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Isabel II e Diana: a comoção da perda de duas mulheres que marcaram, cada uma à sua maneira

Isabel II e Diana: a comoção da perda de duas mulheres que marcaram, cada uma à sua maneira
Anwar Hussein/Getty Images

Ao longo dos últimos dias, milhares de pessoas têm homenageado Isabel II, prevendo-se uma multidão no dia 19, o culminar das cerimónias fúnebres. Há 25 anos, a morte da princesa Diana representou um forte abalo na monarquia britânica: inicialmente, a reação de Isabel II não foi compreendida pela população, mas a monarca conseguiu reverter a situação

A popularidade de Isabel II, não apenas em território britânico mas além-fronteiras, é inquestionável. Milhares de pessoas têm prestado homenagem à monarca, que morreu a 8 de setembro, em especial junto ao Palácio de Buckingham, em Londres. No dia do funeral, previsto para a próxima segunda-feira, espera-se uma multidão.

Até agora, as cerimónias têm decorrido como planeado, com um “cumprimento quase cronométrico” do que estava pensado, dentro do “rigor protocolar britânico”, descreve José de Bouza Serrano, antigo chefe do protocolo do Estado e diplomata, em declarações ao Expresso.

Quando morrem membros da realeza, vivem-se “momentos de grande dor e pesar e de grandes manifestações públicas de carinho”, realça Alberto Miranda, jornalista especialista em famílias reais. Um dos maiores exemplos é o da morte da princesa Diana, há 25 anos, cujo funeral teve um enorme impacto mediático e foi acompanhado por milhões de pessoas em todo o mundo.

Um paralelismo entre as cerimónias fúnebres que agora se realizam e as de 1997 pode ser feito “no sentido da comoção e do choque” que muitas pessoas sentem, mas com um “elemento diferenciador” ao nível do estatuto: Diana já não pertencia à família real quando morreu – o divórcio do então príncipe de Gales data do ano anterior –, enquanto Isabel II era a “chefe da nação”, destaca o autor do livro “As Dez Monarquias da Europa”.

Aos 36 anos, Diana morreu após um acidente de carro em Paris, e a reação popular foi “avassaladora”. “Foi de tal maneira uma catástrofe extraordinária da população – porque adorava a princesa Diana –, que chocou até a própria família real”, recorda Bouza Serrano. No dia da morte, a 31 de agosto de 1997, Isabel II estava de férias em Balmoral, na Escócia, onde estavam também o filho Carlos e os netos William e Harry.

“Ao mesmo tempo que o povo se mostra destroçado e aparece nas ruas a pôr flores e mensagens, a rainha está no castelo e não diz nada”, relembra Alberto Miranda. As pessoas não compreendiam a reação da monarca, queriam que “voltasse para Londres o mais depressa possível e pudesse compartilhar com elas o desgosto, que era geral”, numa situação que “pôs a própria Coroa em perigo naquela altura”, acrescenta Bouza Serrano, autor da obra “A Viúva de Windsor”.

Já depois de o então primeiro-ministro, Tony Blair, lamentar a morte daquela que intitulou como “princesa do povo”, Isabel II decide regressar a Londres. “A rainha percebe que tem de ceder para o bem da continuidade da sua popularidade e para o bem da instituição”, explica Alberto Miranda. Apesar de já não ser membro da família real, Diana acabou por ter um funeral de Estado “porque o povo impôs-se”, salienta Bouza Serrano.

Os dois especialistas apontam o discurso que Isabel II acaba por fazer à nação como o elemento que permitiu a recuperação dos danos que começavam a fazer-se sentir na opinião pública. Isabel II sublinhou que falava enquanto rainha e avó, ao mesmo tempo que, através das janelas de Buckingham, eram visíveis as homenagens da população. Bouza Serrano considera que a palavra avó “fez a grande diferença”: estar em Balmoral a cuidar dos netos, que acabavam de perder a mãe, representava “o argumento, o álibi”. Alberto Miranda refere ainda o elogio da monarca a Diana, que classificou como um “ser adorável”, mostrando que a sua perda “também a afetou”, além de inclinar a cabeça à passagem do caixão. “A incompreensão inicial dá origem depois a uma certa reconciliação com o povo.”

O “don de gentes” de Diana

Naquela altura, o silêncio inicial da rainha “foi entendido como o sinónimo de um forte mal-estar entre a nora e a sogra”, indica Alberto Miranda. A relação entre as duas já seria tensa, mas piorou com tudo o que envolveu o divórcio, em particular a entrevista que Diana deu à BBC sem o conhecimento da monarca, em que revelou detalhes da vida privada com Carlos.

Quando casou com o príncipe de Gales, em 1981, Diana representou, segundo Alberto Miranda, uma “lufada de ar fresco” devido à sua juventude, ar tímido e sorridente, num contexto em que “a família real inglesa era conhecida por ser reservada nas atitudes e nos comportamentos”. O “mito de Diana” acabou por ser “amplificado com a crise conjugal” e a morte “trágica e inesperada” contribuiu para que se fale de Diana como uma “pessoa irrepetível na família real”. “Isabel II também o é.”

Para Bouza Serrano, o que distinguia Diana era aquilo a que os espanhóis chamam “don de gentes”, ou seja, a proximidade. “Os outros membros da família real não se aproximavam tanto, tratavam os cidadãos como súbditos e Diana tratava-os como pessoas. Isso foi a chave do seu sucesso. Abraçava os doentes, beijava as crianças”, exemplifica.

Tanto Diana como Isabel II são acarinhadas e figuras únicas, mas com perfis diferentes, concordam os especialistas. A popularidade de Diana “chegou a ofuscar” e a ser mesmo “superior” à da rainha, destaca Bouza Serrano. No entanto, Isabel II conseguiu recuperar e, atualmente, “vê-se a popularidade que tem, mesmo já com esta idade e depois de morrer”. “Diana foi meteórica, não sabemos se tivesse sobrevivido como é que seria a sua popularidade hoje em dia. Teve o seu momento de glória e depois desapareceu, como um cometa.”

Já Isabel II, até ao dia em que morreu, era “uma lenda viva” e uma “mulher de consensos no Reino Unido”, considera Alberto Miranda. Os últimos dias têm comprovado que “é nítido o apego, o desgosto e o amor que a população tinha relativamente à sua rainha”, completa Bouza Serrano, que enaltece o “sentido de dever” da monarca. À sua maneira, Isabel II e Diana foram “duas mulheres que marcaram aquela época, estando cada uma de um lado da barricada”.

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