Opinião

Paridade na composição do Tribunal Constitucional – uma oportunidade histórica

O TC tem, tantas vezes, a última palavra sobre os direitos fundamentais de homens e mulheres e sobre direitos – como já teve – especificamente das mulheres. Não tenho por aceitável esta fuga legalmente consentida à paridade

Hoje (quarta-feira) apresentei o parecer na comissão de assuntos constitucionais, direitos, liberdades e garantias sobre os projetos de lei do PAN e do BE que, respetivamente, visam “garantir a representação equilibrada de género na composição do Tribunal Constitucional e reforçar a transparência do processo de cooptação de Juízes e “a introdução do critério da paridade na composição do Tribunal Constitucional (TC)”.

Entendo – é a minha opinião pessoal – que o Parlamento não pode perder esta oportunidade. Isto tem a ver com a convicção de que se a desigualdade de género no poder judicial em geral é um problema abordado internacionalmente, nomeadamente pela ONU, ela não deixa de ter particular acutilância quando relativa a um Tribunal sui generis. O TC administra a justiça em matéria jurídico-constitucional, anula “decisões” do legislador democraticamente eleito, pelo que, por isso mesmo, tem a dimensão política evidente que justifica, de resto, a sua composição não limitada a juízes de carreira. Em sendo convocado, é o TC que decide se a vontade da polis expressada na Assembleia da República deve “valer” de acordo com a interpretação que 13 juízes fazem da Lei Fundamental, interpretação essa que naturalmente leva em si a mundividência pessoal, política e cultural de cada juiz. As considerações que nos levaram a atuar noutros domínios, cumprindo uma Constituição que manda promover a igualdade entre homens e mulheres são, aqui, válidas. São especificamente válidas. A maior parte dos juízes do TC é eleita pela Assembleia da República que está sujeita a uma lei de representação paritária. Que sentido faz que essa mesma Assembleia indique para o Tribunal que tem o poder de anular as suas decisões legislativas e, portanto, as suas mundividências assumidas em leis aprovadas por maioria, listas de nomes que podem ser só de um género e que os eleitos, por sua vez, possam fazer o mesmo?

Ajuda olharmos para Tribunais com funções especiais. Quando lemos testemunhos de juízas do Tribunal Penal Internacional ou de Tribunais criados para conflitos específicos percebemos bem o que sentem, por exemplo, quanto a decidir de crimes sexuais marcados pelo género sem que haja paridade nesses tribunais.

O TC tem, tantas vezes, a última palavra sobre os direitos fundamentais de homens e mulheres e sobre direitos – como já teve – especificamente das mulheres. Não tenho por aceitável esta fuga legalmente consentida à paridade.

Como todos os democratas e aos democratas sabem, a desigualdade de género é má para a democracia. Por isso, subscrevo integralmente as seguintes palavras do Luís Filipe Mota Miranda:

“Olhando para o historial de composição do Tribunal Constitucional constata-se que esta tendência para uma dominância masculina, sendo chocante, não é nova.(…)

Este cenário demonstra que há um problema de sub-representação estrutural das mulheres no Tribunal Constitucional e pior, conforme afirmou a Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, que tal situação dificilmente cumpre a exigência constitucional de promoção da igualdade no exercício dos direitos cívicos e políticos. Este fosso de desigualdade torna-se ainda mais desconcertante quando os dados estatísticos mais recentes nos dizem que, em Portugal, as mulheres são a maioria dos estudantes de Direito, dos licenciados em direito, dos advogados e dos magistrados judiciais.

Sendo o Tribunal Constitucional o instrumento de garantia e atualização da Constituição enquanto contrato social, o mínimo que se exige é que a sua composição seja heterogénea, plural e representativa da sociedade. Essa composição poderá ser conseguida por via da implementação de quotas de género de 40% na sua composição.(…)

Esta solução é simples, eficaz e nem exige uma revisão constitucional, pelo que não há razão nenhuma para que o Parlamento continue a deixar o TC de fora da agenda da igualdade de género”.

É também essa a minha opinião.

Há dois projetos de lei em cima da mesa. A oportunidade histórica está criada.

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