Um ano de guerra na Ucrânia

Zelensky, um ano de guerra depois: a confiança na vitória, o desejo de uma "conferência de paz" e o "pior momento" em Bucha

Zelensky, um ano de guerra depois: a confiança na vitória, o desejo de uma "conferência de paz" e o "pior momento" em Bucha
GENYA SAVILOV

Numa conferência de imprensa longa e com sentido de humor, o Presidente da Ucrânia agradeceu o apoio dos aliados, mas disse que para alcançar a paz é importante Kiev aproximar-se de outros países, da Índia à América Latina. Também se mostrou disponível para conversar com a China, que apresentou um plano de paz, e afirmou que a ajuda militar tem de continuar – incluindo os jatos F-16, que já estão a ser discutidos com Reino Unido e Polónia

Numa conferência de imprensa em Kiev destinada a assinalar um ano de conflito militar na Ucrânia, o Presidente Volodymyr Zelensky afirmou que o país vai “ganhar a guerra” se os seus aliados ocidentais continuarem “unidos” na ajuda militar. “Se todos cumprirmos as nossas tarefas, tenho a certeza que ganharemos a guerra. Não estamos a lutar sozinhos, temos amigos", afirmou Zelensky.

Muitas vezes com sentido de humor, o Presidente ucraniano respondeu às perguntas de dezenas de jornalistas internacionais durante mais de duas horas e meia, acabando por comentar várias vezes o plano de paz apresentado esta sexta-feira pela China. Zelensky afirmou que não viu o documento como uma proposta, mas apenas como a “opinião” de Pequim sobre o assunto – e isso era um passo “positivo”. “Que consequências vão ter estas palavras?”, perguntou, mostrando disponibilidade para sentar-se à mesa com Pequim para tentar travar a guerra. "Temos de trabalhar com a China", afirmou.

Zelensky falou ainda do desejo de uma “conferência de paz” num local neutro e com a presença do maior número de países possível – incluindo Índia, China, e os países africanos e da América Latina. “Estamos a lutar pela nossa sobrevivência”, afirmou, lembrando que no início da guerra a Ucrânia tinha menos países aliados do que tem atualmente.

Roman Pilipey

Kiev começou a abrir embaixadas nos dois continentes, onde diversos países mantêm boas relações com a Rússia e rejeitaram condenar a guerra. "A Ucrânia deve promover um passo em frente para se encontrar com os países do continente africano", declarou Zelensky, referindo igualmente que pretende "organizar uma cimeira entre os países da América Latina e a Ucrânia".

Neste âmbito, fez uma referência particular ao Presidente do Brasil, Lula da Silva, manifestando a intenção de reforçar os contactos bilaterais com um país que integra os BRICS, o grupo de economias emergentes que também inclui a Rússia, China, Índia e África do Sul.

O chefe de Estado ucraniano também sublinhou os estreitos contactos com os Países Baixos, Reino Unido, Polónia e os três Estados do Báltico (Estónia, Letónia e Lituânia) para criar mecanismos internacionais que permitam investigar os crimes de guerra de que a Rússia é acusada de ter cometido na Ucrânia.

Ajuda militar tem de continuar

O líder ucraniano aplica o mesmo princípio à ajuda militar vinda de outros países, lembrando que inicialmente os países ocidentais não queriam enviar carros de combate para a Ucrânia – algo que aconteceu esta sexta-feira, com a chegada a Kiev dos primeiros tanques Leopard 2, vindos da Polónia.

Além da Polónia e do Reino Unido, com quem está a negociar a entrega de F-16 e respetiva formação de pilotos, há mais três países que podem reforçar a força aérea de Kiev com estes equipamentos, garantiu Zelensky. "Mostramos que somos capazes de libertar o nosso povo.”

Numa altura em que o Congresso dos EUA dá sinais políticos de querer reduzir a ajuda militar à Ucrânia, Zelensky reforçou que a a recente visita do Presidente Joe Biden foi “muito importante”, e revelou que sentiu o apoio “do povo norte-americano” quando visitou Washington. “Precisamos que acreditem na nossa vitória”, enfatizou.

O futuro da Rússia: “Não quero saber”

“O que vai acontecer depois da derrota russa?”, perguntou de forma retórica Zelensky após uma pergunta sobre o pós-guerra. “Não quero saber o que vai acontecer com a Rússia, sinceramente. Eles têm o seu Estado, têm o seu próprio país. Se pensassem em reformas, democracia (…)", afirmou, antes de contrapor: “Nós estamos a pensar no futuro, no desenvolvimento do nosso país."

A Rússia pode ser “ainda mais pressionada”, avisou, pedindo “mais sanções” contra a riqueza da elite russa que está guardada no ocidente, “para que eles comecem a pensar” e alguma coisa mude no país. “Alguém deve estar disponível para negociar”, disse Zelensky, aludindo a uma futura queda do regime de Putin.

“A guerra na Ucrânia mostrou que o sistema [democrático] não é perfeito. Não estou a falar de munições, mas sim de cibersegurança, independência da informação, tecnologias…", avisou depois. E acrescentou: “Aumentar os orçamentos de Defesa é a resposta” para corrigir estas falhas.

Zelensky elegeu ainda a desocupação de Bucha, onde a população foi massacrada pelas tropas russas, como o “pior momento" deste último ano de guerra. “O que vi foi horrível… O diabo não está algures debaixo de nós, está entre nós."

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: tsoares@expresso.impresa.pt / tiago.g.soares24@gmail.com

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate