Morais Sarmento, vice-presidente do PSD, corrige declaração de rendimentos e património no Tribunal Constitucional
Na sequência dos Pandora Papers, o vice-presidente de Rui Rio no PSD escreveu ao presidente do Constitucional para serem acrescentadas na sua declaração as participações sociais que tem em três empresas moçambicanas, através das quais é dono de um hotel e de uma escola de mergulho
Nuno Morais Sarmento decidiu enviar para o Tribunal Constitucional uma correção à sua declaração de rendimentos e património, na sequência da revelação dos Pandora Papers publicada pelo Expresso a 3 de outubro sobre uma companhia offshore de que foi beneficiário, a Magalia International Limited, registada nas Ilhas Virgens Britânicas, e através da qual deteve empresas moçambicanas que, por sua vez, são proprietárias de um hotel em Moçambique.
Numa informação enviada no domingo passado, 10 de outubro, ao presidente do Constitucional, João Caupers, o advogado e vice-presidente do PSD pediu para ser acrescentada, na parte da declaração que diz respeito a “quotas, ações, participações ou outras partes sociais do capital de sociedades civis ou comerciais”, o facto de deter “indireta e diretamente desde 2006” quotas em três empresas moçambicanas: 98% da Maningue Tofo Lda e 49% da Tofomania Lda e da Diversity Scuba Lda.
Na última declaração que entregou no Constitucional, a 23 de abril de 2018, após ter sido eleito vice-presidente do PSD, essas participações não constavam. Em vez disso, era mencionado um “crédito (investimento) de 450 mil euros” sobre a empresa Maningue Tofo, Lda.
“Depois de reanalisar a declaração de rendimentos e património, verifico que na mesma segui, quase duplicadamente, as regras das declarações fiscais, que por exemplo não obrigavam à indicação de participações sociais, mas obrigavam à indicação de todos os rendimentos eventuais ou obtidos, indireta ou diretamente, através dessas participações”, escreveu Morais Sarmento ao tribunal. “Verifico por isso, e em consequência, que apresentei elementos quantitativos que não me eram solicitados, com prejuízo da indicação exaustiva das participações sociais, por isso em falta.”
Nos esclarecimentos que dera ao Expresso antes da publicação do artigo dos Pandora Papers de 3 de outubro, o antigo ministro social-democrata explicara que “o motivo pelo qual foi constituída e utilizada a sociedade Magalia International Limited deveu-se, unicamente, às limitações e impedimentos então existentes em Moçambique (aliás comuns a outros Estados africanos) quanto à detenção e transmissão diretas de imóveis e sociedades por cidadãos estrangeiros”.
A Magalia International deteve a partir de janeiro de 2007 uma participação de 49% da Tofomania, Lda, proprietária dos imóveis que compõem o Hotel Tofo Mar, na praia do Tofo, em Inhambane; e 98% da Maningue Tofo, Lda, empresa dedicada à gestão daquele estabelecimento.
Três empresas e não duas
Contudo, na altura Morais Sarmento não referiu ao Expresso a existência de uma terceira empresa moçambicana, a Diversity Scuba, Lda, dona de uma escola de mergulho anexa ao hotel e em que o político adquiriu uma participação direta de 49% do capital social em março de 2007, isto é, sem o envolvimento da Magalia International, de acordo com uma consulta do Expresso ao Boletim da República moçambicano (o equivalente ao Diário da República português). No artigo do Expresso de 3 de outubro era referido, de forma incorreta, que essa escola de mergulho era detida indiretamente através da Magalia International e da Maningue.
Em resposta a novas questões colocadas pelo Expresso na semana passada, sobre o porquê de uma participação indireta em duas empresas moçambicanas e uma participação direta numa terceira sociedade se havia, como dissera antes, impedimentos “quanto à detenção e transmissão diretas de imóveis e sociedades por cidadãos estrangeiros”, Morais Sarmento deu explicações adicionais. “As limitações e impedimentos existentes em 2006 a que fiz referência na primeira resposta eram sobre a propriedade (e sobretudo os procedimentos associados), em nome individual ou através de sociedade, de quaisquer imóveis ou benfeitorias”. Mas, ressalvou o vice-presidente, “quanto às sociedades comerciais que desenvolvem uma qualquer atividade sem envolver a detenção de imóveis não existia, nem existe hoje, qualquer limitação quanto à detenção do seu capital social, por moçambicanos como por não moçambicanos”. Daí a sua participação direta na Diversity Scuba Lda.
Na semana passada, o jornal Tal & Qual tinha noticiado que o político não só deixara de fora o hotel em Moçambique na sua declaração de rendimentos e património, como o citava a dizer: “Não declarei o hotel e a escola de mergulho porque acho que não tenho essa obrigação. É património que tenho em Moçambique, não em Portugal”. Na carta ao presidente do Constitucional de domingo passado, o antigo ministro escreveu: “Essa notícia procurava dar a entender que me dirigi por qualquer forma menos respeitosa ao Tribunal Constitucional, o que sem mais repudio de forma cabal”.
Ao Expresso, Morais Sarmento sublinhou que não teve “qualquer intenção de ocultação, desde logo pela aquisição em nome próprio de percentagem no capital social da escola de mergulho desde o momento inicial, que apenas não aconteceu no primeiro momento relativamente ao hotel pela razão que repetidamente afirmo”, lamentando que os factos em causa relacionados consigo estejam já “muito, mas muito longe da importante investigação de utilização de offshores para ocultação de fortuna, lavagem de dinheiro ou evasão fiscal, por milionários e mesmo por criminosos, cujas notícias infelizmente já capeei”.
Os Pandora Papers são uma colaboração global entre o Expresso e o Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ), uma organização sem fins lucrativos. Se gosta de jornalismo como este, por favor faça uma doação ao ICIJ para o apoiar.