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“O que significa ser íntimo com alguém depois de uma relação monógama tão longa?”, pergunta Sarah Jessica Parker

“O que significa ser íntimo com alguém depois de uma relação monógama tão longa?”, pergunta Sarah Jessica Parker

Sarah Jessica Parker fala ao Expresso sobre a segunda temporada de “And Just Like That...”, pequeno vislumbre para a vida interior de uma mulher na casa dos 50 anos, esteja ela à procura de amor, companhia, sexo ou dela própria. Os dois primeiros episódios chegam à HBO esta quinta-feira

Agora sim, elas estão de volta. Depois da enorme confusão que foi a temporada de estreia de “And Just Like That...”, Carrie, Miranda e Charlotte e as novas amigas regressam à segunda temporada de uma série que demorou a encontrar o pé, mas encontrou-o, que se afastou tanto do cânone original que mudou de nome, mas que neste momento, tendo visto sete dos 11 novos episódios, nos leva a concordar com a Carrie — isto é, com Sarah Jessica Parker — quando nos diz que “esta temporada já sabe, cheira e se parece com ‘O Sexo e a Cidade’”.

Talvez não houvesse outra forma. Quando “And Just Like That...” se estreou, em dezembro de 2021, havia alguns nós complicados por desatar. Para começar, a série teve de processar a perda de personagens fulcrais. Desde a bombástica Samantha, de Kim Cattrall, que se recusou a regressar (embora apareça brevemente nesta temporada), passando pela morte súbita de Mr. Big logo no início — e, no rescaldo de acusações de assédio sexual contra o ator que lhe dá corpo, Chris Noth, os flashbacks que prometiam mantê-lo vivo ao longo dessa temporada foram retirados da versão final. O ator Willie Garson, que interpretava Stanford, melhor amigo e confidente de Carrie, faleceu no decorrer das filmagens, o que, juntamente com o cancelamento de Noth, obrigou a cambalhotas narrativas para manter alguma coesão (nem sempre alcançada).

“Não é a mesma série. Tem um ADN familiar, mas com novos elementos. Os escritores fartam-se de usar as mesmas personagens em livros diferentes, e eu achei que poderíamos fazer o mesmo”, disse ao Expresso, em 2021, Michael Patrick King, argumentista principal e produtor de “O Sexo e a Cidade” desde a segunda temporada. Os novos elementos fizeram crescer o círculo de amigas. Já não seguimos apenas Carrie (Sarah Jessica Parker), Miranda (Cynthia Nixon) e Charlotte (Kristin Davis). Agora também há Che (Sara Ramirez), Seema (Sarita Choudhury), Lisa (Nicole Ari Parker) e Naya (Karen Pittman). Os cínicos dirão que estas personagens desempenharam a função utilitária de trazer à série algo que sempre lhe faltou: diversidade, inclusividade, representatividade. Em relação à primeira temporada, talvez não estejam errados. Em relação à segunda, cujos dois primeiros episódios estarão disponíveis na HBO Max a partir desta quinta-feira, 22 de junho, os cínicos terão de ver para crer, porque tudo mudou (e para melhor).

“Desde o primeiro minuto em que o Michael Patrick [King] começou a falar em voltarmos, creio que em finais de março de 2020, sempre pensámos em aumentar a tez da série”, diz Sarah Jessica Parker ao Expresso. “Tínhamos noção que a série original era muito” — faz uma pequena pausa à procura da palavra certa — “branca”.

“Desde que Michael Patrick [King] começou a falar em voltarmos, sempre pensámos em aumentar a tez da série. Tínhamos noção que a série original era muito branca”
Sarah Jessica Parker, atriz

Por esse motivo a temporada anterior chegou a parecer panfletária, com narrativas construídas à volta de causas identitárias — Miranda tem um caso extraconjugal com uma pessoa não-binária (Che); a filha adolescente de Charlotte assume-se de género fluido; Seema é a agente imobiliária de Carrie mas é, sobretudo, asiática; Lisa e Naya são as novas amigas afro-americanas das protagonistas. Enquanto isso, Carrie fazia o luto do marido e o da perda dos amigos Samantha e Stanford (resolvidas, no guião, com bilhetes de avião só de dia para Londres e Tóquio).

“A perda de Big ditou um tom para a primeira temporada ao qual seria difícil escapar — caso houvesse a tentação de fugir, que não houve, nem deveria, pois o luto merece tempo”, diz Sarah, que recentemente perdeu o padrasto. “Já nesta temporada, é natural e normal que queiramos voltar a encontrar alegria. Vejo como a minha mãe tem tido problemas em fazer sentido de tudo. Tem sido supernobre a navegar esta perda, há momentos que são dolorosos, o que não significa que não haja dias de alegria.”

Cynthia Nixon e Sara Ramirez na segunda temporada de "And Just Like That..."
Craig Blankenhorn

Encontraram-na, a alegria, e com ela a perceção da primeira temporada mudou. O que parecia um barco à deriva revela-se agora uma ponte muito necessária entre o último episódio exibido em fevereiro de 2004 e o espírito do tempo da década de 2020. “Senti-o desde o primeiro minuto, mas só quando chegámos ao terceiro episódio é que pensei: ‘Oh, mas isto sabe, cheira e parece-me familiar. Quando permitirmos à alegria reaparecer, somos de imediato lembrados do passado destas personagens.”

A solteira e a cidade

Carrie é novamente solteira numa cidade que adora e da qual sempre dependeu. “É muito interessante e muito diferente”, considera Parker. “Não apenas por causa da idade, embora isso também traga questões, como, por exemplo, o que é que ela quer? Quão importante é ter uma relação romântica? E quão importante é ter companhia? O que é preciso para se sustentar e manter a vida interessante, e como é que encontra desprezo e alegria?”, questiona. “Mas também, sabes, não é só a nossa idade, também a cidade mudou e também o modo como agora se conhecem pessoas novas e possíveis interesses românticos mudou.”

“Não é só a nossa idade, também a cidade e o modo como agora se conhecem pessoas novas e possíveis interesses românticos mudou. Acho que a Carrie sente que tudo é possível, mas também que tudo é diferente”
Sarah Jessica Parker, atriz

Elas continuam à procura de amor, mas encontrar o “homem certo” deixou de ser o ponto central da série, pelo menos não como o era há 25 anos. “A questão”, coloca Parker, “é o que é que queres? Como preferes passar o tempo? Hoje podes escolher mais do que antes. Acho que a Carrie sente que tudo é possível, mas também que tudo é diferente. Se calhar é radical dizer que já não se precisa de nada disso. E isto não é um ponto de chegada, antes um ponto de partida para encontrar a resposta.”

As interrogações de Sarah Jessica Parker — que na conversa por videoconferência falou com a mesma cadência e tom da sua personagem de sempre, como se do outro lado do ecrã estivesse a própria Carrie — não se ficaram por aí. “O que significa ser íntimo com alguém depois de se ter estado numa relação monógama durante tanto tempo?”, continuou. “Toda a gente parece estar a perguntar isso nesta temporada.”

Nicole Ari Parker, Sarah Jessica Parker, Kristin Davis e Karen Pittman, em cena na série "And Just Like That..."

Passaram-se 25 anos desde que a criação de Darren Star, baseada no livro homónimo de Candace Bushnell, chegou ao pequeno ecrã. Estávamos em 1998 e “O Sexo e a Cidade” era então uma série inovadora, com um olhar divertido e inteligente sobre a amizade entre quatro mulheres solteiras, as suas aventuras e desventuras românticas em Nova Iorque e aquilo que queriam da vida. Na base do sucesso esteve a forma desavergonhada, provocante para a época, muitas vezes engraçada, por vezes hilariante, como conversavam sobre sexo enquanto bebiam cocktails ou pediam o brunch — quantas vezes almejando o dois em um, como quando Samantha comentou o sémen com sabor estranho de um novo parceiro romântico. Desta combinação vencedora resultaram seis temporadas, sete prémios Emmy e duas incursões pelo grande ecrã (ainda que pouco recomendáveis).

Provando que há coisas que não mudam, esta temporada de “And Just Like That...” volta a fazer do esperma tema de conversa. Ou melhor, da sua ausência num orgasmo de Harry com Charlotte. As piadas de balneário que se sucedem em rajada lembram-nos que o melhor de “O Sexo e a Cidade” foi sempre isto: diálogos acutilantes, respostas rápidas e muito humor a imiscuir-se entre os dramas das personagens, agora com um grupo de amigas mais alargado.

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