Erdogan, que está no poder há 21 anos, ganhou com uma margem menor do que o esperado, 52% contra 48% de Kemal Kiliçdaroglu, o candidato da oposição.
Em causa na segunda volta das presidenciais deste domingo estavam duas visões diametralmente opostas para o país – de um lado, um Erdogan nacionalista e conservador, com uma retórica polarizadora e abrasiva, defensor do poder absoluto concentrado no Chefe de Estado, que pretende continuar a reconstruir uma Turquia imperial e orgulhosamente muçulmana, independente do “pérfido” Ocidente, com capacidades militares próprias; do outro´uma oposição encabeçada por Kiliçdarogçlu, que apelou à reconciliação nacional e queria restabelecer a democracia parlamentar do passado, e defender o estado de Direito e as liberdades individuais.
Erdogan ganhou talvez a sua última - e mais importante, eleição. O atual Presidente, com 69 anos, e que tem aparecido algo debilitado, prometeu que este seria o seu último mandato, mas será um que lhe permitirá consolidar o sistema presidencial, manter o controlo quase absoluto que o seu círculo próximo mantém sobre a sociedade e a economia do país, e celebrar daqui a uns meses o centenário da moderna república turca. “Este será o século da Turquia”, como repete sem cessar. E ele é o “homem certo”, diziam os seus cartazes.
Esta curta vitoria, porém, confirma um dos sues legados – uma Turquia completamente fraturada de acordo com linhas ideológicas, dividida ao meio, com tensões entre curdos e turcos, muçulmanos e laicos, sunitas e alevitas, liberais e conservadores. A diferença de votos entre Erdogan - que controla todos os meios de comunicação social e colocou de forma descarada toda a poderosa máquina do Estado a fazer propaganda e a distribuir subsídios e dinheiro há meses - e Kiliçdaroglu, cuja campanha foi severamente limitada a todos os níveis, foi de 2 milhões de votos num universo de 64 milhões de eleitores. A Turquia continuará tensa, prevê-se a fuga de jovens e muitos problemas no futuro.
Um Erdogan exuberante já falou aos seus apoiantes que se concentravam em frente à sua casa em Istambul, e declarou vitória. Agradeceu-lhes, disse que esta era uma vitória não só da Turquia mas de todo o mundo muçulmano, achincalhou a oposição, chamando-lhes apoiantes LGBT.
Kiliçdaroglu não ganhou aquilo que dizia ser “a última oportunidade para trazer democracia ao país” – mas fez abanar a imensa máquina de Erdogan e obteve o melhor resultado de sempre da oposição contra o todo-poderoso Presidente. O seu resultado confirma também que a deriva nacionalista que marcou o seu discurso nesta segunda volta – prometeu expulsar todos os refugiados - produziu resultados, ao captar algum do voto nacionalista que na primeira volta tinha votado em Sinan Ogan, o terceiro candidato (5,2%).
Certamente acabará aqui a sua carreira política – resta saber se a oposição conseguirá manter a união conseguida por Kiliçdaroglu para ganhar as eleições autárquicas do início do próximo ano. Kiliçdaroglu ganhou em todas as grandes cidades, ao longo da costa mediterrânica turca (mais liberal e desenvolvida), e na região de maioria curda, no sudeste do país.
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