PSP deixa nas mãos da IGAI investigação ao sindicato que insinuou que mulher negra agredida na Amadora tem “doenças graves”
A paragem onde desceu Cláudia Simões e a filha de oito anos. Foi aqui também que Carlos Canha agarrou a mulher
DR
Após um comentário do Sindicato Unificado da Polícia de Segurança Pública sobre a alegada agressão a uma mulher na Amadora, a Direção Nacional da PSP admitiu investigar aquela organização sindical e, se necessário, tomar medidas
A Direção Nacional da PSP não vai investigar o Sindicato Unificado da Polícia de Segurança Pública, que tinha partilhado nas redes sociais uma publicação em que insinuava que a mulher negra agredida na Amadora teria “doenças graves”. Ao Expresso, fonte da PSP explica que uma vez que a Inspecção Geral da Administração Interna (IGAI) já está a investigar, “o mais adequado” é deixar essa investigação prosseguir.
“Como a IGAI já abriu um inquérito na sequência de uma queixa da Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial, o mais adequado é unir esforços e unir tudo nessa investigação. Além disso, a medida que eventualmente a PSP poderia vir a tomar - uma participação criminal - também pode ser tomada pela IGAI”, explica. Na semana passada, em declarações ao Expresso, a Direção Nacional da PSP admitiu “a necessidade de analisar e, eventualmente, tomar medidas”.
A IGAI, referia o “Público” na quinta-feira quando dava conta da abertura do inquérito, solicitou “à Direcção Nacional da PSP que sobre a mesma se pronuncie”. “Estamos em contacto e a prestar todo o apoio necessário”, assegura a PSP. E insiste: “a instituição não se revê de forma alguma naquilo que foi publicado pelo sindicato.”
Em causa está uma publicação do Sindicato Unificado da Polícia de Segurança Pública partilhada a 22 de janeiro e, dias depois, apagada. A publicação era composta por fotografias, alegadamente dos ferimentos do agente Carlos Canha - não é possível confirmar nas imagens a identidade -, e pela insinuação de que mulher negra que o acusa de agressão tinha “doenças graves”. “As melhoras ao colega e espero que as análises sejam todas negativas a doenças graves”, podia ler-se até esta quinta-feira.
A publicação entretanto apagada
O Sindicato Unificado da Polícia de Segurança Pública define-se como uma organização sindical “autónoma e independente do Estado, dos governos, das confissões religiosas ou quaisquer organizações de natureza político ou partidárias”.
A direção do sindicato é dirigida por Ernesto Peixoto Rodrigues, agente principal da PSP que em julho deste ano foi alvo de uma pena disciplinar de aposentação compulsiva por parte do Ministério da Administração Interna - consiste na passagem forçada à situação de aposentação, com cessação do vínculo funcional, e são aplicáveis às infrações disciplinares muito graves. O ex-agente tinha faltado ao serviço sem justificação 83 dias seguidos. Peixoto Rodrigues foi também o número 10 na lista da coligação Basta!, que nas eleições europeias de maio teve como cabeça de lista o líder do Chega, André Ventura.
Há uma semana, uma série de vídeos divulgados nas redes sociais mostravam o agente da PSP, Carlos Canha, a agir sobre Cláudia Simões, uma mulher de 42 anos que fizera uma viagem de autocarro com a filha de oito anos. A criança não tinha o passe consigo e, apesar de a mulher ter assegurado que na paragem de destino estaria o filho mais velho com o passe da menina, a situação gerou algum conflito. No destino, o motorista chamou o agente que viria a deter Cláudia Simões. O que aconteceu em seguida tem duas versões.
A mulher garante que foi agredida e que, após ter sido imobilizada na paragem de autocarro, foi posta dentro de um carro de patrulha, onde permaneceu mais de uma hora enquanto era espancada. Haveria depois de cair inanimada à porta da esquadra da Boba.
Já a PSP, em comunicado divulgado às redações, diz que Cláudia Simões se “mostrou agressiva perante a iniciativa do polícia em tentar dialogar, tendo por diversas vezes empurrado o polícia com violência, motivo pelo qual lhe foi dada voz de detenção”. Acrescenta que a mulher, “para se tentar libertar, mordeu repetidamente o polícia, ficando este com a mão e o braço direitos com marcas das mordidelas que sofreu e das quais recebeu tratamento hospitalar”. Apenas com a chegada de reforço policial “foi possível conter as pessoas no local” e “promover a condução da cidadã à esquadra para formalização da detenção e notificação para comparência em tribunal às 10h00 do dia 21”.