Global Media adere ao regime de apoio à retoma progressiva e “apanha todos os trabalhadores de surpresa”
Marco Galinha, do grupo Bel, e acionista do "Jornal Económico" lidera a Global Media onde tem 30% do capital e deverá aumentar a participação para 50%
Marcos Borga
Impacto do confinamento é apresentado como justificação da medida, que entra em vigor em maio e que se prolonga até 30 de setembro. “Não havia alternativa”, ouviram os trabalhadores - que em outubro último enfrentaram um despedimento coletivo
A Global Media, que detém títulos de comunicação social como o JN, a TSF, o DN e O Jogo, além de algumas revistas, pediu a adesão ao regime de apoio à retoma progressiva entre maio e setembro. “É uma decisão transversal à empresa e que apanha todos os trabalhadores de surpresa”, comenta ao Expresso Ivete Carneiro, delegada sindical do JN.
A verdade é que esta medida avança poucos meses depois de a empresa ter feito um despedimento coletivo de 81 trabalhadores, 17 dos quais jornalistas. E nas reuniões realizadas durante a manhã desta quarta-feira com os trabalhadores até foi explicado que ainda estavam a ser ultimadas questões relativas ao despedimento coletivo de 30 de outubro, relataram ao Expresso jornalistas de diferentes títulos do grupo.
Em causa estão reduções de 30% no horário de trabalho de todos os funcionários e, uma vez que o apoio à retoma garante apoios da Segurança Social para pagar a totalidade dos salários até 1.950 euros brutos, haverá perdas de 6% nos vencimentos acima desse valor.
A decisão, comunicada em reuniões simultâneas dos responsáveis dos diferentes títulos com as suas equipas ao fim da manhã, foi justificada pela quebra de receitas decorrente da pandemia, em especial na segunda fase de confinamento. As explicações foram tendo ligeiras diferenças em cada caso, variando entre o “não havia alternativa”, “era inevitável” ou “é uma emergência” num quadro de degradação de vendas, receitas e margens.
Indicadores financeiros são ainda de 2019
No entanto não foram apresentados números relativos a 2020 nem ao arranque de 2021. Os trabalhadores contactados pelo Expresso garantem que “foi dito muito pouco”, além da referência à fase de confinamento que comprometeu a recuperação que era esperada para este ano depois do despedimento coletivo, da entrada em funções de novas direções nos diferentes títulos, da tomada de posse da nova administração - liderada por Marco Galinha, do grupo Bel, depois de assumir uma participação de 30% no capital da empresa - e de o DN regressar à edição diária em papel. Aliás, nem foi indicada a data em que a medida entrava em vigor nem a forma como a redução de 30% nos horários seria feita, foram dizendo.
Em 2019, os indicadores financeiros do grupo apontavam para ativos totais de 76 milhões de euros, com o balanço a apresentar um passivo de 61 milhões e prejuízos de 7,6 milhões.
O Expresso tentou falar com a administração do grupo Global Media, mas não teve resposta. Assim, os últimos dados oficiais conhecidos, referentes a novembro último, indicam que o grupo pretendia cortar custos operacionais em 15 milhões de euros, assumindo que metade desse valor correspondia a custos salariais, através do despedimento coletivo. Mesmo considerando a quebra na faturação decorrente da pandemia, a estimativa para 2021 era de resultados operacionais positivos e 2022 deveria ser um ano de lucros.
Sindicato “estranha este cenário” e explica
Já o Sindicato dos Jornalistas (SJ), em comunicado, manifestou “profunda preocupação com a situação que se vive atualmente na Global Media”, com a adesão ao Apoio Extraordinário de Retoma Progressiva da Atividade “de 5 de maio até ao final de setembro”.
“O SJ recorda que o impacto que a decisão hoje anunciada e já noticiada vai ter na vida pessoal e financeira dos trabalhadores, aos quais se vai pedir maior esforço pelo mesmo ou menor salário, podendo pôr em causa a qualidade do jornalismo que é produzido pelos diversos órgãos daquele que é o maior grupo privado de comunicação social, especialmente seis meses depois de um despedimento coletivo (…) que antecedeu a entrada do acionista maioritário Marco Galinha, do grupo Bel”, diz o comunicado.
“Cerca de meio ano depois, a situação financeira do GMG serve para justificar a adesão a este novo plano, apesar de a administração ter assumido que há sinais positivos nos vários órgãos do grupo. O SJ estranha este cenário, mais ainda porque há poucas semanas houve novas contratações e investimentos, bem como promessas de aumentos em alguns meios de comunicação social do grupo e espera que a adoção do mesmo não seja um paliativo para a aplicação de outro tipo de medidas mais prejudiciais para os trabalhadores”, diz ainda.
Com um grupo presente em várias frentes, dos media, onde também tem 10% do Jornal Económico, à distribuição e máquinas automáticas de venda, investigação, desenvolvimento e tecnologia, automação, indústria aeronáutica, aeroespacial e metalomecânica, soluções sustentáveis, imobiliário, sem esquecer a empresa de sondagens Aximage, Marco Galinha garantiu ao Expresso, em março último, que a entrada no mundo da comunicação social era “bem intencionada”. “Só quero media com estruturas acionistas estáveis que defendam os interesses do país”, disse o empresário que já assinou com a Impresa, proprietária do Expresso, a compra das participações de 22,35% na Lusa e de 16,67% na VASP, e no âmbito do acordo social com a Global Media deverá reforçar aqui a sua posição até aos 50%.