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A macroeconomia até pode estar bem de saúde mas não põe comida na mesa nem a chave na porta da casa

A macroeconomia até pode estar bem de saúde mas não põe comida na mesa nem a chave na porta da casa

Vítor Andrade

Coordenador de Economia

Bom dia

Aos olhos do primeiro-ministro "Portugal é cada vez mais um reconhecido farol de estabilidade e fiabilidade, quer na Europa, quer à escala mundial".

Imbuído de um otimismo a que alguns poderiam chamar ‘irritante’, Luís Montenegro abriu o discurso do primeiro debate quinzenal depois do regresso dos trabalhos parlamentares, nesta quarta-feira, com uma avalanche de números macroeconómicos.

Enfatizou que se prevê um crescimento próximo de 2% e um superávite da ordem dos 0,3% para este ano, assim como, em simultâneo, a “continuação de uma trajetória de redução do rácio da dívida pública” face ao PIB.

Além de considerar que “estas metas são atingíveis”, lembrou ainda que o país está com níveis de desemprego baixos como não se via há décadas e que cada vez será mais apetecível estudar e trabalhar em Portugal.

Nem sequer se esqueceu de mencionar a melhoria recente do rating da República por parte das agências de notação financeira.

Mais novidades na habitação

Aproveitando a embalagem revelou ainda algumas medidas na área da habitação, que o Governo deverá aprovar esta quinta-feira em Conselho de Ministros.

Entre elas, para os inquilinos, já em 2026, deverá haver um aumento para 900 euros e, em 2027, para 1.000 euros, de “dedução à coleta de IRS dos encargos com as rendas de habitação a preços moderados”.

Para os senhorios o Governo aprovará uma redução da taxa de IRS de 25% para 10% nos contratos de arrendamento de habitações a rendas "moderadas" - um conceito a carecer de clarificação.

E promete ainda o fim das mais-valias de IRS na venda de habitações se o valor for reinvestido em imóveis para arrendamento a "valor moderado".

Tudo isto é positivo, naturalmente, e até pode deixar - como diria o primeiro-ministro - Portugal ‘bem na fotografia’.

A questão é que o acesso à habitação continua fortemente limitado, sobretudo para os mais jovens e carenciados e, por outro lado, os portugueses em geral não sentem na sua carteira os efeitos das ‘contas certas’ do Estado.

Até onde vai a luz do farol?

Por outras palavras: a macroeconomia, recheada de números gordos, não está a colocar comida na mesa nem a chave na porta da nova casa e, noutra dimensão, as crianças continuam a nascer nas ambulâncias e os cuidados de saúde em geral escasseiam por todas as regiões do país, em especial no dito interior, agora profusamente enfarruscado. E, como era de prever, já ninguém fala dos incêndios devastadores de há um mês.

Ou seja, o tal ‘farol’ que iluminou o discurso de Montenegro, ontem, na Assembleia da República, parece não estar a levar luz à vida de muitos portugueses, mas antes a apontar o caminho para uma agenda marcadamente política, perante uma oposição amorfa, desfocada e algo desnorteada.

Alguém se lembra, por exemplo, de uma ideia de força que tenha saído da sessão de ontem, na Assembleia, das bancadas do PS, do PCP ou do Bloco?

Talvez tenha restado alguma estridência vinda da bancada do Chega, numa linguagem que cola lindamente no eleitorado que religiosamente o segue. Mas pouco mais do que isso.

Montenegro ganhou claramente este primeiro embate quinzenal da rentrée parlamentar, com o líder do PS, José Luís Carneiro, a não conseguir impor uma única linha mestra digna de um partido da sua dimensão. E, na verdade, continua a faltar-lhe algo muito relevante em política: notoriedade.

OUTRAS NOTÍCIAS

“Parede de drones”. De provocação em provocação, Putin continua a testar a paciência dos países membros da NATO, já quase a roçar o limite. As recentes violações do espaço aéreo da Polónia, Roménia e Dinamarca por drones da Federação Russa, levaram a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen a apelar ao investimento massivo dos governos na edificação de uma “parede de drones” para defender o flanco leste da Europa. Portugal poderá participar "a seu tempo", diz ao Expresso o ministro da Defesa, Nuno Melo. Este artigo do Vítor Matos explica o que se está a passar neste domínio.

Gaza na ONU. Entre críticas a Israel e apelos à criação de uma força de paz; da crítica dos Estados Unidos da América ao reconhecimento do Estado da Palestina, à proposta do Presidente da Colômbia para criar de um “exército poderoso de países que não aceitam o genocídio” para defenderem aquela mesma terra, a situação em Gaza tem marcado presença nos discursos dos chefes de Estado e de Governo na Assembleia-Geral das Nações Unidas. No entanto, até agora, muita conversa mas sem soluções à vista.

Reagrupamento. O Governo entregou a nova versão da polémica lei da imigração, revendo vários artigos, mas deixando cair apenas uma das normas chumbadas pelo Tribunal Constitucional. E flexibiliza outras, sobretudo para a integração de menores. Agora admite-se que o reagrupamento familiar possa acontecer num prazo inferior a dois anos (que se mantém como regra).

Candidato. Em entrevista à SIC, já ao final da noite desta quarta-feira, o candidato presidencial Luís Marques Mendes demarcou-se de Marcelo ("já tivemos dissoluções a mais"), chocou com Gouveia e Melo de frente ("é fator de instabilidade" e "falta-lhe experiência, preparação e sensibilidade") e ignorou Ventura, que diz só se mover por tática e com quem nunca privou: "Só o conheço das reuniões do Conselho de Estado".

FRASES

[A Ucrânia] “está em posição de lutar e recuperar toda a sua forma original” …“e, quem sabe, talvez até ir além”.

(…)“Putin e a Rússia estão com graves problemas económicos”.

Donald Trump, no seu discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas e na sua rede social Truth Social

“Acho que ele entende atualmente que não podemos simplesmente trocar territórios. Não é justo. Não é a realidade” (…) “Que Deus o abençoe”.

Volodymyr Zelensky, referindo-se a Trump, em entrevista à estação norte-americana Fox News

“O facto de estarem a tentar por todos os meios encorajar a Ucrânia a continuar a ação militar... Esta tese de que a Ucrânia pode reconquistar algo é, na nossa opinião, errada”

Dmitry Pesko , porta-voz presidencial russo

“Em Portugal mistura-se tudo. Há qualquer coisa, uma iniciativa legislativa e toda a gente tem que comentar. Ora, eu não sou um candidato a Presidente da República para ser um comentador ambulante, para estar sempre a comentar”

António José Seguro, candidato à Presidência da República


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