"Playtime": o filme que Jacques Tati transformou num sublime hino ao design

A arquitectura e o design ganham novos sentidos depois de vermos este filme
A arquitectura e o design ganham novos sentidos depois de vermos este filme
Especialista em design
Se há um filme que todos os estudantes de arquitectura e design vêem, é este. “Playtime”, de 1967, é uma obra-prima do realizador francês Jacques Tati e, de muitas formas, uma visão incontornável sobre a nossa relação com o mundo artificial que construímos, habitamos e consumimos. Mesmo para quem não venha destas áreas é imperdível — um filme onde o sentido de humor, a estética e a inteligência, bem com um aparente nonsense, são um deleite para qualquer espectador. Vi-o inúmeras vezes no cinema e tive a oportunidade de o rever esta semana que passou na televisão.
Podemos dizer que a história quase não conta, ou melhor, que não há história além de uma série de encontros numa cidade idealizada, que é no entanto, sobre uma cidade existente, Paris. O próprio Tati nos diz que a arquitectura e o cenário são as “verdadeiras estrelas” do filme, que realizou após ter ganho em 1958 o Óscar para melhor filme estrangeiro com “Mon Oncle”, outra obra-prima. E essa afirmação descreve de facto o que vemos em “Playtime” desde o primeiro momento, nas primeiras cenas, intenção que nunca é abandonada ao longo do filme. Não só os cenários foram desenhados e produzidos de uma forma única — Tati constrói uma espécie de cidade falsa nos arredores de Paris para filmar, com estradas públicas, iluminação, uma mini-cidade que ficou conhecida como Tativille — como sentimos que são eles, paredes, corredores, salas, cadeiras, escadas, objectos, que determinam a movimentação e comportamento dos actores e da narrativa. Do mesmo modo a paleta cromática e o sound design têm um papel raro e profundamente inovador, com um detalhe e preciosismo enormes, acrescentando que raramente entendemos o que os actores dizem, Tati não nos deixa perceber e, de facto, isso seria irrelevante. Somos pois seduzidos a entrar num mundo visual e sonoro, quase sem palavras, mundo que é ele próprio o protagonista e onde nos sentimos deslumbrados pelas pequenas ironias e reflexões que Tati nos vai permitindo fazer sobre tudo o que nos mostra nesta obra. A arquitectura e o design ganham novos sentidos depois de vermos este filme.
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