"É só corrigir uma palavra". PS, BE, IL, Livre e PAN prometem corrigir lei da eutanásia, PSD e Chega insistem no referendo
Isabel Moreira, deputada do PS que está a trabalhar num texto que junte os projetos de lei sobre eutanásia
ANTÓNIO PEDRO SANTOS
Socialistas, liberais e bloquistas aplaudem o facto de o TC não ter dado gás às dúvidas do Presidente da República e mostram-se optimistas quanto à correção cirúrgica do texto. O objetivo é que volte a ser novamente aprovado no Parlamento. Com processo legislativo a voltar à base, PSD e Chega voltam à carga com referendo. PAN rejeita a proposta da direita.
Em reação a mais um chumbo do Tribunal Constitucional à lei da despenalização da morte medicamente assistida, os partidos que trabalharam na redação da lei congratulam-se por as dúvidas do Presidente da República não terem “vingado” e por a dúvida dos juízes que fundamenta o chumbo se cingir à clarificação de “uma palavra”. E se assim é, o problema é de fácil resolução, entendem os deputados do PS e da Iniciativa Liberal.
“É uma questão de uma palavra: onde se define sofrimento de grande intensidade, nós dizemos que se trata de sofrimento físico, psicológico e espiritual, e o TC quer perceber se as palavras são cumulativas ou alternativas”, explica a deputada socialista Isabel Moreira em reação aos jornalistas no parlamento, deixando claro que se o legislador escreve “e”, em vez de “ou”, é porque não basta que o sofrimento seja espiritual ou apenas físico para aplicar a lei, tendo os termos de ser cumulativos. “'E' significa ‘e’, não significa 'ou”, atirou a deputada.
Para Isabel Moreira, trata-se de uma “grande vitória” o facto de os juízes do TC não terem atendido à argumentação do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que tinha pedido a fiscalização da constitucionalidade da lei invocando dúvidas sobre o facto de ter caído o termo “doença fatal” e sobre a antecipação da morte sem que a morte esteja necessariamente iminente.
Para a deputada socialista, que ainda irá avaliar com atenção o acórdão do TC e as respetivas declarações de voto, outra ‘boa notícia’ é o facto de a lei ter sido declarada inconstitucional apenas “por um voto” ("foram sete votos contra seis"). Tudo sinais de que, se não foi desta, para a próxima é que é. “Se é uma questão de corrigirmos uma palavra, é o que faremos de seguida”, disse.
O mesmo disse João Cotrim de Figueiredo, deixando claro que “na cabeça do legislador” sempre foi claro o que queriam dizer com a definição de sofrimento de grande intensidade, sendo cumulativas as várias camadas de sofrimento (físico, psicológico e espiritual).Perante a dúvida do TC, os liberais estão dispostos a corrigir. "Será desta que podemos ter [eutanásia] em Portugal", disse João Cotrim de Figueiredo no Parlamento. O diploma foi devolvido esta segunda-feira ao Parlamento depois do chumbo dos juízes, tendo agora de voltar ao início o processo legislativo.
Pelo PSD e pelo Chega, tanto Joaquim Miranda Sarmento como André Ventura apressaram-se a reafirmar a vontade de que seja convocado um referendo à eutanásia. “O processo terá de ser reiniciado na Assembleia da República e deve ser feito de forma clara e o mais consensual possível. Este processo só se resolve com um referendo”, disse Ventura, questionando: “De que é que tem medo a esquerda?".
O mesmo disse o líder parlamentar do PSD: “O PSD lamenta que o país não tenha tido ainda a possibilidade de ser auscultado. Iremos, assim que possível, voltar a pedir a realização de um referendo”.
A partir de Beja, onde arrancaram esta segunda-feira as jornadas parlamentares do PCP, António Filipe reage à decisão do TC defendendo que esta deve ser “respeitada” o que implica o “veto” por parte do Presidente da República. O partido que votou contra o diploma, juntamente com o Chega, defende que nunca colocou a questão da eutanásia “nestes termos”. Para o PCP a prioridade está no “reforço do SNS”, nomeadamente, ao nível dos “cuidados paliativos” para ser possível “evitar o sofrimento das pessoas”. Quanto à formulação da lei, António Filipe recomenda que os proponentes avancem com uma “reflexão” sobre a “complexidade” e as “preocupações” que levaram à decisão de inconstitucionalidade por parte do TC. Contudo, descarta qualquer “incompetência” por parte dos partidos que elaboraram a lei.
Já o Bloco de Esquerda, na voz de José Manuel Pureza, espera que esta seja a “a última reapreciação” do diploma e que, com as alterações na “forma como é previsto o sofrimento”, o problema seja “resolvido”. “É uma pequena questão que pode facilmente ser corrigida pelo parlamento”. O bloquista defende que a lei exigiu um “trabalho jurídico rigoroso” reconhecido pelo TC e que apenas precisa de um “pequeno aperfeiçoamento”. “O TC refere-se apenas a um aspeto de uma alínea de um artigo, isso mostra que reconhece que se trata de uma lei dotada de todas as condições que precisa deste pequeno aperfeiçoamento que será feito”. José Manuel Pureza acredita que o “país quer esta lei” e, por isso, o partido continuará a empenhar-se para entregar “a melhor lei possível”. Ainda assim, o deputado do BE defende que a interpretação do TC em relação à lei é “surpreende” e foi tomada por uma “maioria escassíssima”. Agora, o partido alerta para a necessidade de ter acesso a “todo o acórdão”, e não apenas ao comunicado, para “analisar as coisas” com “clareza” e “rigor”.
Inês Sousa Real, deputada única do PAN, pediu que o processo avance de “forma célere” depois de se “limar” as “preocupações” do TC. “Esperamos que o processo [de reformulação do diploma] se cinja única e exclusivamente aos aspetos apontados pelo TC”. A deputada aproveitou ainda as declarações para rejeitar a ideia da realização de um referendo à eutanásia, proposta pelo PSD e Chega. “Este processo foi dos mais participados em várias legislaturas, quer do ponto de vista de auscultação de vários especialistas quer da sociedade civil”, defendeu.
Também o Livre, através do membro de contacto Pedro Muacho, pediu para que “rapidamente” seja aprovada no parlamento uma “nova versão” do diploma da eutanásia que “esclareça as dúvidas que o TC levantou”. Em declarações aos jornalistas, Pedro Muacho defendeu tratar-se de uma “questão de clareza” – relacionada com a definição de sofrimento – e que também o seu partido, que votou favoravelmente, se empenhará em “esclarecer todas as dúvidas” para que a nova formulação seja dotada de “certeza jurídica” e não crie “qualquer tipo de insegurança nas pessoas quanto à legislação e sua aplicabilidade”.
Assine e junte-se ao novo fórum de comentários
Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes