O problema da habitação pode ser “transversal" aos países da União Europeia, mas Portugal não está exatamente em pé de igualdade com os restantes países pelo menos num ponto. “O problema é exatamente igual aqui na Europa, nós só comparamos mal quando olhamos para o parque público de habitação: somos dos países com o menor parque público”, admitiu este sábado a ministra da Habitação, Marina Gonçalves, num painel sobre o tema na Academia Socialista, que decorre em Évora, defendendo que, mesmo nos países onde o parque habitacional público é significativamente maior, a resposta para o problema não é óbvia nem imediata.
Depois de o governo português ter enviado uma carta à presidente da Comissão Europeia com aquilo que entende que devem ser as prioridades da Europa para o próximo ano - pondo o problema da habitação acessível à cabeça -, a ministra defendeu perante os jovens socialistas que a discussão, de facto, não se faz só em Portugal e que, de resto, as muito criticadas medidas inseridas no pacote Mais Habitação não são sequer “pioneiras”, estando a ser testadas lá fora.
“Tivemos uma resposta menor [em termos de parque público] por isso temos hoje mais dificuldades em responder ao desafio”, admitiu, acrescentando que, apesar disso, nem os países com maior parque habitacional público se livram do problema, que é mais complexo do que isso, devido ao turismo e a outros condicionantes. “Os Países Baixos têm um parque habitacional público enorme comparado com o nosso, mas reuni com o meu homólogo e percebi que partilhamos exatamente o mesmo problema, porque não há uma bala de prata. Temos de encontrar é varios instrumentos”, disse, quando questionada pelos jovens socialistas sobre qual o instrumento mais importante no pacote legislativo.
Não se consegue identificar um de forma isolada - nem sequer o parque habitacional público é a bala de prata, disse. Para a ministra, a lógica das medidas legislativas que foram chumbadas por Marcelo Rebelo de Sousa, mas que o PS vai reconfirmar no Parlamento obrigando à promulgação, é uma lógica “muito conjuntural e imediata”, que visa encontrar respostas mais rápidas para um problema que demora muito tempo a ser resolvido. “São medidas necessárias no curto prazo para que a política estrutural que está em curso faça o seu caminho”, disse.
Depois de um debate legislativo muito duro, com críticas à esquerda e à direita sobre o excesso de intervenção do Estado no mercado, ou o excesso de restrições ao Alojamento Local e iniciativa privada, Marina Gonçalves afirmou que a chave está no “equilíbrio”. “Não podemos discutir habitação sem ver como ela convive de forma sã com o turismo. Por isso é que fomos adaptando e equilibrando a proposta para haver esta sã convivência”, disse, admitindo no entanto as dificuldades num debate de posições extremadas.
Num painel partilhado com a presidente da câmara municipal da Amadora, Carla Tavares, e moderado pelo eurodeputado Pedro Marques, Marina Gonçalves defendeu o “equilíbrio” das propostas apresentadas (apesar de admitir que o debate se tornou “difícil” devido ao extremar de posições sobre o tema) e admitiu que o problema não se resolve de um dia para o outro porque requer ação em vários tabuleiros.
“Devemos abandonar a política só porque demora mais tempo? Não. Temos de inventariar o património do Estado e trabalhar com os municípios, em rede. Esse inventário existe, está a ser permanentemente atualizado, e muitas das respostas que temos tido já são nesse sentido”, disse, dando o exemplo de um antigo centro de saúde na Amadora que está a ser reabilitado para habitação, e cuja obra foi visitada ha uma semana pela ministra.
Em jeito de balanço, e depois de António Costa ter dito esta semana, também em Évora, que o Governo não iria desistir das políticas de habitação, dizendo que estavam em marcha 17 mil das 26 mil casas públicas de renda acessível prometidas para a legislatura, Marina Gonçalves admitiu que há apoios mais indiretos e outros mais diretos, enumerando os apoios de subsídio à renda que chegam hoje a 185 mil famílias, o alargamento do programa Porta65 que também chegou este ano a um grupo maior de jovens e famílias, ou os benefícios fiscais aos proprietários que colocam os seus imóveis no mercado de arrendamento. Esse é o equilíbrio, disse: “dar confiança ao mercado e responder às famílias”. Sem balas de prata.
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