Pedro Nuno Santos apresentou demissão e António Costa aceitou
Em julho, Pedro Nuno Santos assumiu as responsabilidades por “falhas” na gestão política do dossier da localização do aeroporto
Ministro das Infraestruturas admite que sabia do acordo de rescisão de Alexandra Reis com a TAP, mas nada diz sobre se sabia do montante da indemnização. Pedro Nuno Santos chuta culpa material para secretário de Estado e demite-se assumindo “responsabilidade política”. Costa aceitou. Quer tenha sido “por ação ou omissão”, ministro estava envolvido
Pedro Nuno Santos apresentou a sua demissão a António Costa na sequência do caso que levou à demissão da secretária de Estado do Tesouro, Alexandra Reis. O primeiro-ministro já aceitou a demissão, agradecendo a dedicação do ministro nos últimos 7 anos em que exerceu funções governativas.
A demissão de Pedro Nuno Santos acontece depois de o Presidente da República e do primeiro-ministro terem pressionado os dois ministros com responsabilidades na TAP a explicarem se sabiam ou não do acordo de rescisão e da indemnização da ex-administradora da TAP. Na nota enviada à comunicação social, o gabinete de Pedro Nuno Santos explica que apresentou a sua demissão por entender ter “responsabilidade política” no caso, embora responsabilize o secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, por não ter identificado incompatibilidades no processo.
“Face à perceção pública e ao sentimento coletivo gerados em torno deste caso, o ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, entende, neste contexto, assumir a responsabilidade política e apresentou a sua demissão ao primeiro-ministro”, justifica.
As explicações de Pedro Nuno Santos, que enquanto ministro das Infraestruturas tinha a tutela da TAP, acontecem depois de Fernando Medina, que tem a tutela financeira da companhia aérea, já ter garantido à RTP que “não sabia” da indemnização de 500 mil euros dada à ex-administradora da no momento da rescisão. Marcelo Rebelo de Sousa chegou a comentar essas declarações de Medina, sublinhando não ter razões para duvidar da veracidade das informações dadas pelos ministros. Nessa altura, Pedro Nuno Santos ainda estava em silêncio - não se tendo, até agora, pronunciado sobre o caso.
Pedro Nuno remete para secretário de Estado que não viu “incompatibilidades”
Na nota enviada aos jornalistas a explicar os motivos da demissão, o gabinete de Pedro Nuno Santos explica que o acordo de rescisão da TAP com Alexandra Reis, em fevereiro de 2022, foi comunicado ao secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes, que “não viu incompatibilidades entre o mandato inicial dado ao Conselho de Administração da TAP e a solução encontrada” - de rescisão com Alexandra Reis. Hugo Mendes apresentou a demissão ao ministro e só depois disso, lê-se no comunicado, Pedro Nuno Santos entendeu demitir-se.
Pedro Nuno Santos diz, assim, que sabia do acordo de rescisão mas nada diz sobre se sabia do montante da indemnização e dos termos negociados. No comunicado, o ministro confirma a tese de que a saída de Alexandra Reis se deveu a “manifesta incompatibilização, irreconciliável” da gestora com a presidente do Conselho de Administração da TAP, e confirma dessa forma que o pedido de autorização para o afastamento de Alexandra Reis foi feito ao Ministério das Infraestruturas quando o acionista privado Humberto Pedrosa (que tinha nomeado Alexandra Reis em primeiro lugar) saiu da companhia aérea.
“No seguimento da alteração acionista da TAP S.A. e da TAP SGPS que resultou na saída do acionista privado Humberto Pedrosa, a CEO da TAP solicitou a autorização do Ministério das Infraestruturas e da Habitação para proceder à substituição da administradora indicada pelo acionista privado por manifesta incompatibilização, irreconciliável, entre a CEO e a vogal do Conselho de Administração”, lê-se.
Mais: “Todo o processo foi acompanhado pelos serviços jurídicos da TAP e por uma sociedade de advogados externa à empresa, contratada para prestar assessoria nestes processos, não tendo sido remetida qualquer informação sobre a existência de dúvidas jurídicas em torno do acordo que estava a ser celebrado, nem de outras alternativas possíveis ao pagamento da indemnização que estava em causa”.
Ora, Hugo Mendes é o mesmo secretário de Estado que também assinou o polémico despacho sobre o aeroporto que António Costa obrigou Pedro Nuno a revogar. E, de acordo com o comunicado desta noite, quem se demitiu primeiro no ministério foi Hugo Mendes. “No seguimento das explicações dadas pela TAP, que levaram o Ministro das Infraestruturas e da Habitação e o Ministro das Finanças a enviar o processo à consideração da CMVM e da IGF, o secretário de Estado das Infraestruturas entendeu, face às circunstâncias, apresentar a sua demissão”, lê-se.
Ainda assim, mesmo sem terem sido levantadas dúvidas jurídicas sobre o acordo, o gabinete de Pedro Nuno Santos afirma que, “tendo o ministro tido agora conhecimento dos termos do acordo”, entendeu ter “responsabilidade política” e, assim sendo, apresentou a demissão. Em nenhum momento do comunicado, no entanto, Pedro Nuno Santos diz, claramente, se sabia ou não da indemnização da TAP a Alexandra Reis ou faz qualquer referência à sua escolha para a NAV semanas depois da saída da transportadora aérea.
Ao que o Expresso apurou, a situação de Pedro Nuno Santos neste caso esteve sempre por um fio. O primeiro-ministro deu tempo e oportunidade aos dois ministros com responsabilidades no tema para explicarem o seu maior ou menor envolvimento no caso, estando ciente de que “não é possível um administrador sair do Conselho de Administração de uma empresa como a TAP sem o conhecimento da Assembleia Geral”, onde está representado o accionista Estado.
Assim sendo, seja “por ação ou por omissão”, o ministro que tinha sido informado daquele acordo teria sempre responsabilidade na matéria - tal é a sensibilidade do tema. Isto porque, mais do que uma questão legal ou jurídica, o problema é de perceção política uma vez que a TAP estava numa situação financeira frágil a braços com um processo de reestruturação quando a indemnização de meio milhão de euros foi concedida.
Na nota em que dá conta de que aceita a demissão, António Costa agradece “a dedicação e empenho com que [Pedro Nuno Santos] exerceu funções governativas ao longo destes 7 anos, quer nas áreas da sua direta responsabilidade, quer na definição da orientação política geral do Governo”. E destaca especialmente o contributo de Pedro Nuno Santos no tempo da geringonça para a “criação de condições de estabilidade política enquanto secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares e a energia com que assumiu as suas atuais funções, nomeadamente nas políticas ferroviária e da habitação”.
“Do ponto de vista pessoal relevo com muita estima a camaradagem destes anos de trabalho em conjunto”, lê-se ainda, com Costa a pôr assim um ponto final na tensa relação que tinha vindo a construir com o ministro das Infraestruturas e conhecido pretendente ao título de sucessor na liderança do PS.
A demissão acontece, assim, à boleia do caso da indemnização concedida à ex-administradora da TAP que tinha sido, há menos de um mês, nomeada secretária de Estado do Tesouro, mas acabou por ser a gota de água depois do polémico episódio da decisão sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa, que já tinha deixado Pedro Nuno Santos fragilizado.
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