A Beleza das Pequenas Coisas

Dino D´Santiago: “Lisboa é uma cidade crioula, aculturada, que se mistura e sabe conviver com as diferenças”

Há quem o chame de embaixador da nova música portuguesa e de uma nova Lisboa, mestiça, reinventada, multicultural. Madonna escolheu-o como guia musical da nossa capital e foi através dele que melhor conheceu o Fado, o funaná ou as batucadeiras de Cabo Verde. Os temas de Dino D ´Santiago traduzem um vibrante mundo novo, transnacional. Ou ‘Mundu Nôbu’, nome do último álbum. Talvez Nuno Artur Silva, o novo secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media, tenha mesmo razão por afirmar que o discurso do 10 de Junho deveria ter sido feito por Dino porque “é o melhor exemplo do que é hoje Lisboa, para lá do turismo.” Agora que acaba de lançar o último EP “Sotavento”, Dino revela mais das suas raízes, e embora confesse já ter sofrido o racismo na pele, afirma: “Olho para mim como uma herança muito positiva do que foi o colonialismo”

Foi a poucas horas de Dino D´Santiago embarcar para Londres, para onde viaja uma vez por mês para gravar e ensaiar novos temas, que teve connosco esta conversa. Falámos da sua infância na Quarteira, de como se tornou o guia musical de Madonna, em Lisboa, ou de como a reconciliação com as suas raízes cabo-verdianas o ajudaram a encontrar a sua identidade artística. Deixamos-lhe aqui um breve excerto do tanto que pode ouvir neste episódio em podcast, que inclui dois temas cantados por si à capela.

"Anda meio mundo a dizer mal desta nova Lisboa modificada e descaracterizada para os turistas, mas o Dino canta uma outra Nova Lisboa, uma Lisboa crioula. Que Lisboa é essa? É mistura. Muitas vezes interpretamos o crioulo como sendo [só] negro e não é. É o resultado entre a mistura do que é esta Lisboa que vem de Goa a São Tomé, do Brasil a Cabo Verde e desagua aqui no Tejo. Chega um momento em que se deixa de ser português, cabo-verdiano, angolano, são-tomense e passa-se a ser crioulo. Sinto que canto uma nova Lisboa que já vem de há vários séculos. Vamos tendo [ao longo da História] várias novas Lisboas. Só estava a faltar reclamarmos isso e ecoarmos para o resto do mundo.

Lisboa é singular nisso? Sim. Lisboa é um bom exemplo de uma cidade aculturada, crioula, que se mistura e sabe conviver com as diferenças. E é completamente das outras capitais, como Paris, Londres, Nova Iorque. Cidades essas que têm várias culturas nelas, sim, mas sente-se claramente que tudo é muito separado e segregado. E aqui em Lisboa, não. A grande diferença entre Lisboa e as outras capitais é que na nossa capital vive-se uma aculturação e nas outras vivem-se [várias] culturas.

Mas não sente o mesmo em Berlim, por exemplo? Aí é uma mistura muito controlada. Já sentes uma liberdade maior, e Berlim está a tornar-se na nova Londres. Muita gente de Inglaterra está a ir para Berlim, os preços são melhores, as oportunidades são maiores para as start ups. Mas quando vais a um Club [em Berlim] não é como ir a uma festa da ‘Na Surra’, no B.Leza, da Enchufada, ou ir a uma ‘Noite Príncipe’ no Music Box, em Lisboa. Daí vários músicos estarem a vir para Lisboa.

Lisboa está na moda para os artistas? Principalmente é [uma cidade] para os artistas. Daí vários músicos e atores do Brasil e EUA estarem a vir para Lisboa. Vêm-se inspirar nesta Lisboa que tanto mistura. Porque eles [os americanos e os brasileiros] vivem um separatismo tremendo. Cada vez mais notas o que está a acontecer do outro lado do oceano que não é nada em concordância com o nosso país.

Isso leva-me a falar da vinda de Madonna, para Lisboa. Que por uns tempos trocou a América por Portugal como reacção à eleição do Presidente Trump. Esse foi o motivo principal. Teve outras cidades em equação, como Londres, também pensou ir para África, mas optou por Lisboa por reunir essa mistura. E ela percebeu que os filhos que adoptou, de origem africana, seriam aqui mais livres. A sua família foi feliz aqui. Madonna teve que partir agora em tour [com o espetáculo Madame X] mas acredito que Portugal vai ser um dos [seus] portos seguros."

Isto e muito mais para ouvir neste podcast. Desta vez a edição áudio é do José Cedovim Pinto. E a beleza deste genérico é uma criação original do músico Luís Severo. O belíssimo retrato é assinado por Tiago Miranda.

Mantemos o desafio a todos os ouvintes que enviem as suas opiniões, sugestões, histórias e comentários para abelezadaspequenascoisas@impresa.pt

Até para a semana, pratiquem a empatia e boas conversas!

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