Saúde

“SNS sem tempo a perder”: Federação Nacional dos Médicos convoca greve e critica “entrevista do economista secretário de Estado”

“SNS sem tempo a perder”: Federação Nacional dos Médicos convoca greve e critica “entrevista do economista secretário de Estado”
ANDRE KOSTERS

A FNAM tem ainda previsto enviar uma delegação a Bruxelas para entregar -- sem data definida -- um manifesto em defesa da saúde pública aos deputados portugueses no Parlamento Europeu e à comissária europeia da Saúde

A Federação Nacional dos Médicos (FNAM) convocou hoje uma greve nacional para 14 e 15 de novembro, exigindo salários justos e condições de trabalho dignas para todos os médicos no Serviço Nacional de Saúde (SNS).

"Chegámos ao fim de agosto, 28 dias depois de a FNAM ter entregado a sua contraproposta no Ministério da Saúde relativamente às grelhas salariais, novo regime de dedicação e integração do internato médico na carreira e ainda não obtivemos resposta", alerta a federação em comunicado.

Além da greve nacional de dois dias e de uma manifestação junto ao Ministério da Saúde em 14 de novembro às 15:00, a Federação Nacional dos Médicos anunciou uma caravana nacional entre os dias 05 de setembro e 15 de novembro.

A FNAM explica que o "objetivo é ouvir os médicos e apoiar a que continuem a entregar as declarações de indisponibilidade para realizar trabalho suplementar além das 150 horas obrigatórias por ano".

Esta ação vai decorrer entre as 08:00 e as 10:00 e terá início no Porto, passando por Viana do Castelo, Braga, Bragança, Chaves, Penafiel, Aveiro, Coimbra, Leiria, Guarda, Viseu, Setúbal, Évora e Faro.

Ocorrendo à margem do 2.º Simpósio da Organização Mundial da Saúde (OMS) sobre "O Futuro dos Sistemas de Saúde na era digital", a caravana irá terminar nos dias da greve nacional em Lisboa.

"Os médicos e o SNS não têm mais tempo a perder. A população em Portugal merece uma saúde universal, acessível, eficiente e de qualidade, e não pode continuar refém da incompetência do Ministério da Saúde e do Governo", afirma.

A FNAM tem ainda previsto enviar uma delegação a Bruxelas para entregar -- sem data definida -- um manifesto em defesa da saúde pública aos deputados portugueses no Parlamento Europeu e à comissária europeia da Saúde.

As ações de protesto da FNAM juntam-se a outras do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), que tem em curso uma série de greves, em várias modalidades e regiões, até setembro, nomeadamente uma greve de médicos internos na semana passada, uma greve às horas extraordinárias dos médicos de família que se prolonga até 22 de setembro e paralisações por região (Alentejo, Algarve e Açores param em 30 e 31 de agosto).

Em 10 de agosto, os sindicatos dos médicos e o Governo concluíram uma quinta reunião negocial extraordinária sem chegar a acordo sobre a revisão da grelha salarial, principal item do caderno reivindicativo apresentado à mesa das negociações, iniciadas em 2022.

A FNAM, que pediu mediação externa e independente das negociações, face ao seu impasse, reivindica aumentos que compensem a perda de poder de compra dos médicos na última década, um horário semanal de 35 horas, a reposição das 12 horas em serviço de urgência e do regime majorado da dedicação exclusiva e a integração dos médicos internos no primeiro grau da carreira.

A estrutura sindical rejeita a manutenção das 40 horas de trabalho semanais e o acréscimo do limite de horas extraordinárias das atuais 150 para 300 por ano, o aumento "irrisório do salário base entre 0,4% e 1,6%", a manutenção das 18 horas de urgência e as regras previstas para o novo regime de dedicação plena ao SNS nos hospitais.

Uma nova reunião negocial entre sindicatos e Governo está agendada para 11 de setembro.

A crítica ao secretário de Estado

Por outro lado, a Federação Nacional dos Médicos considerou hoje que as Unidades Locais de Saúde (ULS) propostas pelo Governo assentam numa visão "muito hospitalocêntrica", defendendo que o único objetivo é poupar dinheiro, com prejuízo dos serviços.

"Algumas já existem e nem sequer funcionam bem", disse à agência Lusa a presidente da FNAM, Joana Bordalo e Sá, ao comentar a entrevista ao Público do secretário de Estado da Saúde, Ricardo Mestre.

"Os cuidados de saúde primários não têm de estar na dependência de um hospital. A população precisa de ter médicos de família e cuidados hospitalares quando são necessários", referiu.

O secretário de Estado assumiu, na entrevista, que o objetivo é ter o país coberto por estas unidades a partir de janeiro, integrando os hospitais e os centros de saúde numa mesma instituição e direção, com financiamento definido em função do risco clínico. O modelo subdivide a população em três subgrupos: saudáveis, doentes crónicos e casos complexos.

"A entrevista do economista secretário de Estado não traz nada de novo para os médicos e para o Serviço Nacional de Saúde", afirmou a dirigente sindical, para quem as propostas do Ministério da Saúde são "medidas economicistas".

"Parece que nos vão tentar impor algo que não serve os médicos de família", antecipou, referindo-se às Unidades de Saúde Familiar (USF).

De acordo com Joana Bordalo e Sá, falar num aumento salarial de 30% para os médicos "não é verdade". O que está em cima da mesa, garantiu, é "um aumento médio de 1,6%".

"A dedicação plena só vai servir alguns médicos", explicou, criticando igualmente eventuais compensações através da atribuição de suplementos: "Os médicos querem um aumento no salário base".

"Aumentar a jornada de trabalho para nove horas é algo de medieval", criticou a médica, indicando que as propostas do Governo preveem também que os médicos passem a trabalhar ao sábado, dentro da atividade programada, no horário normal. "Dizem que há aumento de um suplemento, mas é com perda de direitos para os médicos e prejuízo para o serviço".

O secretário de Estado garantiu, na entrevista ao diário, que o orçamento da saúde vai ser o maior de sempre no próximo ano. Este ano, nas contas apresentadas pelo governante, há 14 mil milhões de euros de despesa aprovada.

Segundo a FNAM, apenas foram executados 10% do OE da saúde este ano.

"Tem de haver fundos para pagar aos profissionais. Sem recursos humanos fixos não é possível termos um SNS em condições", declarou, garantindo que os médicos vão continuar em luta.

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