Estes arquitetos fizeram o escritório mais sustentável em Portugal: “Ajuda a melhorar a reputação da empresa”
Tem uma horta comunitária, um circuito para caminhadas ao ar livre e até um dog park. O edifício sede da Nestlé é o único em Portugal que tem a certificação WELL no seu nível mais elevado, de platina. O Expresso SER foi tentar perceber o que tem de especial este edifício que, nas palavras de Ana Silveira e Castro, arquiteta na Openbook, ajuda a melhorar “a produtividade e a saúde física e mental dos trabalhadores”
O novo edifício do Campus Nestlé, com 23.700 m2 de área coberta, mais 7.200 m2 de jardins e onde trabalham mais de 1000 pessoas, é o primeiro e, até agora, o único em Portugal que recebeu a certificação WELL no seu nível mais elevado, o de platina. Esta certificação distingue os edifícios mais saudáveis e sustentáveis e que promovem uma relação harmoniosa com os seus ocupantes.
Nesta altura são cada vez mais as empresas que procuram obter certificações internacionais que atestam a sustentabilidade do seu edifício, sendo os sistemas de certificação mais conhecidos o BREEAM, o LEED e o WELL. Este último privilegia o bem-estar e a saúde dos ocupantes dos edifícios ao invés do impacto ambiental das construções. O Campus Nestlé, que no ano passado obteve a certificação LEED Gold, conseguiu este ano a proeza de ser o primeiro em Portugal a receber a certificação WELL no seu nível mais elevado, de platina.
Mas, afinal, o que tem este campus de especial? Tem uma sala para amamentação, apoio à saúde mental com consultas de psicologia, e salas de mindfullness & wellbeing para meditação, para atividades física e sessões de massagem. Tem ainda um espaço dedicado aos filhos dos colaboradores, bem como um posto médico com consultas todos os dias. Segundo a própria Nestlé, a “existência de uma fonte de água filtrada a menos de 30 metros de cada posto de trabalho, a eliminação de alcatifas para evitar a existência de ácaros que pudessem contaminar a qualidade do ar, a constante monitorização da correta luminosidade e conforto térmico dos postos de trabalho, adaptado a todas as estações do ano” são outras características que contribuíram para que a remodelação da sede da empresa recebesse esta medalha de platina, na certificação Well.
Uma horta comunitária, um dog park e um circuito com um quilómetro para caminhadas ao ar livre são outros trunfos deste escritório da multinacional em Linda-a-Velha.
A Openbook, um escritório com 60 trabalhadores e que no ano passado faturou seis milhões de euros, foi a responsável por este projeto de arquitetura e diz que a sustentabilidade “é um tema que leva muito a sério. Estamos comprometidos em criar edifícios que sejam sustentáveis do ponto de vista ambiental, social e económico”. Em declarações por escrito ao Expresso SER, Ana Silveira e Castro, arquiteta associada da Openbook, garante que hoje em dia “as certificações BREEAM, LEED e WELL são importantes no mundo da arquitetura e cada vez mais populares, à medida que as pessoas ganham consciência da importância do tema sustentabilidade”.
Reconhece que fazer ou remodelar um edifício com uma baixa pegada carbónica tende a ser mais caro no curto prazo, mas não no longo prazo. E as certificações têm um bónus para a empresas: “contribuem para melhorar a reputação, pela preocupação que revelam face ao meio ambiente e aos seus funcionários”. E têm várias vantagens para os trabalhadores: “a melhoria da saúde física e mental, o aumento da produtividade, a redução do absenteísmo, o aumento da satisfação no trabalho, o aumento da reputação da empresa, a atração e retenção de talentos e a redução dos custos de saúde”.
Para quem não conhece, o que é a Openbook? A Openbook surge em 2007 como empresa de arquitetura e design, com a missão desenhar espaços de qualidade que transformam a vida das pessoas. Ao longo dos anos, a empresa foi-se expandindo para oferecer uma experiência integrada aos seus clientes e, atualmente, o Grupo Openbook é composto pelas empresas Openbook Architecture, Openbook Real Estate, Openbook Interior Design, Openbook Engineering e Openbook Design. Com uma equipa multidisciplinar de mais de 60 profissionais, a metodologia de trabalho da Openbook permite desenvolver cada projecto através de uma abordagem holística, onde o cliente, a qualidade do desenho e o respeito pela equipa são os pilares de toda a atividade.
A Openbook opera em diferentes fases, abrangendo um serviço completo de apoio ao cliente, desde projetos de arquitetura e engenharia, design corporativo e de interiores, identidade de projeto e branding, e design gráfico ambiental, até à gestão de projetos e consultoria imobiliária e estruturação de operações de investimento. A Openbook Architecture foi reconhecida como a Melhor Empresa de Arquitetura em Portugal pelos Prémios Construir 2022.
Podem partilhar alguns números da vossa empresa? Em termos de faturação, a Openbook fechou 2022 com 6 milhões de euros de faturação, o que representa um crescimento de 50% por comparação ao ano anterior. O objetivo para 2023 é chegar aos 7,5 milhões de euros em faturação. A Openbook fechou 2022 com 60 colaboradores, um aumento de 33%. Para 2023, o objetivo em termos de equipa é crescer cerca de 35%.
Quais são as vossas obras mais emblemáticas, tendo como pano de fundo esta temática da sustentabilidade? O projeto mais emblemático dentro da temática da sustentabilidade acaba por ser o do Campus Nestlé. Não apenas pelas certificações Leed Gold e WELL Platina (a primeira WELL Platina atribuída a um edifício em Portugal) obtidas, mas também pelo trabalho integrado entre espaços interiores e exteriores, numa área total aproximada de 22.000 m2.
Outro exemplo é o edifício da Miniclip, no Taguspark [ver foto em baixo]. Concluído em 2022, o edifício foi desenhado para receber 350 pessoas numa área total de 8.000m2. Neste caso, o edifício e todo o seu interior – um local de trabalho - foi preparado para estar habilitado a receber certificações, sendo que esse processo não decorreu durante a obra e está atualmente a ser desenvolvido.
A sustentabilidade é um tema que levamos muito a sério, e os resultados começam a multiplicar-se por vários projetos que temos em mãos. Estamos comprometidos em criar edifícios que sejam sustentáveis do ponto de vista ambiental, social e económico. Temos consciência que é um caminho que estamos a fazer e que isso passa por incutir o tema da sustentabilidade na metodologia de trabalho e na forma de pensar arquitetura.
Cada vez mais procuramos encontrar soluções que sejam eficientes em termos energéticos e minimizem o impacto ambiental. A escolha dos materiais é cada vez mais criteriosa nesse sentido e temos a preocupação de trazer esse conhecimento para dentro de casa. Através do Openbook Forum, por exemplo, que tem caráter técnico e formativo com a missão de realizar sessões sobre os mais variados temas relacionados com a arquitetura, entre eles a sustentabilidade, claro. São excelentes oportunidades de nos mantermos atualizado quanto às melhores práticas do mercado.
A atitude dos vossos clientes está a mudar? Há mais empresas e particulares a pedir projetos arquitetónicos com esta preocupação ambiental e de sustentabilidade? Claramente. A consciencialização geral para o tema reflete-se também na atitude dos clientes, temos notado isso. O aumento de empresas e particulares a solicitarem projetos de arquitetura com uma preocupação ambiental e de sustentabilidade é uma realidade.
Em resposta a esta mudança de atitude, os arquitetos, de uma forma geral, estão a desenvolver projetos mais ecológicos e sustentáveis. Projetos que utilizam materiais naturais, tecnologias de energia renovável e técnicas de construção que reduzem o impacto ambiental dos edifícios. Os edifícios para habitação construídos com materiais naturais como a madeira, e que utilizam energia solar e eólica para gerar energia, são um bom exemplo. Edifícios de escritórios projetados para otimizar a exposição à luz natural e a ventilação natural, a par de sistemas de água e energia eficientes, é também um exemplo de uma tendência que felizmente tende a crescer.
Nós, enquanto arquitetos, temos um papel importante a desempenhar nesta mudança de atitude. Podemos ajudar os nossos clientes a encontrar soluções sustentáveis para os seus projetos e podemos também informá-los sobre os benefícios da sustentabilidade. Acreditamos que a arquitetura sustentável é o futuro da arquitetura. Estamos comprometidos em trabalhar com os nossos clientes para criar projetos que não sejam apenas funcionais e esteticamente bonitos, mas também cada vez mais sustentáveis.
Qual é a importância hoje em dia das certificações (tipo BREEAM, LEED e WELL) no mundo da arquitetura? As certificações BREEAM, LEED e WELL são de facto importantes no mundo da arquitetura e cada vez mais populares, à medida que as pessoas ganham consciência da importância do tema sustentabilidade. Um ponto forte das certificações é serem uma garantia de que os edifícios estão projetados e construídos de forma sustentável, saudável e confortável para os seus ocupantes. As certificações são baseadas numa série de critérios que abrangem temas como a eficiência energética, o uso de materiais sustentáveis, a qualidade do ar interior, o bem-estar dos ocupantes e a gestão da água.
Importante também referir que as certificações podem trazer uma série de benefícios para os próprios proprietários dos edifícios, onde se inclui a redução dos custos de energia e manutenção, a melhoria da qualidade do ar interior, o aumento do bem-estar dos ocupantes, a valorização do próprio edifício, a atratividade que gera para investidores e ocupantes (um tema relevante para a captação e retenção de talento) e a redução do impacto ambiental. Os edifícios sustentáveis contribuem para melhorar a reputação da empresa, pela preocupação que revelam face ao meio ambiente e aos seus funcionários.
“As certificações são baseadas numa série de critérios que abrangem temas como a eficiência energética, o uso de materiais sustentáveis, a qualidade do ar interior, o bem-estar dos ocupantes e a gestão da água.”
A Openbook foi responsável pelo projeto dos novos escritórios da Nestlé que foi o primeiro em Portugal a receber o nível mais elevado da certificação Well. O que é que estes escritórios têm de diferente para merecer esta classificação? Os edifícios com a certificação WELL Platina distinguem-se pelos mais altos padrões de saúde e bem-estar, reunindo uma série de requisitos que promovem a boa qualidade do ar, a qualidade da água, a iluminação natural, a ergonomia, o exercício físico e também uma cultura social. A implementação de todos estes requisitos reflete-se num conjunto de benefícios incontornáveis, dos quais destaco a melhoria da saúde física e mental, o aumento da produtividade, a redução do absenteísmo, o aumento da satisfação no trabalho, o aumento da reputação da empresa, a atração e retenção de talentos e a redução dos custos de saúde.
Falando do caso específico do Campus Nestlé, diria que houve dois fatores críticos que permitiram atingir este nível de certificação: o trabalho conjunto entre todas as partes envolvidas no processo – sendo que a parte operacional é fundamental para atingir este nível de certificação – e as condições do espaço em si, que são de facto incríveis e nos permitiram projetar o edifício para o exterior e fazer esta ligação fundamental com a natureza, tendo por exemplo uma pista para caminhadas, uma Garden Box com zonas colaborativas e sociais, e todo um conjunto de zonas verdes, numa área total de cerca de 22.000 m2.
Do que mais se orgulham neste projeto da Nestlé? Para além, obviamente, do projeto em si e da obtenção das certificações, orgulha-nos o feedback que temos tido por parte do cliente. Como tive oportunidade de referir, temos por missão desenhar espaços de qualidade que transformam a vida das pessoas, e isso é algo que valorizamos verdadeiramente. Sabemos também que o Campus Nestlé tem sido visitado por algumas empresas, como um modelo de workplace a seguir, o que reflete de facto o interesse e a atratividade do projeto.
Que outros projetos a Openbook tem em carteira que têm este cunho da sustentabilidade? Seja qual for o projeto, a Openbook tem sempre uma preocupação em termos de sustentabilidade. Isto significa que, mesmo que o cliente não tenha dado qualquer indicação nesse sentido, existem determinados standards que fazemos sempre questão de atingir - a nossa legislação e regulamentos também tiveram uma grande evolução nesse sentido.
“Sabemos também que o Campus Nestlé tem sido visitado por algumas empresas, como um modelo de workplace a seguir, o que reflete de facto o interesse e a atratividade do projeto.”
No setor da construção e da arquitetura, quais são as tendências de futuro para baixar a pegada ecológica das novas construções? Novos materiais? Reciclagem? Utilização de módulos? Pré-fabricados? Uma das tendências mais importantes que se verifica atualmente no setor da construção é o de baixar a pegada ecológica das novas construções. Uma tendência impulsionada por uma série de fatores, entre os quais se inclui a crescente consciência dos efeitos das mudanças climáticas, o aumento do custo da energia e a crescente disponibilidade de materiais e tecnologias sustentáveis.
Uma das tendências é a construção de baixo consumo de energia, também conhecida por edifícios passivos, projetados para consumir o mínimo de energia possível. Estes edifícios geralmente utilizam uma combinação de tecnologias sustentáveis, tais como isolamento térmico, janelas eficientes e painéis solares.
A tecnologia dá também uma grande ajuda na gestão eficiente da energia, água e outros recursos, e é sem dúvida uma tendência em crescimento. A construção modular é também uma tendência, mas a meu ver acarreta outras questões como a necessidade de grandes áreas de produção industrial, e o transporte de grandes dimensões que podem não facilitar o processo. A verdade é que, à medida que o setor da construção e da arquitetura evolui, é normal que continuem a surgir inovações e desenvolvimentos.
Em termos económicos e de custos, é muito mais caro fazer uma obra com uma baixa pegada carbónica? Em termos de custos, construir uma obra com uma baixa pegada carbónica tende a ser mais caro, dependendo de uma série de fatores, incluindo o tipo de obra, os materiais utilizados, a localização e a mão-de-obra. Mas o normal é que seja mais caro no curto prazo e se revele mais barato no longo prazo. A sustentabilidade tem também de ser vista desta forma – não é algo para ser visto apenas no imediato, é necessário ter outro tipo de perspetiva.
Uma das razões para isso acontecer é o facto dos edifícios com baixa pegada carbónica serem mais eficientes em termos energéticos e requererem menos manutenção, o que significa uma poupança a longo prazo. Acresce que os edifícios com uma pegada carbónica baixa, que normalmente vêm a obter a certificação LEED ou BREEAM são por isso mais valorizados no mercado imobiliário, o que significa uma potencial vantagem na sua venda ou arrendamento, especialmente para investidores internacionais.