A Suécia tem um novo primeiro-ministro: quer um governo “para todas as pessoas”, mas incentivos para os estrangeiros saírem do país
EPA/Christine Olsson
Usa óculos redondos, é licenciado em Economia e tem um cão. Ulf Kristersson sabe comunicar — já foi consultor nessa área — e assume o papel político de maior relevo na sua carreira. Chega à chefia do Executivo graças ao apoio da extrema-direita. O seu programa político promete dificultar a entrada de imigrantes na Suécia e uma “ofensiva” contra o crime organizado
Ulf Kristersson tem presença assídua nas redes sociais. As suas publicações dividem-se entre mensagens políticas e uma janela planeada para a vida do primeiro-ministro sueco: o plano focado na pulseira com as cores da bandeira da Ucrânia, um recuo ao dia do seu casamento, o copo na mão e os afagos ao cão, que se chama Winston.
Kristersson é novo no cargo, mas tem experiência na área da comunicação. Apesar de ter entrado cedo para a política, assumindo a presidência da juventude partidária do Moderaterna (Moderados) em 1988 e tornando-se deputado em 1991, fez pausas: trabalhou como consultor de comunicação e integrou o conselho de uma agência de adoção. É licenciado em Economia.
O político da ala direita já foi à guerra e perdeu. Na batalha de Lycksele — nome dado ao congresso da juventude do seu partido em 1992 —, perdeu a liderança por três votos. Segundo o jornal francês “Le Monde”, foi criticado por preferir comunicação a pensamento político. O seu sucessor no cargo foi Fredrik Reinfeldt, que veio a tornar-se primeiro-ministro em 2006.
Agora esse papel vai ser assumido por Kristersson, convidado para formar Governo apesar de o seu partido ter sido a terceira força política nas eleições de setembro, conquistando 19,1% dos votos. A façanha exigiu uma mudança que contraria o próprio nome do partido: o Moderados passou a cooperar com a extrema-direita.
Em conjunto, a direita (Moderados, Liberais e Democratas-Cristãos) e a extrema-direita (Democratas da Suécia) somaram 176 assentos parlamentares, contra 173 lugares do bloco de centro-esquerda.
Basta ler as declarações políticas feitas por Kristersson há quatro anos para a viragem política se tornar evidente. “Não vamos negociar com os Democratas da Suécia na formação de um Governo, nem sobre se esse Governo pode assumir o poder, nem em relação a um orçamento. Isso não acontecerá”. No ano anterior, Kristersson assumiu a liderança do Moderados depois de a sua antecessora ter sido afastada por admitir a possibilidade de negociação com a extrema-direta, escreveu a Reuters.
O Democratas da Suécia é um partido com raízes neonazis, que se afastou de símbolos dessas origens, nomeadamente a tocha azul e amarela que compunha o seu logótipo, mas manteve as medidas anti-imigração no programa. Um dos objetivos do partido é possibilitar a rejeição de pedidos de asilo com base na religião dos requerentes.
É este um dos partidos que agora viabilizam a governação de Kristersson. O dirigente conservador contou com os votos da extrema-direita quando, segunda-feira, foi eleito primeiro-ministro com maioria absoluta no Parlamento.
No exterior, apoio à Ucrânia. No interior, penas mais pesadas
O novo Executivo será formado pelos três partidos de direita (Moderados, Democratas-Cristãos e Liberais), contando com o apoio parlamentar dos Democratas da Suécia. No discurso sobre as políticas governamentais que se avizinham, Kristersson destacou quatro temas: criminalidade, recessão aliada a problemas económicos que diz decorrerem da imigração, crise energética e a adesão à NATO.
Ulf Kristersson
Tim Aro/TT/EPA/Lusa
Na política externa associada à guerra, o apoio à Ucrânia mantém-se, incluindo através do envio de armamento e de um programa de reconstrução a longo prazo. A visão de Kristersson já era clara neste ponto, quando afirmou em maio que “todos temos um dever de apoiar a defesa da Ucrânia e manter-nos firmes com o compromisso de valores e interesses europeus partilhados”.
A nível interno, uma das promessas do novo governante foi o lançamento “da maior ofensiva contra crime organizado da história sueca”. O seu Governo quer rever toda a legislação penal, impondo novas sentenças a quem é reincidente, duplicar as penas para ofensas criminais cometidas em ambientes de gangues e expulsar do país mais criminosos sem nacionalidade sueca. Anunciam-se novos poderes policiais, com a permissão de testemunhas anónimas, medidas coercivas secretas e zonas para mandar parar e revistar pessoas.
Fechar as portas
Quando em 2014 foram relatados desafios à política de abertura da Suécia, numa altura em que os números de refugiados da Síria e do Iraque estavam a crescer, a estratégia do partido Moderados foi no sentido de maior tolerância. “Apelo ao povo sueco para abrir os seus corações”, disse Reinfeldt, citado por “The New York Times”. O antigo primeiro-ministro e companheiro de partido de Kristersson defendeu que os refugiados ajudavam a construir “uma Suécia melhor”.
Com Kristersson a assumir a liderança, o rumo do partido na imigração é diferente. O novo primeiro-ministro anunciou o objetivo de a legislação sueca não dar mais direitos do que os exigidos pela União Europeia. “O Governo vai aumentar as possibilidades de realizar controlos internos de estrangeiros, condições mais rigorosas para reunião familiar e incentivos para regressos voluntários a quem assim o escolher”, discursou.
A lista de medidas no campo da imigração é extensa: tirar a autorização de residência em mais situações, exigir salários mais altos e limitar a mudança de carreira na imigração por motivos laborais e rever os processos de asilo.
“A revisão vai incluir os critérios para conselhos públicos e avaliação de casos relativos a convertidos e pessoas LGBTQI”, observou o primeiro-ministro. Será avançada uma proposta para que pedir esmola seja proibido. “O uso de dados biométricos de estrangeiros vai aumentar, e serão priorizadas as medidas para aumentar a proporção de expulsões forçadas”, acrescentou.
Estas propostas políticas foram anunciadas no discurso em que Kristersson declarou formar um Ggoverno “para todas as pessoas” que vivem na Suécia e pretender liderar a Suécia “de um país dividido para um país unido”.
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