Opinião

Presidenciais: tempos e termos

Corre por aí a ideia de que o PS não ocupa a Presidência da República há 20 anos, desde Jorge Sampaio. Discordo: após 10 anos de presidência socialista de Marcelo Rebelo de Sousa, é tempo de a direita voltar a Belém. É por isso que este processo merece um tempo mais oportuno e uns termos menos trapalhões

O PSD resolveu trazer, pela mão do seu presidente e pela voz do seu líder parlamentar, o tema das presidenciais para a agenda. Percebo a precipitação: olham à volta, e o actual Presidente da República já não cumpre os mínimos olímpicos.

Tenho, todavia, uma boa e uma má notícia. A boa, é que isto ainda é uma democracia constitucional, e nas democracias constitucionais é como nos céus: lá debaixo há um tempo para tudo e um tempo certo para cada coisa. A má, é que ainda não é o tempo certo: as eleições presidenciais são só daqui a pouco menos de um ano e meio, e até lá muito pode mudar no panorama político nacional.

Sobre isto, aliás, até tenho um exemplo do passado e algumas dúvidas sobre o futuro. Há um ano, Marques Mendes sinalizou-se como putativo candidato a Belém e o país político foi atrás do osso. Que país político era esse? O Primeiro-ministro, com maioria absoluta no Parlamento, chamava-se António Costa, e o líder da oposição, a quem, à data, ninguém dava muito crédito, chamava-se Luís Montenegro. Um ano depois, esse Governo caiu, Costa é Presidente do Conselho Europeu, e Luís Montenegro é Primeiro-ministro. Um ano em política é uma eternidade. Quem é que, hoje, consegue adivinhar o resultado e as consequências das autárquicas de daqui a um ano? Se o PS perder, alguém no Largo do Rato indultará Pedro Nuno Santos? Quem é que, hoje, pode assegurar que não acontecerão eleições legislativas antecipadas? E, havendo ou não, que créditos e/ou que débitos pesarão sobre o PSD, o PS e o Chega, e os seus líderes actuais? Ou alguém acha que isto é irrelevante para o equilíbrio de forças políticas e para a corrida presidencial?

Porém, pior do que errar no tempo, é usar termos trapalhões no lançamento do debate. Para o PSD – certo de que a moção de estratégia de Luís Montenegro será esmagadoramente aprovada em congresso – o candidato a Presidente apoiado pelo PSD deverá ser militante. A isto, resolveu Hugo Soares acrescentar uma “sugestão”: Leonor Beleza (hipótese, entretanto, já recusada pela própria).

Num partido em risco de cisma, como o PSD hoje – coisa só vagamente mitigada pelo exercício de poder no Governo –, lançar – com voz partidária – mais um nome onde já está o de Marques Mendes acentua a divisão entre sociais-democratas, coisa que o próprio nome de Marques Mendes por si só já garante. E num tempo em que os eleitores olham com desconfiança crescente para os partidos de sempre, esta opção de afunilar no critério da militância, é um erro tanto maior, quanto mais se sabe que os apoios partidários não costumam ser mais-valias nas corridas presidenciais.

A candidatura presidencial é uma candidatura uninominal, decorrente de uma vontade pessoal, e alicerçada num “contrato” firmado entre o candidato e o povo português. Ora, num tempo em que a globalização deu lugar à geopolítica, com uma guerra na Europa e no médio-oriente, com um Pacífico nada pacífico com a questão de Taiwan palpitante, com um sismo político (independentemente do resultado) nos Estados Unidos, as competências do Presidente da República que ganham mais relevância são as de Comandante Supremo das Forças Armadas e a representação externa do Estado, com especial importância para a experiência em relações diplomáticas. Deixar, à partida – por capricho ou partidarite –, de fora um nome como Paulo Portas, que foi Ministro da Defesa, dos Negócios Estrangeiros e vice-Primeiro Ministro, é um erro original. Não considerar seriamente – por omissão convicta ou cínica – o nome do ex-Primeiro-ministro Pedro Passos Coelho, é um erro político ou uma cobardia imperdoável.

Mudando de assunto, ou nem por isso. Dizia há pouco que o actual Presidente da República já não cumpre os mínimos olímpicos. Em 2019, a propósito da escolha de Elisa Ferreira para Comissária Europeia, Marcelo Rebelo de Sousa disse ser “um nome muito bom” com “experiência europeia de excelência”; instado, por estes dias, a comentar a escolha de Maria Luís Albuquerque, limitou-se a dizer que “há quem concorde e há quem discorde. O Presidente da República não tem de se pronunciar”. O mesmo Presidente da República que, há dois meses, considerou uma “magnífica escolha” o nome de António Costa para o Conselho Europeu.

Maria Luís Albuquerque é, obviamente, uma excelente escolha do Governo português e Luís Montenegro esteve, aqui, muito bem. Mas o ponto não é esse: corre por aí a ideia de que o PS não ocupa a Presidência da República há 20 anos, desde Jorge Sampaio. Discordo: após 10 anos de presidência socialista de Marcelo Rebelo de Sousa, é tempo de a direita voltar a Belém. É por isso que este processo merece um tempo mais oportuno e uns termos menos trapalhões.

Pedro Gomes Sanches escreve de acordo com a antiga ortografia.

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