Projetos Expresso

O trabalho do cientista é sempre “uma tarefa inacabada”

Nuno Sousa (Fundação Bial) é o responsável pelos apoios à investigação científica da instituição, que já financiou, entre outros, projetos de Joana Coutinho (Universidade do Minho) e Chris Roe (Universidade de Northampton)
Nuno Sousa (Fundação Bial) é o responsável pelos apoios à investigação científica da instituição, que já financiou, entre outros, projetos de Joana Coutinho (Universidade do Minho) e Chris Roe (Universidade de Northampton)
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As neurociências atraem cada vez mais o interesse de investigadores em todo o mundo, e Portugal não é exceção. O estudo do cérebro, em particular na psicofisiologia e parapsicologia, volta a merecer o apoio financeiro de bolsas de investigação concedidas pela Fundação Bial. Valor máximo ascende a €60 mil por projeto

Francisco de Almeida Fernandes

Quanto mais sabemos, mais queremos saber. “O cientista tem esse desafio permanente porque a ciência é uma tarefa inacabada”, diz a investigadora Joana Coutinho, que tem dedicado grande parte da sua atividade académica ao estudo da neurociência psicológica na Universidade do Minho. A especialista refere que desde o aparecimento da ressonância magnética, na década de 90, o estudo do cérebro tem atraído cada vez mais interessados. “É uma área competitiva e com futuro”, assinala.

Joana Coutinho liderou recentemente um projeto científico para melhor compreender as bases biológicas do processo de empatia entre casais através de uma experiência inovadora. Foram recrutados 32 pares românticos com uma relação de, no mínimo, um ano, desafiados a “expressar um conjunto de sentimentos de natureza positiva e negativa” sobre o respetivo companheiro, procurando estimular o sistema nervoso periférico e o sistema nervoso central. “Ao longo da tarefa foram monitorizados com equipamentos que nos permitiram avaliar, numa primeira fase, as respostas eletrodérmicas, cardíacas e hormonais”, explica. A segunda fase tinha como propósito identificar as redes cerebrais que são ativadas, e a forma como comunicam entre si, pedindo aos participantes que procurassem “focar no que o seu parceiro estava a sentir”.

"O estudo do cérebro é muito apelativo. As neurociências são um atrativo para um grande número de estudantes", afirma a investigadora Joana Coutinho

Sobre a aplicação prática dos resultados obtidos, a investigadora esclarece que estes podem ser úteis para a terapia de casal, em particular quando existe conflito. É nestas situações que existe maior “sincronia fisiológica”, que dificulta o entendimento entre os dois. “É um exemplo de resultado que pode ajudar o terapeuta a modelar esta ativação quando o casal está em conflito”, aponta. A primeira fase da investigação está concluída, mas Joana Coutinho confirma a intenção de alargar este estudo a outro tipo de relações, como a díade entre médico-paciente ou entre mãe/pai-bebé.

Comunicação após a morte

Compreender o fenómeno de comunicação pós-morte (em inglês, after-death communication ou ADC) em pessoas que atravessam um processo de luto tem sido um dos objetivos do investigador britânico, Chris Roe. O diretor do Centro para Parapsicologia e Ciências Sociais da Universidade de Northampton, em Inglaterra, refere que relatos de “sentir a presença da pessoa falecida” – através do olfato, da visão, audição ou até do toque – são mais frequentes do que se poderia pensar. “É bastante comum entre aqueles que vivem o luto, com cerca de 25% a 50% das pessoas a reportar um ou mais ADC”, conta.

Até aqui, a opinião científica defendia que este tipo de experiência era reflexo de “fraqueza psicológica ou dificuldade em aceitar a perda”. Chris Roe procurou estudar o impacto deste tipo de fenómenos nas pessoas que os relatam, de forma a compreender se seriam benéficos ou prejudiciais ao bem-estar individual. As conclusões, diz, “são claras”: as comunicações pós-morte não estão associadas a patologias e “podem ser um meio saudável de lidar com o luto”. Em suma, acredita que este processo pode ser encarado como uma despedida final ou como a resolução de questões não resolvidas em vida.

€60 mil

é o montante máximo por projeto atribuído pela Fundação Bial a estudos científicos nas áreas da psicofisiologia e parapsicologia

Explorar os mistérios do cérebro

Ainda que as neurociências despertem o interesse de investigadores em todo o mundo, Chris Roe considera “frustrante” as dificuldades de financiamento no estudo da parapsicologia. “Estas experiências parecem contradizer a nossa compreensão habitual de como o mundo físico funciona”, afirma, pelo que não é uma área prioritária para a maioria das bolsas de investigação. É neste campo que os apoios concedidos pela Fundação Bial a explorações científicas como a de Joana Coutinho ou Chris Roe ganham relevância, permitindo apostar na produção de conhecimento em psicofisiologia e parapsicologia. As bolsas que financiam projetos científicos nestas áreas estão de regresso com um novo montante máximo, aumentando de €50 mil para €60 mil o apoio oferecido pela instituição. Nuno Sousa, membro da Comissão Executiva da fundação, explica que a subida do valor se deve “ao aumento no custo para os esforços da investigação” e é uma forma de garantir continuidade na qualidade das candidaturas recebidas. “Queremos gerar a oportunidade de continuarmos a apoiar projetos inovadores e disruptivos”, afiança.

Desde a criação desta iniciativa, a que o Expresso se volta a associar, foi concedido financiamento a um total de 775 projetos de mais de 1600 investigadores com origem em 29 países. As candidaturas estão abertas até 31 de agosto e podem ser concretizadas no site oficial.

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