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Ensino em Portugal. Metade dos alunos com dificuldades nas tarefas mais elementares

Ensino em Portugal. Metade dos alunos com dificuldades nas tarefas mais elementares
FERNANDO VELUDO/LUSA

Ministério da Educação apresentou resultados dos testes de diagnóstico realizados por estudantes do 3.º, 6.º e 9.º anos. Grupo de trabalho vai apresentar recomendações para a recuperação das aprendizagens afetadas por meses de ensino à distância

Ensino em Portugal. Metade dos alunos com dificuldades nas tarefas mais elementares

Isabel Leiria

Jornalista

Com dois anos letivos já condicionados pela pandemia e meses de ensino à distância – todo o 3.º período de 2019/20 no caso dos alunos do ensino básico -, o Ministério da Educação quis avaliar o “atual estado das aprendizagens” através de testes de diagnóstico aplicados uma amostra de estudantes do 3.º, 6.º e 9.º anos. E os resultados obtidos demonstram já algum impacto das perturbações.

“Há dificuldades já antes identificadas nomeadamente na resolução dos problemas de níveis de complexidade mais elevada, mas temos também uma percentagem muito grande de alunos que não consegue ser bem sucedida nos itens mais simples”, reconheceu o secretário de Estado da Educação, João Costa.

Os testes, realizados em janeiro numa amostra representativa de escolas (públicas e privadas, de todas as regiões do país), eram compostos por tarefas que remetiam para competências de literacia científica, matemática e de comunicação e informação. As dificuldades "rondam os 50% logo a partir das tarefas de nível 1 de dificuldade”, exemplificou João Costa, defendendo a necessidade de intervenção. “Estas dificuldades não podem ser ignoradas e vão obrigar a um trabalho específico nas escolas”, declarou ainda.

Por exemplo, num exercício de nível 1 em que se pedia aos alunos do 3.º ano para indicarem num mapa a localização de um parque situado no litoral e no sul de Portugal continental (nesse mapa estavam assinalados apenas três pontos), apenas 47% acertaram.

Mas além do trabalho que os professores poderão fazer com os seus alunos a partir desta avaliação, o secretário de Estado também anunciou a nomeação de um grupo de trabalho composto por peritos e especialistas de diferentes áreas, como Margarida Gaspar de Matos, da Faculdade de Motricidade Humana, a professora da Faculdade de Economia da Nova Susana Peralta, a vice-presidente da Ordem dos Psicólogos Sofia Ramalho, diretores de agrupamentos ou ainda José Verdasca, coordenador do Plano Nacional para a Promissão do Sucesso Escolar.

Este grupo de trabalho deverá apresentar as suas propostas para a recuperação de aprendizagens perdidas até ao final de abril. Mas as recomendações não serão vinculativas, frisou João Costa.

Maiores dificuldades no 6.º ano

Quanto às dificuldades demonstradas pelos alunos do ensino básico nestes testes - desenvolvidos pelo Instituto de Avaliação Educativa (IAVE) e aplicados pela primeira vez de forma exclusivamente eletrónica – os resultados deixam evidentes as “grandes dificuldades dos alunos em resolver problemas que requerem a mobilização de atividades mais complexas” e mostraram ainda que os alunos do 6.º ano tiveram desempenhos genericamente piores que os colegas do 3.º e do 9.º anos.

Na literacia da leitura e da informação, por exemplo, 58% dos alunos do 6.º ano não conseguiram responder ou apenas completaram até um terço das atividades inseridas no nível 1 de proficiência. Os exercícios deste nível implicam apenas “identificar informação explícita no texto e identificar o assunto”. A percentagem para os colegas do 9.º ano foi de 53% e do 3.º ano de 49%.

No caso da literacia matemática, foram os alunos do 9.º ano que apresentaram mais dificuldades, com 60% a não responder ou a resolver com sucesso apenas um terço das atividades de nível 1. No 6.º ano, aconteceu com 56% e no 3.º ano o valor cai para 38%.

Já em relação aos exercícios mais complexos, de nível 4, apenas 3,5% dos alunos do 9.º ano responderam com sucesso à totalidade da tarefa, o mesmo acontecendo com 2,4% dos estudantes do 6.º ano e 5% do 3.º, ou seja, percentagens muito baixas.

Na literacia científica repetem-se os problemas: mais de metade dos alunos do 6.º e 9.º anos ficam-se por resoluções muito parciais ou incapacidade total de executar as tarefas mais elementares e apenas 4% e 2%, respetivamente são inteiramente bem sucedidos nas mais complexas.

Saudades do desporto, falta de um sítio sossegado para estudar, apoio dos professores

Apesar de todas estas dificuldades, que correm o risco de ser agravadas este ano letivo com mais uma paragem superior a dois meses do ensino presencial, a esmagadora maioria (mais de 90%) dos alunos do 3.º ano inquiridos disseram ter sido fácil usar o computador para fazer os trabalhos da escola e que foi fácil aprenderem sozinhos.

Mais complicado foi arranjar um local sossegado para estudar (indicado por 20% das crianças do 3.º ano) e ter acesso a um computador, tablet ou telemóvel (17%); encontrar motivação para fazer as atividades das escolas (33% dos alunos do 9.º ano e 22% do 6.º) ou em compreender as mesmas (20%).

Quanto ao que sentiram mais falta durante o confinamento, quase todos indicaram a falta de desporto e de outras atividades físicas organizadas pela escola.

Do lado positivo, os alunos destacaram a disponibilidade dos professores para os ajudar (percentagens de resposta próximas dos 90%).

Com o cancelamento das provas de aferição e dos exames do 9.º ano também este ano letivo, o Ministério da Educação já anunciou que estes testes serão realizados por uma amostra de alunos para que este diagnóstico das falhas decorrentes do fecho de escolas possa continuar a ser feito.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: ILeiria@expresso.impresa.pt

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