Em “O Eu É um Outro”, segundo volume da “Septologia”, o Nobel da Literatura Jon Fosse obriga-nos a olhar intensamente para objectos e situações sem distracções, como se olha para um quadro
O subgénero literário “justificação Nobel”, fórmula às vezes canhestra, às vezes inventiva, não esteve ao melhor nível quando elogiou em Jon Fosse a capacidade de “dar voz ao indizível”. Se a literatura nos mostra alguma coisa é que não há nenhum “indizível” que não encontre uma linguagem capaz de o exprimir. Por outro lado, percebe-se o parecer dos suecos, na medida em que o dramaturgo Fosse se especializou na sugestão, no não dito, nomeadamente em peças que se baseiam numa ameaça não explicada ou numa situação poética reduzida ao osso (“Vai Vir Alguém”, 1996, “Sou o Vento”, 2007).
Já o ficcionista, especialmente o autor de “Septologia” (2019-2021), levou ainda mais longe essa ideia, mergulhando a narração, ou o monólogo interior, num nevoeiro que confunde o factual com o inefável, o exaustivo catálogo das actividades quotidianas com uma fé religiosa que se relaciona com Deus Ele-mesmo, aproximando-se de uma toada mística.
Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: pedromexia@gmail.com