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O fim de Jesus e o precipício de Rui Costa

O fim de Jesus e o precipício de Rui Costa

David Dinis

Diretor-adjunto

Bom dia,

acabou o Natal e Jesus foi-se embora.

Não foi uma saída airosa: depois do assédio do Flamengo, depois da amarga derrota no Dragão, o treinador quis meter na linha um capitão crítico, mas foi cercado por uma revolta do plantel. Não foi pecado, foi xeque-mate: a dois dias do segundo clássico seguido, porventura decisivo para o clube, acabou-se o tempo de Jesus: “Cheguei ao Benfica sempre a pensar que era uma solução e não um problema”, disse ele. Mas era mesmo um problema: o homem que foi apresentado como salvador teve uma segunda vida escrita em 11 pecados. Para não falar do maior, o de contrariar as tendências que ele próprio ajudou a definir, explica Tomás da Cunha nesta Última Ceia da Tribuna. Para não falar das contas que deixa por pagar - como recordou a CNN Portugal.

Ontem foi o dia da crucificação, mas a cruz do clube continua. Porque há um mal maior, analisa Pedro Adão e Silva, numa crónica a quente publicada na Tribuna: "Jesus era ainda parte da face visível do passado vieirista e enquanto o Benfica não varrer o legado do ex-presidente está condenado a definhar desportiva, institucional e moralmente."

Ontem, o presidente Rui Costa deu um triste sinal de má liderança, ao convocar uma conferência de imprensa que, afinal, não tinha direito a perguntas, onde não deixou uma explicação nem horizonte aos benfiquistas, preferindo lamentar em dois minutos a saída do treinador. Foram duas declarações e um abraço a Jesus, que deixaram uma leve sensação de desafio a um plantel que há muito não tinha fé no líder. Basta lembrar o que disse um dos jogadores dissidentes, em português do Brasil: “Às vezes você faz uma jogada no treino e ele te ofende. O jogador fica com medo de fazer”.

Ou terá sido, em alternativa, uma "encenação que tem a ver apenas com dinheiro”, como disse Rui Santos. Uma coisa é certa, Jesus não sai sem dinheiro. Uma semana depois de o Benfica ter travado a fuga para o Brasil, é no mínimo irónico, não é?

Agora, o Benfica será liderado pelo treinador da equipa B, a quem chamavam “Capitão” e nunca deixaram de o tratar assim. Eis Veríssimo, o rapaz “certinho” que não gostava de levar cuecas. Ao que se sabe, este é plano de Rui Costa para o resto da temporada, qual Vieira à procura de um Bruno Laje naquele que foi o último triunfo vieirista. Haja fé, benfiquistas, o Benfica B é primeiro, na segunda. Mas além de fé, além de sorte, além de equipa, Rui Costa terá de descobrir um projeto desportivo para o clube. Porque salvadores, já se percebeu, são milagres de outros tempos.

OUTRAS NOTÍCIAS

Um recorde pandémico: Portugal bateu um novo máximo de casos em 24h (aqui pode ver o surto em gráficos e mapas).

Um aviso prévio: “Iremos atingir os 37 mil casos por dia na primeira semana de janeiro” - palavra de Marta Temido. Traduzindo, 600 mil portugueses estarão em confinamento nessa altura. O lado bom? "Esta onda, pelas suas características, não poder durar muito, É insustentável ", acredita Óscar Felgueiras.

Um regresso a outras vagas: Sobrecarga nas urgências: ministra da Saúde admite que já foi necessário suspender atividades não-covid. Com as urgências em Lisboa sobrelotadas, um especialista em saúde pública soa as sirenes: “Já devíamos ter capacidade de choque instalada com ajuda do Exército e Proteção Civil”.

Uma estratégia alternativa: "Se é menos grave do que a Delta em vacinados, talvez faça sentido deixar que as pessoas se imunizem naturalmente”, defende Manuel Carmo Gomes.

Uma estratégia contínua: Casa Aberta já está disponível para pessoas com 60 ou mais anos; E está aberto o agendamento para vacinação de crianças com 7 anos.

Um lapso à correção das regras: afinal, não basta um certificado de vacinação para acesso a eventos culturais, corrigiu esta manhã a DGS.

As perdas anunciadas: restaurantes do Algarve, Lisboa e Porto com quebras perto de 50% na passagem de ano.

As outras perdas à nossa frente: telecomunicações, eletricidade, portagens e rendas. Preços sobem em 2022. Ou, se preferir, nesta versão: no calçado há otimismo à espreita para 2022 - e há subida de preços.

Uma campanha alegre: Rui Rio nega ter proposto acordo parlamentar de dois anos com PS. E Ventura diz que “Rui Rio gostava era de ser líder do Partido Socialista”.

Um follow up doloroso: incêndio no Hospital de S. João: um dos quatro doentes em estado grave já recuperou.

Mais um ataque com arma: pelo menos cinco pessoas mortas a tiro por um atacante nos EUA.

Mais três textos que tem de ler: Covid longa: já existe uma definição oficial e isso é importante para atribuir baixas médicas ou acelerar o diagnóstico; Sexualidade após o parto, dos mitos e “receios” à ajuda: “Ninguém gosta de programar as relações sexuais, mas pode ser a única alternativa”; e ainda este: “Natália Nunes é uma escritora feminista muito esquecida. Os seus livros não são panfletários”.

OS NOSSOS PODCASTS

🎭 #oquelevamosde2021para2022 Neste Expresso da Manhã, Paulo Baldaia conversou com Miguel Cadete, diretor-adjunto do Expresso, sobre os acontecimentos culturais de 2021: a polémica com a Bienal de Veneza, a restauração dos painéis de S. Vicente e os espetáculos, com um olhar atento ao que pode estar a acontecer às empresas que organizam os grandes festivais em Portugal.

🤐 Quem quer calar Gouveia e Melo? “É compreensível que Mendes Calado não tenha ficado calado, porque quem não se sente não é filho de boa gente”, afirmou Ana Gomes, que desconfia dos argumentos usados para a substituição no CEMA, no seu espaço de comentário da SIC Notícias, aqui em podcast.
📽️ “Não podemos pensar na vida se não pensarmos na morte” Nesta viagem pelo mundo dos filmes, de Famalicão para Cannes, o Cinetendinha pára num terraço de um hotel de luxo para um tête-a-tête com uma das maiores estrelas da Europa, Sophie Marceau, a defender com unhas e dentes um dos filmes do momento, ‘Correu Tudo Bem’. Uma história verídica que nos tenta convencer dos méritos da legalização do suicídio assistido.

O QUE ELES DISSERAM

"Temos de nos focar na nossa casa, porque isto muda muito de um momento para o outro". Rúben Amorim, sobre a saída de Jorge Jesus do Benfica.

“Não quero o eleitorado do Chega”. Rui Rio, em conversa com a CNN Portugal.

"Os profissionais de saúde não cresceram exponencialmente à medida que está a crescer exponencialmente a necessidade dos serviços que prestam". Marta Temido, sobre as dificuldades de resposta do SNS à nova variante da Covid-19.

O QUE ANDO A LER

Chegaram-me antes do Natal, em jeito de presente antecipado: quatro livros numa caixa, com remetente assinado Skakespere & Co, a livraria parisiense que não é, mas devia, ser o centro do mundo.

São mesmo quatro surpresas, porque esse é o segredo do serviço aos assinantes: quatro livros escolhidos a dedo, mas sem qualquer indicação prévia do leitor. Desta vez abri-os lentamente, como quem saboreia um silêncio prolongado. Saiu-me um romance só agora publicado de Simone de Beauvoir, o mais íntimo de todos , uma estreia com sabor a English Magic, uma viagem serena pela Grécia mitológica e moderna.

Mas o que me levou em viagem foi este Looking for Trouble, de Virginia Cowles, o livro de crónicas de uma jornalista de lifestyle norte-americana que se transformou numa repórter no eclodir da Segunda Guerra Mundial, tão extraordinária pela capacidade de nos fazer submergir nos cenários mais dantescos dos ataques, como por nos levar à mesa com os políticos que foram heróis e vilões dos anos moralmente mais baixos da história da humanidade - de Churchill e Chamberlain, até Hitler e Mussolini.

O insuspeito historiador Antony Beevor anuncia-a assim: "A intrépida Cowles viveu tudo. Uma das maiores correspondentes de guerra de todos os tempos, ela descreve tudo de forma magnífica". Eu cá, vou no início da viagem, uma que me faz lembrar que, não, não estamos mesmo a viver o pior dos tempos. É um bom mote para o novo ano.

Se não nos cruzarmos até lá, aproveito para lhe desejar isso mesmo: um feliz ano de 2022. Que seja desta.
Entretanto, vamo-nos vendo por aqui.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: ddinis@expresso.impresa.pt

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