática, Duarte Cordeiro, encerra o encontro. Organizada pelo Observa, a conferência “tem como propósito refletir sobre o significado político que a Conferência de Estocolmo assumiu no nosso país” e “entender a evolução – altos e baixos – das políticas ambientais entre nós nos últimos 50 anos”.


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