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O julgamento que Platão não escreveu

O julgamento que Platão não escreveu

Marta Gonçalves

Coordenadora de Multimédia

Luís Barra

“Onde estavas quando José Sócrates foi detido?” é, provavelmente, para uma geração de jornalistas que hoje andam na casa dos 30 e pouquinhos anos o equivalente à pergunta “onde estavas no 11 de Setembro de 2001?”. Na altura, estávamos acabados de sair da faculdade e, alguns de nós, começavam a dar os primeiros passos numa redação. E, acredite, se para o país em geral a notícia foi um choque, para quem está a começar uma carreira nos jornais era a certeza de que estávamos a testemunhar algo que parecia impossível.

Eu sei onde estava: na redação a olhar para as televisões. À minha volta, dezenas de jornalistas séniores estavam agarrados aos telemóveis a tentar perceber o que se estava a passar e o que viria a seguir.

De cá para lá, Sócrates acabou mesmo por ficar em prisão preventiva durante nove meses na cadeia de Évora e mais um mês em domiciliária - fizeram-se romarias de apoiantes e opositores do ex-chefe de Governo à prisão e até se lançou um hino de apoio. Entretanto, a acusação demorou mais de três anos a estar pronta e a então Procuradora Geral da República, Joana Marques Vidal, chegou a ameaçar tirar o processo a Rosário Teixeira.

O caso seguiu para instrução e só em 2019 é que Ivo Rosa começou a analisar os vários pedidos dos arguidos. Dois anos depois, decidiu destruir a acusação, partindo o processo em vários casos pequenos, tendo alguns chegado mesmo ao fim com as condenações de Ricardo Salgado e Armando Vara a condenações de prisão efetiva. O mini-caso de Sócrates foi marcado por inúmeros recursos e reclamações, mas também por uma guerra entre juízes que não queriam pagar no caso. Sócrates apresentou 50 recursos e inúmeras reclamações.

Quase 11 anos depois daquela noite no ainda Aeroporto da Portela (só passaria a Humberto Delgado em 2016), arranca hoje o julgamento do ex-primeiro-ministro por 22 crimes que vão da corrupção ao branqueamento de capitais e fraude fiscal. No total, segundo a tese do Ministério Público, Sócrates terá recebido €34 milhões de euros em troca de favorecimento ao Grupo Lena nos projetos da Parque Escolar, na construção de casas na Venezuela e no TGV, assim como também para o favorecimento do BES na OPA da PT e ao Grupo de Vale de Lobo para conseguir um financiamento da Caixa Geral de Depósitos.

Ao contrário do julgamento de outro Sócrates, o filósofo, que é narrado por Platão na “Apologia de Sócrates”, este será acompanhado pelo Expresso ao minuto. O começo está marcado para as 9h30 e o jornalista Rui Gustavo vai estar dentro da sala de audiência.

Ainda antes, espreite este guia que lhe responde a perguntas como “de que é Sócrates suspeito e quem está com ele no processo?”, “o julgamento corre o risco de ser adiado?” e “houve ou não um lapso de escrita?”. Também vale a pena ouvir o episódio do Expresso da Manhã, conduzido por Paulo Baldaia e com sonoplastia de Gustavo Carvalho.

Num tema totalmente diferente (desculpe, caro leitor, por esta mudança brusca de assunto), o Expresso lança também esta quinta-feira um especial interativo em permanente atualização com os incêndios e os avisos emitidos pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). Desenvolvida pela Cátia Barros, com Raquel Albuquerque, Sofia Miguel Rosa, Tiago Pereira Santos e João Melancia, pode guardar esta ferramenta nos seus ‘favoritos’ e consultar sempre que desejar.

À hora que escrevo este Expresso Curto, estão nove incêndios ativos em Portugal Continental e o fogo que mobiliza mais recursos fica no concelho de Póvoa De Lanhoso.

OUTRAS NOTÍCIAS

Calor Nem a propósito da ferramenta que acabei de lhe apresentar, Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) emitiu aviso amarelo para 12 distritos de Portugal continental, uma medida preventiva que alerta para condições meteorológicas com impacto potencial em atividades humanas. Esta quinta-feira, quase 70% de Portugal continental sob aviso amarelo devido ao calor.

Apagão São muitas as lições a tirar do apagão energético de 28 de abril, sublinhou esta quarta-feira a presidente da Autoridade Nacional das Comunicações (Anacom) no último dia do 34.º Congresso da Associação Portuguesa para o Desenvolvimento das Comunicações (APDC), apontando para a necessidade de avançar com medidas que mitiguem riscos futuros. Neste texto, assinado pela Anabela Campos, o regulador defende a criação de procedimentos que permitam aos operadores beneficiar do acesso à Rede Estratégica de Postos de Abastecimento em caso de crise energética

Economia Em Sintra, no o Fórum do Banco Central Europeu (BCE), traçou-se um futuro mais nublado, pintado de incertezas globais, mas com os decisores a admitirem a possibilidade de o euro ganhar terreno a um dólar enfraquecido por Trump. Lagarde sem pressa para cortar juros. O BCE quer um euro global, mas a valorização da moeda única traz riscos à economia europeia, escreve Gonçalo Almeira.

Boas ideias É da experiência em mais de mil escolas em 10 países que surge a Class of Wonders, que quer salas de aula que sejam “lugares onde todas as crianças aprendam de forma significativa e evoluam ao seu ritmo”, procurando resolver um problema histórico da pedagogia: “que cada aluno seja respeitado no seu ponto de partida, ritmo de progresso e motivações”. O Pedro Miguel Coelho esteve à conversa com o fundador desta startup, Francisco Pires de Miranda.

FRASES
Não serei candidato” - Augusto Santos Silva, ex-Presidente da Assembleia da República, em entrevista à RTP, afastando-se da corrida presidencial

Espero poder anunciar ao país que, em matéria de descida de impostos e em matéria de imigração, chegámos ao mínimo consenso possível para aprovar já na sexta-feira medidas que entrem em vigor rapidamente” - André Ventura, líder do Chega,sobre o encontro com o primeiro-ministro

É a sua primeira condenação e trata-se de um crime relacionado com prostituição, por isso deve ser libertado nas condições adequadas” - Marc Agnifilo, advogado de defesa do rapper Sean "Diddy" Combs, após este ter sido ilibado dos crimes mais graves de que estava acusado

PODCASTS
🎤 Geração 80 Perdeu o pai com oito anos, mas foi com ele que aprendeu o que era “boa música”. Começou nos Onda Choc, aos 12 anos, e nunca mais parou e a música sempre foi mais do que uma profissão. Nasceu Marisa Pinto, mas todos a conhecem por Marisa Liz e é a convidada do novo episódio do Geração 80,em mais uma conversa com Francisco Pedro Balsemão, com a sonoplastia de João Martins.

📰 O Tal Podcast Humanista da parte de pai e mãe, a jornalista Joana Gorjão Henriques partilha como o património de valores familiares se tornou um ativo para a vida. A partir do passado, seu e do país, parte para uma reflexão geral sobre estado da sociedade e as novas formas de discriminação e racismo. “Nós, jornais e media, temos muita responsabilidade em não ter posto travões [ao discurso de ódio]”. A conversa é conduzida por Paula Cardoso e Georgina Angélica, a sonoplastia é de Salomé Rita.

⌚ Tempo ao Tempo Continuando na história do início do século XX,Rui Tavares faz um retrato das circunstâncias que deram origem à maior fraude económica da história de Portugal a partir de uma teoria do economista Henry Wigan, que traça uma relação direta entre as notas falsas de Alves dos Reis e o fim da Primeira República. A sonoplastia deste episódio é de João Luís Amorim.

O QUE ANDO A LER
“O Avesso da Pele” (Companhia das Letras, 2021), Jeferson Tenório

O pai de Pedro morreu. É a partir da morte de um homem que deixou um escritório cheio de objetos de uma vida que, aos poucos, vamos conhecendo a história da família do Pedro, do pai e da mãe, mas também da sua. Ao mesmo tempo, ficamos a conhecer um pouco mais de um Brasil desigual, racista e onde a violência policial é real.

O livro, que chegou a ser censurado e teve mesmo ordem de recolha em três estados brasileiros, é mais do que relações entre pais e filhos, é um retrato social, onde parte das pessoas vivem uma espécie de vida dupla e são forçadas ao silêncio.

Acho que pela primeira vez não lhe deixo citações do livro que ando a ler, mas, em minha defesa, gostei tanto dele que já o impingi a amigos para lerem e, neste momento, anda por mãos alheias, nas de quem me apresentou Jeferson Tenório, com o “Estela sem Deus”, uma outra sugestão que também já aqui deixei e que aproveito para voltar a recomendar.

O QUE ANDO A VER, OUVIR E TAMBÉM A LER
“Liberto: a história dos reclusos que dão a volta ao mundo” (Expresso, 2025), de Joana Ascensão, Rui Oliveira, Carlos Paes, Tiago Pereira Santos e João Melancia

Foi há uma semana que o Expresso lançou esta reportagem multimédia: é a história de quatro homens presos e quatro bonequinhos de cartão feitos à sua imagem que ganham vida pela mão de voluntários, que os levam a passear para lá dos muros da Prisão de Custóias, no Porto. Dentro, a cumprirem pena, conhecemos o Ionel, o Benjamin, o João e o Leandro. Quando andam pelo mundo são os ‘Libertos’: o Xavier, o Gente Séria, o Joca e o Caché, respetivamente.

Eles são os quatro (oito, na verdade) protagonistas, mas a ideia nasceu de uma outra pessoa, a professora Isabel, que aproveita as fotografias que os voluntários trazem no regresso das viagens para usar como objeto de estudo nas aulas.

“Criar um Liberto, dar-lhe um nome, um significado, é também criar uma identidade. Não é só um boneco, é o meu boneco. É meio caminho andado para garantir alguma estabilidade emocional e, ao mesmo tempo, mostrar que afinal há vida para lá do que se estava à espera. Se o meu Liberto pode viajar, por que é que eu não posso? A criatividade transpõe barreiras. E funciona.”

Termino o meu Expresso Curto por aqui. Obrigada por nos ler. Continue a acompanhar-nos no Expresso, na Tribuna e na Blitz, a ouvir-nos e a ver-nos também. Não se esqueça que também estamos sempre por aqui, ali, além e acolá.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: mpgoncalves@expresso.impresa.pt

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