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Mercenários russos do Grupo Wagner ligados a massacres no Mali

Manifestantes anti-França celebram anúncio da retirada das tropas francesas com cartazes a dizer "obrigado Wagner"
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FLORENT VERGNES

Em apenas quatro meses, até 456 pessoas terão morrido em nove incidentes nos quais estiveram envolvidos mercenários destacados pela organização paramilitar russa Grupo Wagner

Mercenários ao serviço do Grupo Wagner - uma organização paramilitar russa com ligações próximas a Vladimir Putin - foram associados a massacres em que morreram centenas de civis no Mali.

Documentos internos das Forças Armadas do Mali consultados pelo "The Guardian" revelam a presença de membros do Grupo Wagner, referidos como "instrutores russos", em "missões mistas" com militares e polícias malianos durante as quais ocorreram mortes civis.

Segundo a ONG Armed Conflict Location and Event Data Project, 456 pessoas foram mortas em nove incidentes relacionados com estas "missões mistas" só entre janeiro e meados de abril de 2022.

O massacre mais grave ocorreu em março, em Moura, uma vila controlada por extremistas islâmicos. Entre 350 e 380 pessoas foram mortas ao longo de quatro dias, a maioria da minoria étnica Peuhl. Segundo as testemunhas, a operação foi liderada por um homem branco que falava uma língua estranha que alguns identificaram como russo, mas a maior parte das execuções foi feita por militares do Mali.

A versão oficial do exército é a de que foram mortos 203 militantes de um grupo extremista com ligações à al-Qaida e negou os relatos de execuções. A Rússia vetou uma investigação independente das Nações Unidas ao massacre, enquanto o Mali bloqueou as tentativas da ONU de enviar uma equipa a Moura.

Nas últimas semanas surgiram novas alegações sobre tiroteios em vilas perto da cidade de Hombori, na região central de Mopti. Trabalhadores humanitários, especialistas e ativistas de direitos humanos descreveram um incidente a 19 de abril, no qual uma patrulha mista caiu numa emboscada que terá resultado na morte de um dos mercenários. Em resposta, os soldados malianos abriram fogo contra a multidão num mercado. Um segundo confronto a 23 de abril terá resultado na morte de um mercenário russo, um militar maliano e 12 outras pessoas.

Oficialmente, as autoridades do Mali negam que um mercenário russo tenha morrido nos incidentes de 19 de abril, afirmando que a baixa foi um soldado maliano. Rejeitam também que tenham morrido civis, afirmando antes que foram "neutralizados" 18 terroristas durante "vigorosas" operações de segurança.

Especialistas estão preocupados com a deterioração dos Direitos Humanos no Mali, coincidente com a chegada dos mercenários

Os incidentes têm sido noticiados, mas as autoridades ocidentais têm evitado nomear autores. Contudo, testemunhas, líderes de comunidades locais, diplomatas e analistas têm apontado o dedo a combatentes destacados pelo Grupo Wagner.

A organização está presente no Mali, um país estrategicamente localizado no oeste de África, desde 2021, quando assinou um acordo com o novo governo militar. Os líderes do país descrevem a presença dos mercenários como "instrutores" e rejeitam tratar-se de tropas destacadas para combater.

Estima-se que estejam entre 600 e mil mercenários ligados a esta organização paramilitar russa no Mali. Foram contratados pelos novos governantes por cerca de 10 milhões de dólares mensais, pagos em dinheiro e através dos direitos para a exploração mineira no país.

As situações relatadas levantam medos sobre a crescente intervenção da Rússia no continente, que visam aumentar a estabilidade e segurança. O Grupo Wagner tem estado ativo em vários países por toda a África e tem sido repetidamente acusado de violações dos Direitos Humanos.

Um relatório Humans Rights Watch divulgado na terça-feira identificou forças russas presentes na República Centro-Africana como perpetradores de assassinatos e tortura de civis desde 2019. Um grupo de peritos da ONU chegou às mesmas conclusões no ano passado. Desde o início da invasão, o grupo foi também associado a atrocidades cometidas na Ucrânia.

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