Presidente da Fundação EDP: “O ativismo é legítimo e deve ser acolhido pela sociedade, mas sou apologista de um ativismo mais construtivo”
Vera Pinto Pereira acredita que, em 2030, a elétrica nacional produzirá apenas energias 100% limpas. Solar, eólica, hídrica e projetos pontuais de hidrogénio verde serão as responsáveis pela transição energética em Portugal. Garante ainda que a empresa está a tentar não deixar ninguém para trás. Empresas e particulares. Ouça a Presidente da Fundação EDP e Membro Executivo do Conselho de Administração do Grupo EDP no novo episódio do podcast Ser ou Não Ser
A Fundação EDP tem 18 anos e “a sua principal função é apoiar os socialmente mais desfavorecidos”. É um dos maiores mecenas da cultura em Portugal e em termos de inovação social, Vera Pinto Pereira garante estarem também a trabalhar numa transição energética justa e inclusiva que não deixe ninguém para trás. Os ativistas do grupo Climáximo parecem discordar. Em fevereiro, de 2023, pintaram de vermelho a fachada do Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia (MAAT), em Lisboa, como protesto contra a atividade da EDP na crise climática.
A presidente da Fundação EDP defende que o ativismo é legítimo e deve ser acolhido pela sociedade para chamar a atenção de temas com alguma urgência “e de facto as alterações climáticas são um tema urgente, mas, não obstante, sou apologista de um ativismo mais construtivo, sobretudo quando estamos a falar do MAAT, um dos museus que valoriza a cidade de Lisboa, portanto, essa intervenção é um pouco paradoxal”. Vera Pinto Pereira reforça ainda que vivemos num país, que apesar de ainda ter todo um caminho a percorrer, está na linha da frente no que respeita a matéria de energia renovável. “A EDP é uma das elétricas mais verdes do mundo. Mais de 80% da energia que produzimos é energia verde. Temos um compromisso muito sério com a sustentabilidade e com o impacto ambiental”. A gestora reforça ainda que a empresa assumiu o fim do carvão até 2025. “Temos vindo a descomissionar várias centrais de carvão”.
Será possível viver com energias 100% renováveis?
“Acredito que é possível, sim!”, justificando que recentemente Portugal viveu seis dias, utilizando apenas energias renováveis. A presidente da Fundação EDP garante que com as energias eólica, hídrica, solar, e com alguns projetos pontuais de hidrogénio, a empresa elétrica atingirá o objetivo a que se propôs: ser totalmente verde até 2030. Agora, estão nos 85%. Entre 2021 e 2025, a EDP investirá 24 mil milhões de euros para atingir os 100%, o que representa um valor anual na ordem dos 4,8 mil milhões de euros.
Vera Pinto Pereira sabe que têm desafios pela frente, como a intermitência ou o armazenamento de energia, as cadeias de fornecimento, a ligação à rede, os temas da economia circular, entre outros obstáculos que terão de ultrapassar, mas está confiante. A Presidente da Fundação EDP chama, no entanto, a atenção que esta transição energética passa também por cada um de nós e pelas empresas, confessando que este é um desígnio a que se tem dedicado nos últimos seis anos, ou seja, “a transformação da EDP comercial, uma simples comercializadora de energia, num parceiro dos clientes em matéria de transição energética”. Para Vera Pinto Pereira estamos num momento de grandes desafios mas, ao mesmo tempo de muitas oportunidades, como por exemplo, “uma maior independência da energia fornecida pela rede, estabilidade de preços, proteção relativamente à volatilidade, todo o tema da mobilidade elétrica e eficiência energética”.
Segundo Vera Pinto Pereira, até 2030, a empresa investirá mais de 300 milhões de euros em projetos com impacto social que estão sobre o chapéu da EDP YES, uma nova marca global e transversal a todas as geografias onde a elétrica está presente. “Estamos em 30 países e agregamos debaixo deste chapéu cerca de 500 projetos que estão a decorrer ou que serão lançados brevemente”. A estratégia da nova marca assenta em cinco eixos: acesso a energia e eficiência energética, biodiversidade e economia circular, cultura, capacitação de jovens e adultos e, por fim, a comunidade. “Esta transição energética criará imensas oportunidades de novos empregos, mas é preciso capacitar as pessoas para participarem”. A presidente da Fundação EDP dá como exemplo a escola de eletricistas para mulheres que desenvolveram no Brasil.
Claudio Sunkel, Bruno Soares Gonçalves, e João Crespo
A Fundação EDP além dos projetos para a comunidade tem ainda os flagships projects, que são implementados de forma transversal em todos as geografias onde estão presentes com uma linguagem comum e com impactos equivalentes, como por exemplo, a geração solar distribuída, “portanto atuamos junto das comunidades desfavorecidas. Recentemente, fizemos um projeto no bairro da Cova da Moura, em Lisboa, onde distribuímos 300 painéis solares a 150 famílias para que estas pudessem usufruir de energia limpa e ligação à rede, uma vez que nem sempre a têm de uma forma legal”. Cada uma das famílias recebeu dois painéis solares para produção de energia em regime de auto consumo e um frigorífico eficiente como complemento. Nesta ação, a EDP trabalhou em conjunto com quatro associações locais — Associação de Moradores, Associação de Solidariedade Social, Moinho da Juventude e Nasce e Renasce, que foram fundamentais na identificação das maiores necessidades do bairro, nos contatos com as famílias residentes e na instalação dos equipamentos.
A Fundação EDP com o Instituto EDP em colaboração com uma ONG local está a fazer a mesma categoria de ações no Brasil, levando iluminação pública com nove postes de energia elétrica sustentável à Favela dos Sonhos, em Ferraz de Vasconcelos, antiga Favela Boca de Sapo, em São Paulo, uma das mais perigosas do Brasil, “dando desta forma segurança aos seus habitantes, principalmente às mulheres, para que estas possam circular à noite com mais facilidade”. Além disso, criaram um bairro solar.
“Temos ainda a nascer em Portugal um projeto de eficiência energética que abrange 170 famílias que vivem em pobreza energética”, ou seja, não é apenas falta de energia, mas é viver com condições ambientais de clima muito difíceis, ou têm muito calor, ou têm muito frio, ou têm humidade... Mais uma vez a Fundação EDP trabalha com Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) que identificam as habitações carenciadas e com parceiros que fazem as obras necessárias. “É um projeto que estamos a exportar para Espanha”.
A transição energética tem um custo importante para as empresas e para as famílias, por isso “temos vindo a criar dentro na nossa oferta novos modelos de negócio para reduzir esta barreira à adesão”. A presidente da Fundação EDP destaca como exemplo o “as a service”, que na sua opinião é muito relevante para as Pequenas e Médias Empresas (PME). “Face à volatilidade dos mercados de energia, numa rubrica de custos que é muitas vezes elevada e com imprevisibilidade a nível orçamental, o que a EDP faz é uma instalação solar nestas PME e temos trabalhado com milhares delas pelo país fora”. No caso da energia solar, a EDP assegura o investimento inicial da instalação dos painéis solares e essa instalação é propriedade e é mantida pela EDP. O cliente aproveita essa energia gerada, pagando-a a um preço bastante descontado que pode chegar a poupanças na ordem dos 30%, sobre o preço da energia que vem da rede. “São ferramentas que não têm custo de entrada para os clientes e que permitem às empresas ver uma redução substancial da sua fatura energética”. Por isso, Vera Pinto Pereira acredita que fazer a transição energética não pode passar apenas pela inovação tecnológica, tem de passar também pela transformação dos modelos de negócio.
No caso das famílias, garante que têm mantido uma política de preços razoavelmente estáveis ao longo dos anos, protegendo-as das flutuações de preços. “Nas famílias fugimos dos preços indexados porque, apesar de terem coisas boas, podem ter surpresas muito negativas”. Têm também apostado nos contratos de longa duração, conseguindo garantir um preço fixo, gerível e previsível por parte do cliente. “Temos empresas com contratos com maturidades cada vez mais longas e depois temos estes projetos, sejam de geração solar, ou de eficiência energética, que permitem a longo prazo que empresas e famílias tenham uma fatura de energia mais estável e menos pesada”.
O terceiro setor e a transição energética
“O EDP Energia Solidária, ao longo dos últimos anos já investiu 18 milhões de euros, em Portugal, no apoio ao terceiro setor”. Trata-se de um programa onde iniciativas se podem candidatar e beneficiar de um financiamento. Neste momento, as ajudas centram-se na transição energética como, por exemplo, acesso a veículos 100% elétricos, instalação de wallboxes de carregamento, apoio aos gastos com eletricidade e formação sobre utilização eficiente de veículos elétricos, entre outros. Vera Pinto Pereira destaca o apoio a 15 projetos sociais para a transição energética de uma forma justa. “Estes pretendem melhorar a qualidade de vida de pessoas com deficiência, seniores, famílias em situação de fragilidade social, económica e refugiados, entre outros públicos”, lê-se no site da Fundação EDP. No total, preveem ter um impacto positivo direto na vida de mais de 18 mil pessoas Este apoio é atribuído no âmbito do Programa EDP Energia Solidária 2023 e representa um investimento na ordem de 1 milhão de euros, em Portugal.
Quanto ao tema da diversidade, “é um caminho que a empresa está a fazer e tem feito um trabalho extraordinário no que diz respeito à participação das mulheres na força de trabalho na EDP”. Para Vera Pinto Pereira, a diversidade vai além do género. Tem de ser vista na diferença de gerações, nacionalidades e cultura e é isso que na sua opinião traz riqueza às discussões. “Se pensarmos que 50% das tecnologias que vamos precisar para fazer a transição ainda não foram inventadas. A diversidade será fundamental neste aspeto”.
'Ser ou não ser' é um podcast semanal sobre o mundo da sustentabilidade, da ecologia e da responsabilidade. A cada episódio, mergulhamos em tópicos relevantes, desde práticas individuais até iniciativas globais, com convidados apaixonados por este tema. Damos voz a líderes de empresas, ativistas, empreendedores e especialistas, para partilharem experiências e soluções inovadoras para um futuro mais sustentável. 'Ser ou Não Ser' é um podcast do Expresso SER, com moderação da jornalista Teresa Cotrim e o convidado residente Frederico Fezas Vital, professor e consultor na área da inovação social, impacto e empreendedorismo. A coordenação está a cargo de Pedro Sousa Carvalho.