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Migrações

Dois terços dos portugueses querem menos imigrantes hindustânicos e acham que estrangeiros contribuem para um aumento da criminalidade

Dois terços dos portugueses querem menos imigrantes hindustânicos e acham que estrangeiros contribuem para um aumento da criminalidade
Tiago Miranda

Barómetro da Imigração, da Fundação Francisco Manuel dos Santos, revela que maioria dos portugueses associa população estrangeira residente a aumento da criminalidade e salários baixos e quer 'portas mais fechadas'. Maior oposição, sobretudo a naturais de países africanos e do subcontinente indiano, vem de inquiridos da Direita

Dois terços dos portugueses querem menos imigrantes hindustânicos e acham que estrangeiros contribuem para um aumento da criminalidade

Raquel Moleiro

Jornalista

Não é um retrato integrador e acolhedor o que sai do Barómetro da imigração realizado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS), a propósito do Dia Internacional das Migrações que se comemora amanhã, quarta-feira, 18 de dezembro. Auscultadas as perceções, opiniões e atitudes da população portuguesa relativas ao fenómeno, apurou-se que cerca de dois terços acreditam que os imigrantes contribuem para um aumento da criminalidade e para a manutenção dos salários baixos no país, consideram a atual lei de estrangeiros excessivamente permissiva em matéria de entradas e defendem que deveriam existir no país menos cidadãos oriundos especificamente do subcontinente indiano.

Os últimos dados da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), revelados ao Expresso, apontam para 1.164.606 estrangeiros com autorização de residência em Portugal, até ao fim de outubro de 2024, o que representa 11% da população nacional. Mas os inquiridos no estudo da FFMS pensam que são muitos mais. Quando questionados sobre o número de imigrantes a viver no país, mais de 40% aponta para cima, numa estimativa inflacionada que “influencia significativamente as atitudes em relação à imigração”, lê-se no estudo.

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Além de inflação, há também antagonismo na visão da imigração que sai deste barómetro. Se, por um lado, grande parte dos portugueses considera a imigração mais uma ameaça (cultural e securitária) do que uma oportunidade, por outro defende que os migrantes devem votar, trazer a família e ter o processo de naturalização facilitado. E ao mesmo tempo que 68% concordam que os imigrantes são fundamentais para a economia nacional, 52% acreditam que recebem mais do que contribuem para a Segurança Social, o que é totalmente desmentido pelos números que vêm a público todos os anos. Os imigrantes são contribuintes que dão saldo muito positivo para o Estado português.

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Os últimos a chegar, os primeiros a partir

Em inquéritos anteriores, de 2006 e 2011, já tinha sido questionado aos participantes se o número de imigrantes deveria diminuir, em função da sua origem - Europa do Leste, países ocidentais, países africanos, Brasil e China -, para perceber se a sociedade portuguesa tem níveis de aceitação diferentes consoante as nacionalidades.

O Barómetro da FFMS acrescentou pela primeira vez os naturais do subcontinente indiano, uma vaga mais recente, “e observou-se uma oposição extremamente elevada, superior à de todos os outros grupos e atingindo níveis não registados nas décadas anteriores” em nenhuma origem, lê-se no estudo, onde 6 em cada 10 inquiridos (60%) considera que estes imigrantes devem diminuir ou diminuir muito. O valor desce para 52% quando os estrangeiros chegam do Brasil ou da China, e para 26% se forem de países ocidentais. O que mostra a realidade? Que os cidadãos do Indostão são apenas 9% do total de estrangeiros a viver no país.

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A maioria de inquiridos (cerca de 68%) considera que a política de imigração atualmente em vigor permite uma entrada demasiado facilitada, defendendo ainda que seria mais benéfico para o país uma política que garantisse chegadas mais reguladas (75,8%).

Apesar disto, e face aos inquéritos anteriores, não existe um desejo de diminuição da imigração (com exceção do subcontinente indiano). Aliás, registaram-se menos respostas no sentido de reduzir a imigração do que no passado. Há, porém, uma associação entre imigração e aumento da criminalidade para 67% dos participantes no estudo, e 69% imputam-lhes a culpa da manutenção de salários baixos em Portugal. Uma significativa maioria defende também que devem regressar aos seus países se não tiverem trabalho (78%) ou se cometerem algum tipo de crime (82%).

Mais de metade dos inquiridos (54%) reconhecem que os imigrantes têm condições de vida piores do que as dos portugueses em termos de trabalho e 40,6% consideram que têm menos acesso à habitação. Mas a maior parte não acredita que haja diferença entre nacionais e estrangeiros no acesso a serviços de Saúde, Justiça e Educação.

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Mais à direita, mais oposição

Outra das questões que este barómetro quis compreender é se existe alguma relação entre a posição dos inquiridos no espectro político e as suas opiniões sobre a imigração e os imigrantes. Os resultados indicam uma clara associação. Em concreto, verificou-se que um posicionamento mais à direita está relacionado com uma maior oposição aos imigrantes, sobretudo em relação a originários de países africanos e do subcontinente indiano.

O estudo também permitiu apurar que as pessoas que estão mais satisfeitas com o regime democrático português opõem-se menos à vinda de estrangeiros, defendem políticas de imigração menos rígidas e são defensoras da atribuição de direitos a quem chega. Além disso, quanto melhor o nível de vida do inquirido, mais favorável é o seu posicionamento em relação aos imigrantes.

As conclusões do Barómetro derivam de um inquérito à população, e as perceções aferidas podem ou não coincidir com os números reais. E, neste caso, são muitas vezes díspares da verdade. Por isso, a Fundação optou por incluir no estudo um Retrato Estatístico da Imigração, assente em dados de 2023.

Os números mostram, por exemplo, que Portugal está entre os dez países dos 27 da União Europeia com menor proporção de estrangeiros no total da população residente ou que os imigrantes, com autorização legal de residência, originários do Bangladesh, Nepal e Índia representam apenas 9% do total dos estrangeiros. Em valores absolutos, são cerca de 73 mil pessoas a nível nacional.

No que à criminalidade diz respeito, o número de reclusos de nacionalidade estrangeira manteve-se relativamente estável nos últimos dez anos. Verifica-se até uma diminuição, ainda que ligeira, nos últimos dois anos quando comparados com 2013 e 2014.

Trabalho, Segurança Social e bebés

Em matéria de economia nacional, na agricultura e pescas, 30% dos empregados por conta de outrem são imigrantes. Em atividades ligadas ao turismo, como alojamento e restauração, atingem os 22%. Foram estes trabalhadores estrangeiros que contribuíram, em 2023, com €2677 milhões para a Segurança Social, sendo que as prestações sociais recebidas foram de €484 milhões, totalizando assim um saldo positivo para o país de €2193 milhões, mais 44% face a 2022.

Aliás, os originários da Índia e do Nepal estão no top 5 dos que mais contribuíram para a Segurança Social em 2023. Porém, mais de um em cada quatro imigrantes (26,6%) estão em situação de pobreza ou exclusão social, em comparação com 19,4% dos portugueses.

O impacto da imigração na evolução populacional é também notório. Portugal tem um saldo natural negativo desde 2009, ou seja, morrem mais pessoas do que as que nascem. Desde 2019, o saldo populacional (que inclui nascimentos e mortes, emigrantes e imigrantes) tem sido positivo devido à imigração. Os saldos migratórios quase duplicaram nos 2 últimos anos. Se olharmos do ponto de vista do município, esta realidade ganha ainda mais expressão: 252 municípios têm um saldo populacional positivo (que inclui a imigração), mas só 17 dos 308 apresentam um saldo natural positivo (olhando apenas para os nascimentos). Apesar de os estrangeiros serem cerca 11% da população residente, 22% dos bebés nascidos em Portugal, em 2023, tinham mãe estrangeira.

Em resultado, altera-se também o perfil das crianças inscritas nas escolas. Os alunos estrangeiros aumentaram 160% nos últimos 5 anos.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: RMoleiro@expresso.impresa.pt

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