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Opinião

Prudência e bom senso. Ou a falta de ambos

Prudência e bom senso. Ou a falta de ambos

Eunice Lourenço

Editora de Política

Caso de Alexandra Reis mostra bem como as exigências dos eleitores vão para além da lei enquanto os políticos se escudam na lei como bitola

A julgar por este texto da Anabela Campos, Alexandra Reis bem que pode ser a pessoa certa para secretária de Estado do Tesouro, onde uma das tarefas é fazer a ponte entre as Finanças de Fernando Medina e as Infraestruturas de Pedro Nuno Santos em tudo o que diz respeito a assuntos partilhados sobre a TAP. Mas a soberba e a imprudência desses mesmos ministros e do próprio primeiro-ministro fará com que António Costa tenha de fazer mais uma remodelação de secretários de Estado.

Todo o caso envolvendo a atual governante e ex-administradora da TAP me tem feito lembrar este estudo de Luís Sousa e Susana Coroado para a Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) que mostra como a perceção de políticos e eleitores é diferente no que diz respeito a situações como esta. E não me sai da cabeça a frase de Luís Sousa quando lhe perguntei o que faz falta aos políticos para perceberem os eleitores, depois de tantos casos e estudos. “Falta a prudência que recomendavam os clássicos gregos e do Renascimento. Tantos pensadores políticos recomendaram prudência e algum controlo na soberba, porque o poder geralmente leva a alguns exageros”, respondeu-me o investigador.

O Governo gere a TAP. A tutela direta é de Pedro Nuno Santos, mas partilhada com Medina devido aos milhões injetados. Alexandra Reis foi administradora da TAP; saiu ainda com dois anos por cumprir e recebeu, em fevereiro deste ano, uma indemnização de 500 mil euros, meio milhão. Em junho, o ministro das Infraestruturas chamou-a para liderar a NAV (responsável pela gestão e controlo da navegação aérea); menos de seis meses depois Fernando Medina escolheu-a para ocupar a secretaria de Estado do Tesouro, numa mudança de secretários de Estado motivada pela saída de Mendonça Mendes dos Assuntos Fiscais para substituir Miguel Alves como secretário de Estado Adjunto do primeiro-ministro.

Sobretudo com o caso Miguel Alves bem fresco, seria de acautelar bem o passado, pelo menos o passado recente, dos novos nomes chamados para o Governo, de forma a evitar mais um caso, ou um casinho que fosse. Mas nem um mês passou da posse e já este Governo tem mais um caso: a secretária de Estado do Tesouro recebeu meio milhão de euros para sair de uma empresa pública onde o Estado colocou milhares de milhões.

O Governo primeiro calou; o Presidente falou para sugerir uma devolução da verba. “Era bonito”, disse Marcelo. Só devolvo o que for ilegal, respondeu a secretária de Estado, mostrando como o estudo da FFMS está certo. “Para os políticos, é realmente condenável aquilo que a lei determina que é proibido fazer, enquanto os cidadãos acham que a boa conduta vai além do que está na lei”, explicava ao Expresso Susana Coroado quando o estudo foi divulgado.

Os ministros Pedro Nuno e Fernando Medina, que mandam na TAP, pediram esclarecimentos à empresa que tutelam sobre as condições de saída da secretária de Estado. E até fizeram um comunicado conjunto a dizer que tinham pedido. Não sabiam quando Alexandra Reis foi escolhida para o Governo? Não lhe perguntaram? Ela não considerou necessário salientar ou reforçar esse dado quando foi convidada? Ou sabiam e não lhes passou pela cabeça que, mais tarde ou mais cedo, teriam um problema político nas mãos? Ou acham que o facto de a indemnização até ser abaixo do que seria devido é um bom argumento? E Costa sabia? Qualquer das respostas é má, mas saber e achar que não teriam um problema é a pior de todas, pois mostrará como estão desligados da perceção dos eleitores

"É como pensam muitos portugueses, dizem: a senhora saiu daquele lugar, tinha direito por lei a ter aquilo, mas na medida em que está a exercer uma função pública há quem pense que era bonito prescindir disso, atendendo a que está noutra função. Mas do ponto de vista jurídico, a lei permite isto", disse Marcelo no domingo, mostrando que continua a ter o faro apurado e está ao lado da perceção dos eleitores. E, mostrando também que não gostou da resposta da secretária de Estado, já avisou Costa que é preciso avaliar bem se vale a pena manter Alexandra Reis no Governo. Conseguirá o primeiro-ministro ainda pensar como “muitos portugueses”?

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: elourenco@expresso.impresa.pt

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