Hoje celebramos mais um Dia da Europa. As efemérides servem para fazer memória, e, neste caso, relembrar que há 73 anos (1950), após duas guerras mundiais, totalitarismos, o Holocausto, a ocupação de países soberanos, muita destruição e sofrimento, foi possível trazer a paz para dentro das fronteiras do projeto europeu, que se foi sucessivamente alargando, dos 6 membros nos anos cinquenta até chegar aos 27 atualmente, e aprofundando, dando forma à UE que hoje conhecemos: um espaço de liberdade, segurança e valores comuns.
O Dia da Europa serve também para reconhecer as vantagens da resposta coletiva aos desafios transnacionais como a pandemia, a crise económica, energética ou migratória, e para continuar a defender a paz na Europa, que nunca pode ser dada como garantida, como é aliás evidente desde que a Rússia iniciou uma invasão em larga escala da Ucrânia. Por isso, celebrar este projeto de paz ainda faz mais sentido hoje, assim como continuar a apoiar a luta da Ucrânia.
Mas o Dia da Europa deve ser ocasião também para pensar o futuro da UE, nomeadamente dar seguimento às candidaturas dos países vizinhos que almejam pertencer e beneficiar deste projeto de paz, que foi sempre e é um “clube” aberto. De facto, os valores da UE e a sua abertura histórica ao alargamento significam que a UE poderá eventualmente alargar-se a todos os países europeus que desejem aderir e que cumpram os critérios de adesão.
Os alargamentos sucessivos ajudaram a reforçar e a estabilizar a democracia, a segurança e a estabilidade da Europa, facto sublinhado aquando da atribuição do Prémio Nobel da Paz à UE em 2012. Daí o alargamento ter sido sempre considerado um dos instrumentos políticos mais eficazes da UE, capaz de transformar as instituições domésticas e as políticas públicas dos Estados candidatos, porque assente na perspetiva e na recompensa da adesão à UE.
Contudo, não há alargamento da UE desde 2013, apesar dos vários candidatos à adesão, como a Turquia (desde 1999) e os países dos Balcãs Ocidentais. Vai fazer 20 anos em junho que os líderes dos Estados-membros da UE reiteraram, em Salónica, o seu apoio inequívoco à perspetiva europeia dos países dos Balcãs Ocidentais e que o futuro destes países seria a integração na União. Destes países, apenas a Croácia conseguiu a adesão, em 2013.
A guerra na Ucrânia abriu o novo debate sobre o alargamento da UE com os pedidos de adesão da Ucrânia, da Moldova e da Geórgia, aos quais os líderes dos Estados-membros, em junho de 2022, responderam com a decisão histórica da atribuição do estatuto de país candidato aos dois primeiros e à Geórgia assim que sejam tratadas as prioridades especificadas no parecer da Comissão. Esta decisão reflete a importância do contexto e do apoio moral e material à Ucrânia, invadida pela Rússia, bem como aos países expostos à guerra híbrida russa. Daí o alargamento a estes vizinhos assumir um sentido geopolítico.
O mesmo se pode aplicar ao processo de adesão estagnado dos Balcãs Ocidentais, que também ganhou um novo sentido, pois importa garantir que estes países continuem orientados para a UE e para os seus valores, mantendo longe a influência de outros atores como a Rússia, a China ou a Turquia.
Mas se o alargamento da UE à Ucrânia, Moldova e Balcãs Ocidentais é do interesse estratégico vital a longo prazo para a UE, também é fundamental que a UE e os seus vizinhos estejam preparados, sendo crucial garantir que o alargamento não mine a unidade e a coesão da UE, mas a fortaleça e a torne um ator mais estratégico na sua vizinhança.
Já em 1993, ao mesmo tempo que definiam os critérios de adesão à UE, preparando o grande alargamento aos países da Europa Central e Oriental, os líderes dos Estados-membros reunidos em Copenhaga reconheciam que a capacidade da União para absorver novas adesões, mantendo simultaneamente a dinâmica da integração europeia, constituía também um importante fator de interesse geral tanto para a União como para os países candidatos. Por isso, nas anteriores vagas de alargamento, as reformas nos países candidatos foram sempre acompanhadas de reformas institucionais na UE.
Neste sentido, não é surpresa que a guerra na Ucrânia e o futuro alargamento tenham intensificado o debate sobre a necessidade de reforma da UE e do seu processo de tomada de decisões, pois uma UE alargada também tem de ser capaz de atuar. Tal implica reduzir o âmbito de aplicação da regra da unanimidade, tanto na política externa como noutros domínios, a fim de que sejam tomadas mais decisões por maioria qualificada. Implica ainda abordar questões difíceis sobre o orçamento da UE, a Política Agrícola Comum e a política de coesão, sendo que o alargamento da UE continua a ser um ponto de divergência entre os Estados-membros, que têm de aprovar a futura adesão por unanimidade e depois ratificá-la nacionalmente.
Perante a pressão crescente dos países candidatos, o alargamento aos países dispostos a cumprir os critérios, garantindo ao mesmo tempo os valores e a capacidade de ação da UE, o que implicará necessariamente reformas, é dos maiores desafios da UE e dos seus Estados-membros, mas é também do maior interesse estratégico, porque constitui um investimento na paz e estabilidade da Europa a longo prazo.
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