“Um estadista único”, que mudou “a história comum” com “coragem e integridade”: líderes mundiais reagem à morte do último líder da URSS
Ralf Juergens/Getty Images
Por todo o mundo, Mikhail Gorbachev foi lembrado pelo seu papel como um dos responsáveis para o fim pacífico da Guerra Fria e da transição democrática no leste da Europa
“Um estadista único que mudou o curso da história”, “um líder confiável e respeitado” com uma “visão extraordinária” que permitiu construir “um mundo mais seguro e mais liberdade para milhões de pessoas”. Assim é lembrado Mikhail Gorbachev, o último presidente da União Soviética e um dos responsáveis pelo fim da Guerra Fria.
O líder histórico morreu esta terça-feira no hospital, três décadas depois da dissolução do bloco a que presidiu. Tinha 91 anos e estava há algum tempo com a saúde debilitada, razão pela qual estava há muito afastado da vida pública. Segundo a agência de notícias russa TASS, sofria de “doença longa e grave” que terá causado a morte.
Rússia lamenta perda de político brilhante com uma personalidade controversa
Na Rússia, o Kremlin expressou a sua "profunda tristeza" durante a conferência de imprensa diária dirigida pelo porta-voz Dmitri Peskov. "Putin expressa a sua profunda tristeza pela morte de Gorbachev. Pela manhã irá enviar um telegrama de condolências aos seus familiares e amigos", realçou.
Durante esta terça-feira foram vários os deputados russos a expressar as suas condolências pela morte do líder soviético.
"Gorbachev foi sem dúvida o político mais brilhante do seu tempo. Mas para todos os nascidos na União Soviética, este continua a ser uma figura histórica, complexa e controversa", destacou Leonid Slutski, líder do Partido Liberal Democrata, numa publicação através da rede social Telegram. Leonid Slutski lamentou a morte de Gorbachev, mas também ressalvou que lamenta que os processos de desintegração do império soviético tenham começado justamente com a "Perestroika" (reestruturação), promovida pelo último líder da URSS.
Para o deputado comunista Nikolai Kolomeitsev, Gorbachev era um "traidor". “Foi um traidor e não um secretário-geral. Destruiu o país, foi uma alta traição”, atirou este deputado.
Já Oleg Nilov, deputado da Rússia Justa, referiu, por sua vez, que apenas se pode falar bem do ex-líder soviético ou “não se deve falar nada”.
Para o chefe de protocolo de Mikhail Gorbachev, Vladimir Shevchenko, a época de liderança do ex-líder da URSS foi um tempo “de esperança”. "Foi o momento da nossa entrada num mundo sem mísseis, onde foram assinados acordos únicos. Mas houve apenas um erro de cálculo: não conhecíamos bem o nosso país", salientou. Segundo Shevchenko, que trabalhou com Gorbachev entre 1985 e 1991, a queda da URSS foi uma tragédia para o dirigente soviético.
Mikhail Gorbatchov com o ex-Presidente dos EUA Ronald Reagan, na década de 1980, quando estavam ambos no poder
Stringer .
Além fronteiras, Gorbachev é lembrado pelo seu papel na transição pacífica pós-Guerra Fria
Por todo o globo, foram vários os líderes mundiais a reagir à notícia da morte de Mikhail Gorbachev.
Para o secretário-geral das Nações Unidas, o “mundo perdeu um líder global imponente, multilateralista comprometido e defensor incansável da paz”.
António Guterres, que apresentou em nome da ONU as condolências “à família, ao povo e ao governo da Federação Russa”, recordou as palavras de Gorbachev quando este recebeu o Prémio Nobel da Paz em 1990 e observou que a “paz não é unidade na semelhança, mas unidade na diversidade”. “[Gorbachev] Colocou em prática essa visão vital ao seguir o caminho da negociação, reforma, transparência e desarmamento”, salientou.
Já o Presidente dos EUA destacou um líder raro, com “visão extraordinária” e a imaginação de vislumbrar a possibilidade de um futuro diferente e coragem de arriscar toda a sua carreira para o conseguir. "O resultado foi um mundo mais seguro e mais liberdade para milhões de pessoas", lembrou.
Na Europa, Boris Johnson sublinhou a “coragem e integridade” de Mikhail Gorbachev, que diz sempre ter “admirado” por este ter levado a Guerra Fria “a uma conclusão pacífica”. “Numa época de agressão de Putin na Ucrânia, o seu incansável compromisso com a abertura da sociedade soviética continua a ser um exemplo para todos nós”, salientou Johnson numa mensagem publicada no Twitter. “Estou triste por saber da morte de Gorbachev."
Por sua vez, Emmanuel Macron elogiou o “compromisso com a paz na Europa” de Gorbachev. “As minhas condolências pela morte de Mikhail Gorbachev, um homem de paz cujas escolhas abriram um caminho para a liberdade para os russos”, frisou o chefe de Estado francês, que sublinhou ainda que Gorbachev mudou “a história comum”.
Da parte da União Europeia, Ursula von der Leyen recordou “um líder confiável e respeitado”, que desempenhou “um papel crucial para acabar com a Guerra Fria e derrubar a Cortina de Ferro”. Numa mensagem publicada no Twitter, a presidente da Comissão Europeia sublinhou que o ex-líder da URSS “abriu o caminho para uma Europa livre”. “Este é um legado que não vamos esquecer. DEP [Descansa em paz] Mikhail Gorbachev”, acrescentou.
Em Portugal, Augusto Santos Silva recordou Mikhail Gorbachev como uma figura essencial para o fim da Guerra Fria e para a transição democrática no leste da Europa. “Na hora da sua morte, homenageio Mikhail Gorbachev. Ele foi essencial para o fim da Guerra Fria e para a transição democrática no leste da Europa”, afirmou o presidente da Assembleia da República, também através da rede social Twitter.
Também o eurodeputado do PSD Paulo Rangel assinalou Mikhail Gorbachev como um “protagonista político controverso, mas que foi capaz de ‘pôr fim’ a um dos regimes mais funestos da história”.
Já o ex-presidente do PSD, Rui Rio, frisou que Gorbachev ficará na história, sublinhando que “o mundo ocidental tem de estar eternamente grato” ao ex-líder da União Soviética pelo “trabalho em prol do diálogo e da paz”.
Em declarações à Antena 1, também Durão Barroso se pronunciou. “Foi sem dúvida umas das maiores personalidades do século XX e a sua ação teve um impacto muito para além da então União Soviética, da Rússia e da Europa. Teve um impacto decisivo em todo o mundo.”
O atual presidente do Fórum Eurafrica recordou Gorbachev como “principalmente uma pessoa decente, com uma boa intenção”. “Apesar de ter feito a sua carreira política no sistema totalitário comunista, era alguém que tinha um certo humanismo, queria genuinamente a paz e um sistema pluralista”, frisou.
Durão Barroso contou ainda, em declarações à Antena 1, que se encontrou várias vezes com o último líder da União Soviética, a primeira vez enquanto presidente da Comissão Europeia em Moscovo. “Depois, encontrámo-nos várias vezes em circuitos de antigos Prémios Nobel da Paz. Obviamente não recebi nunca um em nome individual, mas recebi em nome da União Europeia e há uma rede de vencedores destes prémios”, explicou.
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