Política

Marcelo aceita metade do plano Costa para uma regionalização suave

Marcelo aceita metade do plano Costa para uma regionalização suave
Joao Girao

Marcelo é contra a regionalização 'hard'. E disse ontem aos autarcas de todo o país que seria pôr "o carro à frente dos bois". No entanto, manifestou-se a favor de metade da regionalização 'soft' que Costa propôs: aceita a eleição indireta das CCDR mas chumba a eleição direta pelo povo nas áreas metropolitanas. Este texto já atualiza a versão publicada este sábado na edição do Expresso em papel

Marcelo aceita metade do plano Costa para uma regionalização suave

Ângela Silva

Jornalista

Marcelo aceita metade do plano Costa para uma regionalização suave

Filipe Santos Costa

Jornalista da secção Política

Marcelo aceita metade do plano Costa para uma regionalização suave

Isabel Paulo

Jornalista

Marcelo aceita metade do plano Costa para uma regionalização suave

Vítor Matos

Jornalista

A regionalização não será assunto nesta legislatura — António Costa já assumiu que, sendo o Presidente da República adversário dessa ideia, ela fica em stand by —, mas o Governo tem em marcha uma espécie de plano B, uma regionalização light, que passa, por um lado, pela eleição direta dos presidentes das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto e, por outro, pelo reforço das competências e legitimidade das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR).

No núcleo duro de coordenação política do Executivo a decisão está tomada, e é para avançar no próximo ano. A ideia é esvaziar a pressão dos sectores regionalistas, que receberam um novo estímulo com o relatório da Comissão Independente para a Descentralização, apresentado no verão por João Cravinho, e que aponta claramente no sentido de avançar com a criação das regiões administrativas. Essa é uma guerra em que António Costa não se quer meter, sabendo que teria aí um choque frontal com Marcelo Rebelo de Sousa, mas o primeiro-ministro acredita que será possível avançar com uma estratégia gradual de reforço das CCDR e de aproximação das áreas metropolitanas àquilo que seriam as duas primeiras regiões administrativas.

“Não é impossível que o Presidente da República aceite esse meio termo, até como válvula de escape em relação à regionalização pura e dura”, admitiu ao Expresso fonte governamental. Mas não era líquido que Marcelo Rebelo de Sousa - que na anterior legislatura obrigou Costa a deixar cair o que considerou ser uma “regionalização encapotada” - estivesse disposto a baixar a guarda. O Presidente não mudou de ideias sobre a regionalização e disse esta sexta-feira à tarde, aos autarcas que estavam em Vila Real, no congresso da Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP), que nem pensar em referendos sobre a regionalização antes das autárquicas. Seria "pôr o carro à frente dos bois".

Embora até esta sexta-feira não se soubesse para onde ia pender o Presidente, Marcelo optou por uma solução salomónica. Aceitou uma parte das ideias do Governo para esta regionallização suave e chumbou outra. Para Marcelo, é aceitável a eleição indireta das CCDR pelos autarcas de cada região, com um respetivo aumento de competências: "Essa reforma faz todo o sentido, por envolver mais atribuição de poderes locais e manter a ligação à Administração central”.

Mas discorda da eleição direta das áreas metropolitanas: “As CCDR e as áreas metropolitanas não colidem em legitimidade de poderes, mas é de bom senso que não se alimentem contradições”, sublinhou Marcelo no congresso da ANMP, alegando ser prematuro a eleição dos presidentes da AML e do Porto por voto popular.

O que defende o Governo

O reforço das estruturas supramunicipais já existentes — as duas áreas metropolitanas e as CCDR — é a opção que o primeiro-ministro quer acelerar. Na Área Metropolitana de Lisboa e do Porto os respetivos presidentes já são eleitos por via indireta, através de um colégio eleitoral composto pelos membros das câmaras, assembleias municipais e juntas de freguesia. O plano do Governo passa, agora, por aplicar o modelo destas duas áreas metropolitanas à liderança das CCDR: em vez de serem indicados pelo Executivo, os cinco presidentes das comissões de coordenação regionais serão eleitos pelos representantes das autarquias da respetiva região. Mas o próprio Manuel Machado, presidente da Associação Nacional de Municípios, entende que se o processo não evoluir e se ficar pela eleição indireta nas CCDR, pode uma “regionalização encapotada” (e foi essa a posição de Marcelo na anterior legislatura).

Quanto às áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, a ideia é que os presidentes se submetam ao voto dos eleitores, à semelhança do que acontece na Madeira ou nos Açores com os presidentes dos respetivos governos (um dos caminhos apontados pela chamada ‘Comissão Cravinho’). Como nas ilhas, passaria a existir também uma assembleia metropolitana, com “deputados” eleitos diretamente. É isso que está escrito no programa do Governo, até com data marcada: “Democratizar as áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto, com uma assembleia metropolitana eleita juntamente com as eleições autárquicas de 2021, a qual aprovará por maioria a constituição de um executivo metropolitano.” No entanto, os socialistas Fernando Medina, presidente da Área Metropolitana de Lisboa, e Eduardo Vítor Rodrigues (autarca de Gaia) e presidente da do Porto, já disseram que era melhor adiar para já esta componente e manter apenas a das CCDR. Coincidem com Marcelo neste pressuposto.

No fundo, se o projeto fosse todo por diante, era como se a regionalização avançasse com duas regiões-piloto em Lisboa e no Porto. Em paralelo, nas CCDR, além da eleição indireta dos presidentes, o Governo quer reforçar as respetivas competências, “nas áreas da educação, saúde, cultura, ordenamento do território, conservação da natureza e florestas, formação profissional e turismo, bem como dos órgãos de gestão dos programas operacionais regionais e demais fundos de natureza territorial”.

À espera do PSD

Todo o plano do Governo para avançar com esta regionalização suave também depende do apoio do PSD, pois a eleição direta dos presidentes das áreas metropolitanas implicaria uma revisão constitucional — trata-se da criação de uma nova autarquia local, o que só pode ser feito mexendo na lei fundamental. E, para isso, o PS precisava dos votos dos sociais-democratas. Ou seja, para já, tudo depende do desfecho da corrida à liderança laranja.
Os socialistas têm poucas certezas sobre o que daí poderá vir, tendo em conta que Luís Montenegro promete uma rutura total com o PS, e Rui Rio adotou, desde a campanha eleitoral, uma postura bastante mais agressiva em relação ao Governo.

Apesar disso, Rio continua a ser visto como um interlocutor mais provável em relação a reformas como esta, tendo em conta que se tem declarado apoiante da descentralização. Se Rio aceitar a ideia de usar as áreas metropolitanas como primeiro passo para as regiões, Costa pode ter o apoio de que precisa no Parlamento. Depois, tudo dependerá do Presidente da República: para já Marcelo marcou o terreno. António Costa e Alexandra Leitão vão aproveitar a deixa?

Nota: este texto atualiza a versão que é publicada este sábado na edição do Expresso em papel

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: AVSilva@expresso.impresa.pt

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate