Tem sentido corrigir a palavra “gorda” num livro infantil? Claro que tem, mas só se quisermos acabar com a literatura, com a arte e com a comunicação entre nós, que inclui a verdade da vida, com interpretações, mesmo insultos, e a discussão sobre o sentido das palavras
Não é de repente, que coisa. A censura existiu sempre, de variadas formas. Durante séculos, nenhum livro podia ser impresso sem a autorização da Inquisição, há no Vaticano uma extraordinária biblioteca que preserva muitas cópias de textos proibidos. Outros senhores usaram a mesma autoridade. Os nazis queimaram livros e não foram os únicos, a genealogia do ato é ancestral. “Nós”, do velho bolchevique Zamiatine, escrito em 1920, teve de ser contrabandeado para fora da Rússia para ser publicado - e foi só o primeiro.
Por isso, quando Orwell nos apresentou Winston Smith, um dos protagonistas de “1984”, como funcionário do Ministério da Verdade, ou minivero, para usar a novilíngua que seria a suprema forma de condicionar a comunicação, deu-lhe a função de reescrever os jornais e textos do passado para o adequar às constantes necessidades da política do presente. Reescrever o passado é a essência do poder.
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