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Artistas que vão à Festa do Avante respondem às críticas: “Onde estão quando a fome grita por socorro às crianças no Iémen?”

Paulo Bragança, Bia Ferreira e Dino D'Santiago
Paulo Bragança, Bia Ferreira e Dino D'Santiago
Rita Carmo (PB e DS) e FB BF

Face às críticas de José Milhazes ou Henrique Raposo, alguns dos artistas que vão atuar na Festa do Avante respondem. Dino D’Santiago e Paulo Bragança garantem ser pela paz, a brasileira Bia Ferreira diz: “O que incomoda é a denúncia que eu faço: que o seu antepassado escravizou o meu povo, aqui no Brasil, e que a gente paga essa conta até hoje”

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Com a revelação do cartaz da Festa do Avante, que acontece de 2 a 4 de setembro na Quinta da Atalaia, no Seixal, surgiram várias críticas aos artistas portugueses que aceitaram o convite para tocar no evento do Partido Comunista Português (PCP), o único partido português com assento parlamentar que não condenou a invasão militar da Ucrânia ordenada pelo Presidente da Rússia, Vladimir Putin.

O primeiro a manifestar-se foi José Milhazes. Na SIC, o comentador lembrou que os músicos “são livres de participarem no que quiserem, mas estão a participar numa festa que não é só musical. É uma festa política de um partido que apoia regimes hediondos e que, neste momento, está a apoiar uma guerra.

Fiquei estupefacto ao ver no cartaz artistas como Carminho ou o Paulo Bragança”, disse José Milhazes, acrescentando estranhar a presença de Bia Ferreira, “que segundo o cartaz é uma das mais destacadas vozes brasileiras de afirmação da comunidade LGBT e vem à festa de um partido que apoia regimes que perseguem, prendem e matam todas estas minorias sexuais”.

Convidado do podcast da BLITZ, Posto Emissor, Paulo Bragança afirmou: “Tem havido uma onda de hate por causa do Avante. Eu sou um homem da paz e vou pela paz. Vou trabalhar e mais nada”.

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Por seu turno, Bia Ferreira respondeu de forma assertiva, com um vídeo no qual responde às mensagens que tem recebido após o comentário de José Milhazes. “A Festa do Avante convidou-me para fazer um show e qualquer palco que me convide para fazer a minha arte, eu subo, porque sou uma mulher, preta e brasileira, que não tem tantas oportunidades assim para fazer a arte política e revolucionária que eu apresento.”

“Eu vou para fazer a minha arte” Bia Ferreira

“Eu vou para denunciar os estragos que o povo português deixou aqui no Brasil. Se só as mortes na Ucrânia incomodam vocês, porque é um europeu branco morrendo, eu queria falar que a cada 23 minutos morre um preto aqui no Brasil. E é isso que eu vou fazer à Festa do Avante: denunciar o estrago que ficou aqui. Eu não me nego a tocar, porque a minha arte não vai ser calada nem denunciada”, afirma.

“O que incomoda mesmo é a denúncia que eu faço: que o seu antepassado escravizou o meu povo, aqui no Brasil, e que a gente paga essa conta até hoje. Por isso é que vocês estão muito ouriçados por a Bia tocar na Festa do Avante. Eu vou, sim, para fazer a minha arte”, diz Bia Ferreira, que a 28 de julho também atua no FMM de Sines.

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Bia Ferreira desenvolveu essas ideias num post no Instagram: “Quanto à guerra entre Rússia e Ucrânia, eu nunca fui a nenhum desses países, mas aqui no Brasil eu vivo na guerra desde que nasci, e nunca vi essas mesmas pessoas preocupadas com as nossas mortes. Helicópteros sendo usados de base de tiro para matar civis na favela. As mortes na Ucrânia incomodam porque são brancos morrendo. Quanto vale a vida das pessoas mortas todos os dias pela violência do estado no Brasil? Sabe a cor delas? Se não te comove, então você é só mais um racista. E o Brasil, é o país que mais mata [pessoas] LGBTQIAP+ no mundo!”, afirma.

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“Enquanto tiver munições, viajarei por todos os lugares onde sou bem-vindo” Dino D’Santiago

Por seu turno, Dino D'Santiago escreveu: “Tenho recebido mensagens de algumas pessoas, contra a minha participação na Festa do Avante, uns pedindo para que eu cancele, outros responsabilizando-me pelo sangue ucraniano derramado nesta guerra. Sim. Sou responsável pelo sangue derramado nesta e em todas as guerras, em ambos os lados da trincheira! Porque sou um filho do século XX! O século mais assassino da história da Humanidade! Nas NOSSAS mãos carregamos o sangue de mais de 100 milhões de seres humanos, mortos em nome do poder, religião ou genocídio.”

Por outro lado, o autor de 'Nova Lisboa' aponta: “
Relativamente a esta guerra entre dois países europeus, parece que despertou finalmente a compaixão do privilegiado eurocêntrico que hoje prova o sabor do seu próprio veneno 'ocidental'. Onde estão quando a fome grita por socorro às crianças no Iémen, onde estão quando o assunto são os 5,5 milhões de seres refugiados da República Democrática do Congo, ou dos 1,75 milhões que fogem de Burkina Faso, somando aos outros milhões de pessoas refugiadas vindas dos Camarões, Sudão do Sul, Chade, Mali, Sudão, Nigéria, Burundi e Etiópia?”, indaga. “Sou e serei sempre pela PAZ em qualquer canto deste Globo! E para esta guerra da humanidade carrego a única arma que herdei dos meus pais…AMOR! E enquanto tiver munições viajarei por todos os lugares onde sou bem-vindo.”

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No Expresso, também Henrique Raposo escreveu sobre o tema, comentando a reação da Embaixada da Rússia às palavras contra Putin, num concerto em Águeda. “Depois do caso Pedro Abrunhosa, fica ainda mais escandalosa a relação de amizade e conivência entre o PCP e a Rússia e, neste sentido, importa perguntar: os artistas portugueses vão continuar a fazer campanhas e ações pela liberdade e diversidade de manhã e à tarde vão continuar a tocar na festa do partido que apoia Putin? Vão continuar a fazer campanhas LGBT de manhã e à tarde vão tocar na festa do partido português mais reacionário nesse campo e que, ainda por cima, recusa condenar o regime de Putin onde as minorias LGBT são perseguidas?”

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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