Opinião

A confissão de António Costa

A confissão de António Costa

Duarte Marques

Ex-deputado do PSD

O principal facto da entrevista de ontem é António Costa confessar que as suas medidas têm sido normalmente ultrapassadas pela realidade. Isto revela que o preconceito ideológico e a falta de preparação coloca em causa o futuro do país. Costa não é um novo candidato a PM, é o governante desde 2015

Numa primeira análise a quente sobre a entrevista de ontem de António Costa ficamos com a sensação que lhe correu bem. Num ambiente mais ou menos controlado e com os temas quentes claramente antecipados, o primeiro-ministro teve sempre resposta na ponta da língua, ora disfarçando a sua responsabilidade com fatores externos à sua governação, ora brincando com as palavras, raramente António Costa não encontrou uma saída hábil para as perguntas mais incómodas.

Aliás, ao longo de quase toda a entrevista ficámos com a sensação de que António Costa era um candidato a primeiro-ministro ou mesmo o líder da oposição. Quem aterrasse agora em Portugal ficaria com a sensação que este António Costa que ontem deu a cara na CCN não tem nada a ver com o atual governante.

O primeiro-ministro voltou a demonstrar aquilo em que é claramente o melhor protagonista que o país já conheceu: a governação de curto prazo orientada para resultados imediatos. António Costa confirmou ontem, mais uma vez, que é o mais brilhante naquilo que a política tem de pior, o malabarismo, as meias verdades e o encantamento dos menos atentos ou menos informados.

O problema é que este tipo de gestão seria ótimo para um programa de televisão, para um jogo entre amigos ou para mera diversão, mas é penosa para o país e para os seus cidadãos.

Mas o mais significativo desta entrevista é a humildade, coisa rara, do primeiro-ministro ao confessar a sua frustração por a realidade ter sido mais dinâmica do que a resposta política. Apetece dizer que a realidade ultrapassou a ficção e sobretudo a ideologia. Mas não foi por falta de aviso. Todos os programas anunciados pelo governo de António Costa para a habitação foram um fracasso. Perdemos praticamente sete anos tanto na criação de habitação pública como de residências universitárias.

Mas a gestão do problema da habitação é equivalente na saúde ou na educação. As medidas tomadas no tempo da geringonça têm reflexos claros no caos que reina tanto na saúde como na educação para já não falar na TAP cuja tragédia todos temos testemunhado.

No tema da saúde, o desastre tem início com as alterações feitas ao horário de 40 horas semanais e agravada pela gestão da pandemia. Mas se grande dificuldade futura está em assumir uma boa articulação entre a oferta do público, privado e social, terá também em conta não assumir o desastre de Marta Temido para manter intocáveis as suas aspirações a autarca de Lisboa mas também criar condições para que o atual ministro esteja em condições de disputar a vitória no Porto.

Oito anos depois de tomar posse, António Costa confessou pela primeira vez aquilo que muitos portugueses já perceberam: não é um estadista nem está preparado para fazer reformas estruturais.

Tal como disse Abraham Lincoln ou Jacques Abbadie, “pode-se enganar todos por algum tempo; pode-se enganar alguns por todo o tempo; mas não se pode enganar todos todo o tempo”.

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