Grupo Wagner acusado de ataques a minas na fronteira entre o Sudão e a República Centro-Africana
Anadolu Agency/Getty Images
Nos últimos meses, os vários ataques a minas artesanais causaram dezenas de mortes. Testemunhas descrevem os massacres e a destruição causada pela organização russa
Membros do Grupo Wagner estiveram alegadamente envolvidos em vários ataques a minas artesanais nas zonas fronteiriças do Sudão e da República Centro-Africana. Os três maiores ocorreram a 13 de março, 15 de abril e 24 de maio, causando dezenas de mortes.
Especialistas e testemunhas ouvidos pelo “The Guardian” indicam que o objetivo era roubar o comércio de ouro da região. A maioria das vítimas eram trabalhadores migrantes do Sudão e do Chade que trabalhavam nas minas de ouro, além de civis. Há ainda relatos de novos ataques a minas em pelo menos seis outros locais da República Centro-Africana.
As várias testemunhas entrevistadas pelo diário britânico no Sudão descreveram os “massacres” dos combatentes, identificados como pertencentes ao grupo Wagner, nos acampamentos de mineiros entre a cidade de Am Daga e a fronteira: dispararam indiscriminadamente com armas automáticas, destruíram equipamento e edifícios e roubaram motas.
Ao jornal, Mohammed Zain Mohamed Wadi, de 42 anos, contou que foi atacado em Jabal a-Nar, a oeste da fronteira com o Sudão, por russos – alguns em veículos blindados – e por soldados da República Centro-Africana em carrinhas e motas. Disse ainda que ajudou a sepultar 21 das vítimas, todas sudanesas: “Nunca mais voltarei. Na verdade, não creio que tenha ficado ninguém. As minas de ouro ali foram ocupadas pelos russos.”
Viatura do Grupo Wagner na base de Bangassou, na República Centro-Africana, em 2021
A diretora adjunta para África do Grupo Internacional de Crise, Pauline Bax, aponta que “há relatos regulares de atacantes que chegam de helicóptero, matando mineiros artesanais e rebeldes, levando tudo o que podem”. Partem depois, mas “por vezes voltam um mês depois e fazem a mesma coisa”.
Manifestantes anti-França celebram anúncio da retirada das tropas francesas com cartazes a dizer "obrigado Wagner"
O Grupo Wagner é uma organização paramilitar e uma empresa privada que presta serviços de segurança, cuja atuação tem vindo a aumentar em África desde 2015, a par com o interesse na região do Presidente russo, Vladimir Putin – que nega ligações ao grupo. Um dos principais objetivos do grupo no continente africano é o acesso aos recursos naturais, desde logo o petróleo ou o gás, mas também os metais raros.
Em países como a República Centro-Africana ou a Líbia, o Grupo Wagner presta serviços de segurança e o pagamento é feito “com uma percentagem do que é extraído em termos de recursos”, conforme já explicou ao Expresso a investigadora Joana de Deus Pereira. Um relatório de maio da Human Rights Watch identificou forças russas (sem insígnias) na República Centro-Africana, onde espancaram, torturaram e mataram civis desde 2019.
A presença dos combatentes Wagner “está a duplicar no Sahel e não se vai embora tão cedo”, destaca Sorcha MacLeod, líder do grupo de trabalho das Nações Unidas sobre o uso de mercenários. A especialista afirma que este tipo de grupos prolongam os conflitos locais, conduzem a níveis mais elevados de violência e cometem abusos dos direitos humanos.