Vale a pena investir em fundos com preocupações ambientais e sociais? Dão dinheiro? A longo prazo são mais rentáveis? Os fundos que respeitam as regras do ESG (sigla inglesa para ambiente, responsabilidade social e boa governança) rendem mais ou menos do que os fundos convencionais? Para responder a estas questões, o Expresso SER analisou os 177 fundos de investimento mobiliários comercializados em Portugal e chegou à conclusão que os fundos com maiores preocupações de sustentabilidade quando perdem, perdem menos do que os convencionais. E quando ganham, em média, ganham mais (ver tabela em baixo).
Vamos por partes. As regras europeias obrigam agora a indústria dos fundos a respeitar o Regulamento de Divulgação de Finanças Sustentáveis (Sustainable Finance Disclosure Regulation – SFDR). O objetivo do regulamento “é garantir uma maior transparência em termos de responsabilidades ambientais e sociais dos mercados financeiros, permitindo, por um lado, combater o greenwashing dos produtos financeiros (ou seja, já não é possível rotular um produto como ESG ou sustentável sem o comprovar), e por outro, permitindo aos investidores a comparação de opções de investimento ESG, contribuindo para uma tomada de decisão mais informada”. A explicação é do Business Council for Sustainable Development Portugal.
Como tal, as sociedades gestoras de fundos são obrigadas por esse regulamento a classificar os seus produtos financeiros em três categorias, de acordo com o grau de sustentabilidade. Estas categorias são definidas nos artigos 6º, 8º e 9º do tal regulamento SFDR. Como explicou ao Expresso SER o presidente da APFIPP (Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios), na sequência da entrada em vigor do regime SFDR, os gestores têm de escolher uma das três categorias para classificar os fundos que vendem aos seus clientes:
- Produtos financeiros que promovem características ambientais e/ou sociais (produtos artigo 8º do SFDR);
- Produtos que têm como objetivo investimentos sustentáveis (produtos artigo 9º do SFDR);
- E os restantes produtos (produtos artigo 6º do SFDR) que devem pelo menos gerir o risco decorrente de fatores ESG.
Resumindo, para quem está à procura de fundos que respeitem os critérios ESG, os que têm o carimbo do “artigo 9º” são os melhores, seguindo-se depois aqueles com a marca do “artigo 8º”.
Como saber se um fundo é sustentável?
Dos 177 fundos de investimento comercializados em Portugal, 49% (87 fundos) não têm quaisquer preocupações ambiental ou social, 47% (83 fundos) têm um carimbo do “artigo 8º” e, finalmente, 4% (7 fundos) são fundos com a melhor classificação de sustentabilidade do “artigo 9º”. Estes últimos são todos comercializados pelo BPI que no último ano lançou sete fundos a que chamou de “BPI Impacto Clima”.
Para saber se um fundo comercializado por um banco ou uma sociedade gestora é mais ou menos sustentável, é preciso olhar para o prospeto que é uma espécie de ficha com as principais características do produto. No site da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) estão depositados todos os prospetos. E é no prospeto que o fundo diz qual é a sua classificação no âmbito do regulamento do SFDR.
Nos fundos que não têm grandes preocupações ambientais, o mais comum é encontrar no prospeto esta frase: “O Fundo não representa um produto financeiro de promoção de características ambientais e/ou sociais e/ou de governação, nem tem como objetivo explícito, direto e/ou indireto, investimentos sustentáveis, para efeitos do artigo 8.º e 9.º do Regulamento (UE) 2019/2088 do Parlamento Europeu e do Conselho de 27 de novembro de 2019”.
Aqueles que têm a classificação do artigo 8º, normalmente têm no prospeto uma frase parecida com esta: “O Fundo procura a promoção de características ambientais e sociais na aceção do artigo 8º do Regulamento 2019/2088 da União Europeia, relativo à divulgação de informação relacionada com a sustentabilidade no setor dos serviços financeiros”.
Os mais sustentáveis são, em média, mais rentáveis
O Expresso SER analisou a rendibilidade dos 177 fundos de investimento vendidos em Portugal para perceber se aqueles com mais preocupações ambientais e sociais comparam bem com os restantes em termos de retorno. E a resposta é afirmativa. Desta análise deixámos de fora os sete fundos comercializados pelo BPI da família “BPI Impacto Clima”, porque foram lançados há pouco tempo e ainda não têm um histórico de rendibilidade. Dividimos os restantes 170 fundos numa categoria mais sustentável (chamada de artigo 8º) e outra sem preocupações de sustentabilidade (chamada de artigo 6º). A análise tem em conta os dados da APFIPP até à semana que terminou a 3 de fevereiro, sendo os cálculos da responsabilidade do Expresso SER.
A primeira conclusão é que nos últimos 12 meses todos os fundos deram prejuízo, mas aqueles com preocupações ambientais, sociais e de governança perderam ligeiramente menos: 4,9% contra os 5,01% dos fundos convencionais (ver tabela em baixo). Isto apesar de ter sido um ano particularmente mau para os fundos ESG a nível mundial, já que a guerra na Ucrânia provocou uma alta dos preços do petróleo que, por sua vez, fez disparar os lucros e a cotação das petrolíferas. Alguns fundos com preocupações ambientais não investem nas empresas que produzem combustíveis fósseis, ou seja, não beneficiaram do aumento do valor de mercado das petrolíferas.
Olhando a mais longo prazo, os fundos com maiores preocupações ambientais e sociais comercializados em Portugal também saem bem na fotografia. Por exemplo, nos últimos três anos, os fundos com o carimbo do artigo 8º renderam, em média, 0,42% ao ano, enquanto os fundos convencionais perderam 0,26%/ano. A cinco anos, o “brilharete” dos fundos do artigo 8º repete-se: renderam, em média, 1,01%/ano, contra 0,72%/ano dos restantes fundos.
Mas atenção, esta é uma média aritmética de todo o mercado, ou seja, de fundos pertencentes a diferentes categorias e a diferentes níveis de risco. Nalgumas categorias, os fundos sem preocupações ambientais geraram maior retorno do que os fundos com a classificação do artigo 8º.
Entre os dez fundos com melhor desempenho financeiro nos últimos 12 meses, seis têm a classificação ambiental/social/governação mais fraca e apenas quatro têm o carimbo do artigo 8º (ver tabela em baixo). Mas olhando para todo o mercado, os fundos sustentáveis saem melhor na fotografia.