Vamos esclarecer: a igualdade de género não procura a superioridade feminina.
O Feminismo é um movimento impulsionado por mulheres, que procura a igualdade de género. Para atingir essa igualdade de género, temos de perceber que dentro da sociedade — que somos todas/as/es nós — o género binário com menos direitos e a sofrer mais preconceito é o género feminino, daí o nome “Feminismo”. No entanto, a procura da equidade feminista vai muito para além disso, como veremos mais à frente. Convém destacar, desde já, que a igualdade de género não tira direitos aos homens, mas antes, nivela o nível de direitos para todos os géneros e orientações sexuais quanto ao acesso a oportunidades e qualidade de vida.
Mesmo assim, continua a haver muita confusão quanto ao que é Feminismo: muitas pessoas pensam que é a procura da superioridade de direitos das mulheres em relação aos homens. Por causa desta valente confusão, o movimento feminista criou o neologismo “Femismo”: uma ideologia que procura a superioridade de direitos das mulheres. Ainda não assisti a manifestações ou algo do género neste sentido, mas enfim, o intuito do neologismo é acalmar as mentes das pessoas confusas.
Há uma frase que eu gosto muito que diz: “os homens têm muita sorte de as mulheres não quererem vingança, mas antes igualdade de direitos.” Se quiserem ter acesso a uma distopia literária em que as mulheres ficam com a supremacia do poder por vingança, podem ler o livro “The Power”, de Naomi Alderman. O mundo acaba num caos na mesma, porque a igualdade não existe, quer com supremacia masculina ou feminina.
Não nos podemos esquecer que o Feminismo não é só bom para mulheres, mas para toda a gente, incluindo os homens, já que o machismo é capaz de matar toda a gente. A pressão social feita aos homens, da virilidade (uma invenção social), do “ser macho”, da recusa de procurar ajuda, resulta em problemas de saúde mental por tratar e, consequentemente, numa alta taxa de suicídio.
O Feminismo luta pela igualdade de tratamento dos homens também, quer no sentido da saúde mental, quer em questões muito práticas. Por exemplo, a necessidade de fraldários em todas as casas de banho e não só na rotulada como das mulheres… Um pai tem o direito de mudar a fralda ao/à seu/sua bebé sem constrangimentos. (Um argumento que também pode ser usado na questão das casas de banho mistas, mas adiante, que esse hoje não é o tema).
Ora, neste panorama do mundo Ocidental, não nos podemos esquecer de outras minorias de poder, como a comunidade LGBTQIA+ e comunidades racializadas. A esta questão, claro, temos de acrescentar a questão do privilégio económico. De forma a abraçar todas estas questões, existe o Feminismo Interseccional, que tem em conta todos os níveis de privilégios sociais e económicos.
Ou seja, como exemplo, no nosso dia-a-dia, é preciso termos noção de que, por defeito, um homem negro com poucas possibilidades económicas tem menos privilégio que um homem branco com as mesmas capacidades económicas, devido à existência do racismo. Ou ainda, uma mulher branca de classe média-alta tem mais privilégio do que um homem negro de classe baixa. Um último exemplo: duas mulheres com a mesma classe social e económica, mas sendo uma mulher trans e a outra cis, a primeira vai ter menos privilégio do que a segunda, visto que tem de lutar contra mais preconceito.
A verdade é que só com igualdade de género, tendo em conta os privilégios existentes, é que conseguimos chegar à justiça social. Tendo em conta que metade da população mundial é composta por mulheres, parece-me que lutar pela igualdade de género é uma necessidade intrínseca a uma vida justa. Atente-se que as feministas não estão a pedir a homens biológicos que engravidem, não se trata disso, mas antes de ter acesso igual a oportunidades de trabalho e tratamento social, tendo em conta as diferenças biológicas. Assim, devem-se garantir os serviços que promovam este objetivo.
Preconceito com base no género e na gravidez
Além disso, no contexto do lançamento do “Atlas da Emigração Portuguesa”, como noticiado pelo Expresso, Rui Pena Pires, coordenador científico do Observatório da Emigração, comentou como “Feitas as contas, extrapolando esse número para o universo de países para onde os portugueses emigram e comparando com a população residente em Portugal com essas idades, concluímos que 30% dos jovens que nasceram no país estão atualmente a viver fora. É um número muito alto, com um efeito muito complicado na fecundidade”.
Ultrapassando a conotação subtil de tratar jovens como parideiras, o que acredito que não é a intenção, só mostra como Portugal não tem condições sociais e económicas para criar filhos, para quem os quer. É completamente irrisório como o Estado Português quer mais Natalidade, mas não cria condições para essa mesma realidade. Ao invés, fortalece a dificuldade em ter igualdade de género e filhos, já que muitas mulheres sentem fortemente a desigualdade de género a partir do momento em que são mães, tendo sido tal provado pela vencedora do Prémio Nobel da Economia Claudia Goldin. Sobre esta questão, ainda ontem foi notícia que a licença de maternidade impede a subida de escalão das professoras.
Um último apontamento: Populismo e ideologia de género
Penso que, por esta altura, já passou pelos olhos de toda a gente a notícia do mestre da mentira e populismo da política de Portugal que diz que pretende eliminar o orçamento de estado para a Igualdade de Género. Para quem acha que “sim, senhor, há causas mais importantes”, saibam que este orçamento se destina a causas nobres e essenciais para alcançarmos a dita justiça social, destinando-se a título de exemplo: pagar subsídios de maternidade e paternidade; passes sociais de transportes públicos; financiar creches de forma a serem gratuitas; e potenciar uma maior capacidade e presença de casas de abrigo para vítimas de violência doméstica. Ainda quero ver alguém a argumentar validamente que não é uma necessidade urgente garantir estes serviços sociais.
Links úteis:
Na página da CIG — https://www.cig.gov.pt/area-igualdade-entre-mulheres-e-homens/orcamento-de-estado-sensivel-ao-genero/ — pode ler-se que um Orçamento do Estado sensível ao género “Permite identificar as implicações que diferentes opções em matéria de despesa e de receita públicas têm para as mulheres e homens e com base nessa informação, introduzir mudanças, se necessário, de forma a garantir/promover a igualdade entre mulheres e homens.”
Podem ler mais sobre a Aldrabice do deputado e partido em questão na recente crónica do Professor Miguel Prata Roque.