A Beleza das Pequenas Coisas

Aldina Duarte: “Sou uma sobrevivente. Não é durante as crises e tragédias que me vou abaixo”

Aldina Duarte afirma que não quer viver só para cantar, que gosta de ficar horas a contemplar as nuvens a desaparecer do Tejo. Começou o ano a comover uma multidão na discoteca Lux-Frágil, em Lisboa, quando apresentou o novo disco “Roubados”, onde recria doze clássicos do fado para celebrar os 25 anos na música. Depois a pandemia alterou-lhe os planos, mas não lhe arrancou o ânimo. “Não é durante as crises e tragédias que me vou abaixo. É muito depois, quando estiver tudo estabilizado.” Apesar de fadista, Aldina diz ter mais tendência para viver no futuro. “Estou agora a tentar viver o presente de forma construtiva. Quero sair uma pessoa melhor desta experiência violenta e rara.” De volta aos palcos para quatro concertos, em Lisboa, Castelo Branco, Faro e Vila Real, a artista deixa claro que recusou fazer parte de tributos a Amália porque “não há nada a mexer nesses temas emblemáticos.” Sobre as novas solidões afirma: “Não foi só o vírus que nos isolou. Há muito que as pessoas estavam a televiver numa bolha tecnológica em função do trabalho e do dinheiro”

Aldina Duarte: “Sou uma sobrevivente. Não é durante as crises e tragédias que me vou abaixo”

José Cedovim Pinto

Edição áudio

Aldina Duarte: “Sou uma sobrevivente. Não é durante as crises e tragédias que me vou abaixo”

Nuno Botelho

Fotografia

É a sua primeira entrevista desde que surgiu a pandemia. E mais do que entrevista, foi uma conversa despenteada e singular, como Aldina Duarte é, cheia de memórias, partilhas e reflexões. E onde chega mesmo a trautear um fado que traduz o seu atual estado de alma. Nos últimos meses, a fadista afirma ter passado a ser uma pessoa socialmente recatada e “absolutamente cautelosa”. Logo esta nova vaga de covid-19 e de novas restrições não alteraram em quase nada a sua rotina e estado de espírito. “Desde o primeiro confinamento até agora não mudei todas estas regras sinistras que abomino, e que me feriram no início, mas que acredito serem a única maneira de travar tudo isto.” Aldina está agora de volta aos palcos para atuar em 4 concertos. Tomem nota: dia 27 de novembro podem ouvi-la em Castelo Branco, no Cine Teatro Avenida; dia 3 de dezembro, no CCB, em Lisboa; dia 5 em Faro, no Teatro das Figuras; e dia 12, no auditório de Vila Real.

Muito crítica sobre quem divide o mundo entre vencedores e vencidos, e a quem se dedica só ao trabalho e a ganhar dinheiro, em detrimento do tempo de qualidade passado uns com os outros, afirma: “As pessoas dizem agora que sentem falta dos abraços e beijinhos. Mas não foi só o vírus que nos isolou. Há muito que as pessoas estavam a televiver, numa bolha tecnológica só em função do trabalho e do dinheiro." Para depois acrescentar que há muito que recusa viver só para o trabalho. "Não quero viver só para cantar. Não sou essa pessoa. Há anos que troquei o dinheiro por tempo. Gosto de acordar e ficar horas a ver as nuvens desaparecer do Tejo."

Conta que não há dia que não leia um livro e não ouça uma música, e que até nas idas ao supermercado (ultimamente não tem ido, encomenda online) quando a fila está longa, saca da mala um livro e o tempo de espera pode ser infinito que não se rala. Sobre as tribos e egos na música e no fado, põe-se à margem da discussão. "Não acho que os artistas tenham de andar a gabar-se uns aos outros. E por delicadeza também não menciono quem não gosto. Seria uma agressividade gratuita." Refere Beatriz da Conceição, a fadista que a levou para o fado, e Camané o homem por quem se encantou pelo seu talento e génio fadista. E é com a segurança e a maturidade de quem já encontrou a sua voz e lugar no fado que afirma: “Na arte cada um tem o seu lugar. Sei bem o que posso fazer bem, Amália nunca poderia fazer. E ela terá uma genialidade que eu não tenho.”

E ainda recorda a criança-adulta que foi num contexto de pobreza, a adolescente “selvagem”, os tempos de jornalista, como o fado a juntou a Camané e como continua a gostar da vida a valer. “E quando não gosto, não gosto a valer.”

Mas há muito, muito mais para escutar neste episódio do podcast "A Beleza das Pequenas Coisas". Desta vez, a edição áudio é do José Cedovim Pinto. A fotografia é do Nuno Botelho e o genérico é uma criação original do músico Luís Severo. Mantemos o desafio a todos/as os/as ouvintes para que enviem as suas opiniões, sugestões, histórias e comentários para o seguinte email: abelezadaspequenascoisas@impresa.pt.

Assinar no Apple Podcasts: http://apple.co/2mCAbq2

Assinar no Soundcloud: http://bit.ly/2nMRpRL

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Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: oemaildobernardomendonca@gmail.com

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