Perante o anúncio de que a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) emitiu um parecer em que dá conta da obrigação legal de o projeto de ampliação do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, ser sujeito a um processo de avaliação de impacte ambiental (AIA), e de se levantarem vozes contra o risco de atrasos, a Ministra do Ambiente e Energia (MAEN) veio a público dizer que este processo “não vai ser demorado”.
À margem de um outro evento este domingo, Maria da Graça Carvalho disse ter dado indicações à APA para o processo de AIA “ser feito o mais rapidamente possível”, determinando “uma 'task force' acelerada para ver as medidas de mitigação”. Interpreta-se que assumiu indiretamente que a Declaração de Impacte Ambiental (DIA) será “favorável”, com medidas para atenuar os impactos que o aumento do número de aviões têm sobre a saúde das pessoas que vivem, estudam ou trabalham sob o eixo de aterragem e descolagem dos aviões.
As declarações da ministra “surpreenderam” a associação Zero. “Os estudos demoram tempo e são uma obrigação de defender uma decisão e não de a ratificar, e nenhum ministro pode assumir que a DIA será favorável”, frisa o presidente da Zero, Francisco Ferreira, ao Expresso.
Na mesma linha, Acácio Pires, o especialista desta associação nas questões relacionadas com o aeroporto, aguarda “um processo de AIA feito com o maior rigor e com toda a informação necessária disponível para consulta pública” e lembra que “está em causa a saúde de milhares de pessoas”, que vivem sob o eixo de aterragem e descolagem dos aviões em Lisboa e em Loures.
O ambientalista também aconselha “a criação de uma ‘task force’ para acelerar o processo de AIA de relocalização do aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete”, como referido no processo de Avaliação Ambiental Estratégica, conduzido pela Comissão Técnica Independente. O Governo anunciou que os estudos de base só avançam em 2025, apesar de a opção estar na mesa desde maio, a contragosto da concessionária ANA Aeroportos/Vinci.
Questionada pelo Expresso sobre se as suas declarações não pré-determinam as conclusões da avaliação técnica, a ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, procura descartar tal intenção e, em resposta escrita, o seu gabinete refere que, “sendo um processo administrativo, não terá qualquer interferência política” e que “a única indicação dada à APA é que o processo de avaliação seja célere, sem comprometer o rigor que se exige”.
Quanto às questões relacionadas com o facto de a ANA/Vinci Aeroportos não ter cumprido os compromissos de insonorização das casas de habitação afetadas pelo ruído dos aviões que aterram e descolam do AHD em Lisboa, que constam do Plano de Ação 2018-2023, e que sanções terá a empresa sofrido; ou sobre que “medidas de mitigação” equaciona o MAEN perante os impactes de ambientais de mais aviões a aterrar e descolar de Lisboa, o Expresso não obteve resposta.
Um avião a cada minuto
“Uma vez que o anterior Plano de Ação do Ruído do aeroporto não foi cumprido, esperemos que a APA obtenha mais garantias relativamente ao plano em avaliação”, aponta Acácio Pires.
A Zero quer que o processo de AIA tenha em conta não só as obras que agora começaram, como as que foram feitas desde 2015. Há uma década registavam-se 180 mil voos por ano no AHD e hoje em dia registam-se mais 40 mil voos (passou para 220 mil voos por ano), o que significa, segundo Acácio Pires, “mais 109 voos por dia e mais seis voos por hora”.
Com as obras de aumento de capacidade anunciadas, o objetivo é também fazer crescer de 38 para 45 os voos diários no aeroporto de Lisboa, o que fará com que haja um avião a descolar ou a aterrar a cada menos de um minuto. Atualmente a média ronda os dois minutos.
Recorde-se que um parecer emitido em janeiro pela Agência Portuguesa do Ambiente já tinha informado a ANA Aeroportos de que só estaria dispensada de um processo de AIA se as obras de aumento de capacidade previstas no aeroporto não implicassem um aumento de voos. Também advertiu que, verificando-se “a alteração de qualquer circunstância que possa determinar impactes negativos, incluindo o aumento do número de voos, devem ser espoletados os procedimentos necessários no âmbito do regime jurídico de AIA”.
Apesar de ter conhecimento desta condição, o Governo aprovou uma resolução a 27 de maio, indicando ser “prioritário assegurar os investimentos necessários no AHD que permitam atingir um volume de tráfego anual de 40-45 milhões de passageiros e um aumento do número de movimentos por hora, até 45”, sem qualquer referência a estudos de impacte ambiental.
Apenas determinou então a criação de um “grupo de acompanhamento”, que o gabinete do ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, considerou então “devidamente habilitado para avaliar e determinar se é aplicável o regime de AIA ao abrigo do qual devem decorrer as obras de expansão do AHD”. Do grupo citado no despacho constavam representantes da ANA, da ANAC e da NAV, mas não da APA, posteriormente incluída.
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