A próxima revolução tecnológica: “O computador quântico, em vez de demorar a idade do Universo a quebrar a cifra, se calhar demora um dia”
Yasser Omar, professor do Instituto Superior Técnico, explica as questões mais elementares da física quântica e o impacto de uma revolução tecnológica que já começou a produzir efeitos na geopolítica mundial, com a restrição da exportação de processadores. De súbito, é toda a Internet que está em causa, pois a cifra que a protege possivelmente não resistirá ao poder da quântica. “Para as agências de segurança e de soberania este é um período de maior ansiedade porque têm que encontrar outras soluções”, afirma Yasser Omar. Oiça aqui o podcast Futuro do Futuro
Yasser Omar, professor do Instituto Superior Técnico e presidente do Instituto Quântico Português, compara a computação quântica aos primórdios da computação convencional no século passado
NUNO FOX
Há mais de 20 anos que Yasser Omar, professor do Instituto Superior Técnico, de Lisboa, e presidente do Instituto Quântico Português, estuda o comportamento das partículas mais ínfimas com o propósito de antecipar uma das maiores revoluções das tecnologias. Se na física de Newton, que rege quase todas as coisas visíveis, um gato não pode estar vivo e morto ao mesmo tempo, e uma lâmpada não pode estar ligada e desligada em simultâneo, na física quântica, que tenta descrever os comportamentos de átomos e partículas subatómicas, esse tipo de estados aparentemente contraditórios é plausível – e promete uma capacidade de processamento sem precedentes, que já pôs de sobreaviso governos de vários países que receiam que a cifra que hoje protege computadores e Internet mundial.
“A segurança é baseada na lentidão dos computadores. Se agora aparece um novo paradigma de computador, como o computador quântico, isso está em risco”, responde o professor do Técnico em entrevista para o podcast Futuro do Futuro.
NUNO FOX
“Está demonstrado matematicamente, o computador quântico, em vez de demorar a idade do universo a quebrar a cifra, se calhar demora um dia ou dois”, acrescenta o cientista quântico, que se formou entre Técnico e Universidade de Oxford.
Perante a inevitabilidade de um dia um computador quântico conseguir quebrar a denominada encriptação de toda a Internet, laboratórios de investigação já começaram a trabalhar em algoritmos mais robustos que evitam os “ataques” de sistemas quânticos, mas também em redes que processam partículas de luz (fotões) em redes óticas para garantirem a inviolabilidade das comunicações.
Imagem de telescópio com que Yasser Omar ilustrou o primeiro desafio do podcast Futuro do Futuro
Em paralelo com as primeiras “internets quânticas” que já mereceram investimentos da Comissão Europeia, irrompeu uma mescla de colaboração e rivalidade entre os diferentes países. “Para as agências de segurança e de soberania este é um período de maior ansiedade porque têm que encontrar outras soluções”, analisa Yasser Omar, admitindo que há um novo desafio geopolítico a perfilar-se no horizonte da ciência e da tecnologia.
“Por exemplo, os Estados Unidos estão a pôr restrições à exportação de processadores quânticos”, informa o cientista. “Mesmo entre a Europa e os Estados Unidos há algumas restrições, ou discutem-se algumas restrições a este tipo de exportações e colaborações”, adianta de seguida.
Em Portugal, já há duas pequenas redes quânticas a tomarem forma. Uma delas já terá propósitos ligados à área da soberania. Em paralelo, começam a surgir as primeiras startups como a N10gled que foi criada com o propósito de aplicar as comunicações quânticas à área aeroespacial, e levou Yasser Omar a responder a um dos desafios do Futuro do Futuro com uma imagem de um telescópio.
Em paralelo com as preocupações à macro-escala, Google, Microsoft, IBM e muitas outras empresas têm apostado muitos milhões em encontrar forma de codificar – ou descodificar – informação com sistemas que manipulam átomos. Numa das abordagens mais conhecidas de computadores quânticos prevê-se o uso de átomos no vácuo a temperaturas próximas dos 273 graus negativos.
A complexidade destes sistemas, que só agora lograram superar um milhar de bits quânticos, já permitiu superar, em eficiência, o processamento dos computadores clássicos na resolução de alguns problemas matemáticos, mas vai mantendo ao largo o dia em que a computação quântica entrará no quotidiano. E talvez o próprio conceito de sobreposição, que diz que uma partícula pode estar simultaneamente em dois estados que permitem estabelecer correlações para apurar resultados mais rapidamente, ajude a explicar a aparente contradição das previsões de Yasser Omar, numa entrevista que também serve de introdução ao mundo da quântica.
“Telemóvel quântico? Para mim, é quase ficção científica, mas por que não?”, admite o cientista.
Em contrapartida, o Duo LP já é bem real – e faz música com pianos acústicos combinados com quântica. E por isso surge como recomendação de Yasser Omar ao desafio sonoro colocado neste podcast.
Hugo Séneca conversa com mentes brilhantes de diversas áreas sobre o admirável mundo novo que a tecnologia nos reserva. Uma janela aberta para as grandes inovações destes e dos próximos tempos