As previsões concretizaram-se: Xi Jinping mantém-se no cargo de líder do Partido Comunista da China por mais cinco anos. Foram afastadas do topo do partido vozes associadas à anterior administração e não foi escolhida qualquer mulher para o Politburo. A dúvida que permanece é o que motivou a escolta do ex-Presidente chinês Hu Jintao para fora do encontro
Quando o Congresso do Partido Comunista da China (PCC) arrancou, o discurso de Xi Jinping não surpreendeu. Uma semana depois, a divulgação da elite escolhida para ocupar com ele o comité permanente do Politburo revelou mudanças não antecipadas.
As portas douradas abrem-se e os sete homens que agora compõem a elite de topo da China caminham sob a passadeira, com Xi Jinping na liderança. O comité permanente do Politburo que se apresentou aos jornalistas no domingo, num plano dominado por tons de vermelho, mostrava quatro figuras diferentes.
Quais são os nomes novos? A agência estatal Xinhua indicou que os lugares vagos foram atribuídos a Li Qiang (dirigente do partido em Xangai), Cai Qi (líder do PCC em Pequim e do comité que organizou os jogos olímpicos e paralímpicos de inverno no país), Ding Xuexiang (membro do comité permanente do departamento político do PCC), e Li Xi (dirigente em Guangdong).
Hu Chunhua, que chegou a ser apontado por especialistas como um candidato a primeiro-ministro, foi despromovido: o seu nome não consta da lista de membros do Politburo.
“Neste momento e nos próximos cinco anos, o que esta composição do comité permanente nos indica é que só há uma voz, a voz de Xi Jinping. O afastamento ou retirada de figuras, uma delas Hu Chunhua, que ainda se pensava que podia ser o número dois, é de facto muito relevante”, disse Raquel Vaz Pinto, investigadora do Instituto Português de Relações Internacionais (IPRI) da Universidade Nova de Lisboa. A curto prazo, os resultados não levantam dúvidas à investigadora: “este congresso entronizou Xi Jinping”.
Os homens de Xi Jinping
Além de destacar a saída de Hu Chunhua do Politburo, a académica foca-se também na escolha de Ding Xuexiang para o comité permanente, que aponta que apesar de não deter esse título, na prática tem atuado como chefe de gabinete de Xi Jinping. “Aqueles que entram são homens de Xi Jinping e, de todos, para mim o mais revelador dessa única voz é o número seis dos sete, Ding Xuexiang. De todos, é talvez aquele que, segundo se consegue perceber, tem o acesso ou a relação mais profunda com Xi Jinping, uma relação pessoal”, comentou ao Expresso.
As ausências também têm significado. Com a saída de Sun Chunlan, que tinha 72 anos, não se encontra uma única mulher entre os atuais 24 membros do Politburo. “Essa fotografia totalmente masculina é também um sinal claro daquilo que as mulheres podem esperar nos próximos pelo menos cinco anos. Do ponto de vista político, as mulheres estão totalmente fora desta fotografia. É mais um elemento de afirmação que caracteriza esta voz de Xi Jinping, que é uma voz totalmente masculina”, frisa Vaz Pinto.
Yu Jie, investigadora na Chatham House, descreve que a ausência de mulheres quebra uma convenção que se mantinha desde o início dos anos 1980. “Ou as candidatas não são suficientemente competentes ou não são suficientemente leais. O topo do poder do PCC mantém-se masculino”, escreveu no Twitter.
A idade já não é um posto
Em teoria, é durante o Congresso que se escolhe o Comité Central do PCC, que decidiu os 24 membros que compõem o Politburo – menos um do que no mandato anterior. Destes, sete integram o Comité Permanente, que inclui o secretário-geral Xi Jinping.
Por norma, as alterações no Politburo e no Comité Central seguem uma regra informal: quem tem até 67 anos de idade mantém ou assume novos cargos, quem já tem 68 reforma-se. À semelhança do que se antecipava, a regra não se aplicou a Xi Jinping, que, contrariamente à tradição, assumiu um terceiro mandato. O seu poder é visível pelas figuras escolhidas para o rodear.
Por causa da idade, já se apontava que os lugares de Li Zhanshu, com 72 anos, e Han Zheng, com 68, poderiam ficar vagos. No entanto, estes não foram os únicos a sair do comité permanente do Politburo. Tanto o primeiro-ministro, Li Keqiang, como o presidente da Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, Wang Yang, tinham apenas 67 anos. Eram vistos como sendo de uma fação partidária diferente da de Xi Jinping.
“Todos os seus rivais, potenciais e reais, foram forçados a sair do comité permanente do Politburo e quem é leal a Xi ficou com os seus lugares. O novo Politburo é uma declaração enfática do domínio de Xi sobre o partido”, disse Richard McGregor, do Instituto Lowy, em declarações à Reuters.
O que aconteceu a Hu Jintao?
O antecessor de Xi Jinping na liderança do partido e do país, Hu Jintao, foi escoltado para fora do Congresso. Quando um funcionário tenta que Hu Jintao se levante, o ex-Presidente parecer resistir. A dada altura, tenta pegar em documentos de Xi Jinping, que rapidamente coloca a mão sobre os papéis. Li Zhanshu hesita quanto a levantar-se ou permanecer no seu lugar. E Hu Jintao acaba por ser escoltado na saída por duas pessoas, não sem antes se debruçar para dirigir uma palavra a Xi Jinping, que não estabelece contacto visual mas acena, e dar um toque no ombro de Li Keqiang, que está de saída do cargo de primeiro-ministro e do Politburo.
(A agência AFP publicou o vídeo do momento em que Hu Jintao foi levado para fora do Grande Palácio do Povo)
O episódio foi alvo de censura. Segundo o Hong Kong Free Press, a plataforma chinesa ‘Weibo’, que é semelhante ao Twitter, aparentava ter censurado pesquisas relativas a Hu Jintao. A agência estatal Xinhua, remeteu as explicações para o âmbito da saúde. “Quando se estava a sentir bem durante a sessão, o seu staff, pela sua saúde, acompanhou-o a uma sala perto do local do encontro para descansar. Agora, está muito melhor”, pode ler-se numa publicação no Twitter.
Terá sido uma jogada política ou um problema de saúde? “Provavelmente nunca vamos conhecer a verdade, mas independentemente dos detalhes, dessa informação que nos falta, o facto de aquelas imagens terem sido permitidas e divulgadas, é em si mesmo um facto político”, observa Raquel Vaz Pinto, que afirma que “ficámos perplexos porque isto é o mais próximo que conseguimos ter de uma novela política em matéria de Partido Comunista da China”.
Ressalvando a necessidade de esperar e de analisar a atribuição de pastas e cargos estatais, a leitura da investigadora é a de que “um líder que precisa de fazer este tipo de afirmação é, para mim, um líder cujo poder não é assim tão avassalador como possamos pensar”.
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